CRÍTICA

‘Coração de Lutador: The Smashing Machine’ revela um Dwayne Johnson vulnerável e distante do herói de ação

No longa, em cartaz nos cinemas brasileiros, The Rock se afasta do carisma de herói de ação para mergulhar na história real do lutador Mark Kerr, em um papel fisicamente intenso e emocionalmente profundo

Angelo Cordeiro (@angelocordeirosilva)

‘Coração de Lutador The Smashing Machine’ revela um Dwayne Johnson vulnerável e distante do herói de ação (Divulgação/Diamond Films)

É curioso ver Dwayne Johnson (Jumanji: Bem-vindo à Selva), o The Rock, conhecido por seu carisma e filmes de ação e comédia, em um papel tão sério e dramático em Coração de Lutador: The Smashing Machine. O longa certamente atrairá o público disposto a descobrir se o ator consegue sustentar um personagem carregado de complexidade emocional — e ver se ele realmente é um potencial candidato ao Oscar de Melhor Ator em 2026. Além disso, Coração de Lutador marca a estreia solo de Benny Safdie na direção, sem seu irmão Josh, com quem trabalhou em Joias Brutas (2017). Apesar da ausência de Josh, Benny mantém sua assinatura intensa e intimista, aproximando a câmera dos personagens e criando uma sensação de imersão, sem o humor ácido presente nas obras dirigidas em dupla.

O enredo acompanha a trajetória de Mark Kerr (Johnson) entre 1999 e 2001, oferecendo um retrato cru da vida de um dos atletas mais dominantes do MMA. Ex-olímpico em luta livre, Kerr ganhou o apelido de “The Smashing Machine” por sua superioridade física e técnica, mas precisou lidar com lesões, medo, dependência de analgésicos e conflitos pessoais. O filme não hesita em mostrar o sofrimento do lutador, desde a dor física extrema até momentos de desespero em busca de remédios, revelando a fragilidade por trás da força do campeão.

O trabalho de Johnson é, sem dúvida, o coração do filme. Para interpretar Kerr, ele se submeteu a um regime rigoroso de treinos de cardio, musculação e MMA, além de horas em maquiagem e próteses para reproduzir a aparência do lutador. A entrega extrema do ator se reflete na autenticidade das lutas e na vulnerabilidade emocional presente em cada cena. Johnson consegue equilibrar a ferocidade física do atleta com momentos de introspecção, mostrando um lado muito distante do herói de ação que o público está acostumado a ver.

Mais do que apenas capturar o atleta em ação, Benny Safdie privilegia a proximidade com os personagens. A câmera na mão, a fotografia granulada e o foco nos detalhes físicos e emocionais conferem uma intimidade rara em cinebiografias esportivas. As lutas são filmadas com precisão e autenticidade, sem romantização ou exageros, permitindo que a tensão e o impacto físico sejam sentidos pelo espectador. O longa mantém alguns maneirismos típicos do gênero: a masculinidade tóxica, o vício em analgésicos e os conflitos no relacionamento amoroso. Tudo é abordado de forma periférica, servindo mais como elementos narrativos do que como temas centrais, embora alguns se destaquem diante dos demais.

O foco real do filme está nas relações pessoais do protagonista, algo recorrente em filmes sobre lutadores. Produções recentes fazem o mesmo: Imparável, com Jharrel Jerome (Olhos que Condenam) e Jennifer Lopez (Case Comigo), tem foco maior na relação entre mãe e filho, já Garra de Ferro, com Zac Efron (High School Musical), aprofunda a dinâmica familiar de triunfos e tragédias diante da figura abusiva do pai. Aqui, Safdie concentra-se mais na relação conturbada entre Kerr e sua companheira Dawn Staples, interpretada por Emily Blunt (Oppenheimer). Por vezes, Dawn parece sufocada ou ignorada, mas a câmera sempre ressalta sua presença. Um dos momentos mais tocantes ocorre em um parque de diversões, quando Kerr se mostra incapaz de acompanhá-la em um brinquedo por “não ter estômago” — uma cena que simboliza a distância emocional entre eles.

Além das tensões amorosas, o filme também mostra a camaradagem entre Kerr e outros lutadores. Em uma cena presente no trailer, uma senhora pergunta a ele se os lutadores se odeiam no ringue, e Kerr responde: “Não, de forma alguma.” Essa relação é explorada ao longo da narrativa, e em outro momento, o lutador chega a ignorar Dawn para tirar uma foto com esses rivais, que há poucos instantes ele havia trocado socos. Esse olhar humano sobre a comunidade do MMA complementa a intimidade que Safdie constrói com os personagens e revela ainda que, por mais que Kerr — e, consequentemente, The Rock —, sejam brutamontes, existe um respeito e carinho entre os esportistas.

No fim das contas, Coração de Lutador: The Smashing Machine se destaca pelo equilíbrio entre a atuação intensa de Johnson e a direção de Benny Safdie. Este retrato de um dos atletas pioneiros do MMA oferece instantes de genuinidade e beleza dentro de uma narrativa convencional. Não é um dos grandes filmes do ano, mas é uma cinebiografia sólida que só tem sua adaptação justificada graças à forma com que Benny a rege, e que nos apresenta Dwayne Johnson em uma de suas interpretações mais maduras e arriscadas da carreira — e isso, por si só, já vale o ingresso.

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Angelo Cordeiro é repórter do núcleo de cinema da Editora Perfil, que inclui CineBuzz, Rolling Stone Brasil e Contigo. Formado em Jornalismo pela Universidade São Judas, escreve sobre filmes desde 2014. Paulistano do bairro de Interlagos e fanático por Fórmula 1. Pisciano, mas não acredita em astrologia. São-paulino, pai de pet e cinéfilo obcecado por listas e rankings.
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