CRÍTICA

‘Bugonia’ é mais um filme bizarro de Yorgos Lanthimos que vale apenas por Emma Stone

Novo longa do diretor sobre a paranoia contemporânea se perde em seu próprio jogo de poder e ironia, salvo apenas pela entrega radical de Emma Stone

Angelo Cordeiro (@angelocordeirosilva)

'Bugonia' é mais um filme bizarro de Yorgos Lanthimos que vale apenas por Emma Stone (Divulgação/Universal Pictures)

Em sua filmografia, Yorgos Lanthimos (Pobres Criaturas) sempre tratou a dominação como um espetáculo cruel, meticuloso e, por vezes, até estranhamente belo. Em Bugonia, o cineasta grego volta aos temas que lhe são comuns e faz a sua versão de Save the Green Planet! (2003), filme sul-coreano sobre um homem que acredita estar salvando o mundo de uma invasão alienígena, aplicando uma visão contemporânea, atual e muito norte-americana. Se o original era sujo e trágico; Lanthimos transforma o caos de sua versão em uma vitrine. Tudo é calculado e perfeitamente insensível, típico de seu estilo — mas será que ele casa com essa história?

A premissa permanece: dois homens sequestram uma poderosa executiva (Emma Stone, de Tipos de Gentileza) convencidos de que ela é uma alienígena infiltrada prestes a destruir a Terra. O roteiro, assinado por Will Tracy (O Menu), busca costurar sátira política e paranoia contemporânea, mas Lanthimos parece mais interessado em suas próprias simetrias, seus enquadramentos milimetricamente desconfortáveis e em manter o olhar clínico que há anos confunde bizarrice com profundidade. Tudo aqui parece estudado para provocar estranheza, e não empatia.

Bugonia quer ser uma crítica ao presente — às teorias conspiratórias, à masculinidade delirante e à paranoia digital —, mas acaba apenas zombando dessas figuras sem realmente compreendê-las. Jesse Plemons (Guerra Civil), excelente como o conspirador sequestrador que se imagina herói, oferece ótimos trejeitos ao seu personagem, mas o roteiro e a direção não conseguem tirar mais dessa caricatura. O que poderia ser um estudo da loucura contemporânea se transforma em desfile de tipos grotescos sem profundidade e gestos que apenas reforçam o próprio riso de superioridade do diretor.

É justamente nesse ponto que o filme colapsa. Lanthimos se mostra prisioneiro de seu próprio método — o tom bizarro das atitudes mais emocionais possíveis, a ironia distanciada e o prazer em reduzir os personagens a peões de um jogo moral já conhecidos de suas obras anteriores. Bugonia soa como um filme que existe para provar que o autor ainda é “ele mesmo”, repetindo fórmulas e gestos estilísticos, sem acrescentar nada novo. É pura auto imitação, um reflexo de um diretor confortável em sua própria assinatura estranha e bizarra.

Emma Stone, porém, permanece imune a essa esterilidade. Ela é a única presença realmente interessante em cena — além de Plemons, que consegue algum fôlego. A entrega de Stone é física e emocional: seja ao topar raspar a cabeça, suportar o absurdo das torturas às quais sua personagem é submetida ou em sustentar o silêncio apenas com o olhar. Cada gesto, cada expressão, cada frase — que não sabemos se são verdade ou não —, torna-se um contraste com o universo excêntrico e estranho que a cerca.

Tematicamente, Bugonia se perde ao transformar o absurdo em espetáculo vazio. A pergunta central — a personagem de Stone é ou não uma alienígena? — sustenta o filme por um tempo, mas o resto é repetição. Lanthimos se prende a gestos e maneirismos, a sátira que deveria render mais se torna apenas superficial. Ao final, o riso que o filme provoca é esvaziado diante da revelação final, como se percebêssemos que o verdadeiro protagonista é o próprio estilo do diretor, e não a história em si.

Em suma, Bugonia, presente na programação da 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, é mais uma demonstração do que o cinema de Lanthimos se tornou: autoconsciente, previsível e prisioneiro do próprio estilo. É cinema de exibição, de vitrine e de gesto formal, mas sem a criatividade que uma história como essa demandava. Só Emma Stone e seu mistério, em meio a tudo isso, permanecem capazes de transformar o filme em algo que vale a pena ser visto.

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Angelo Cordeiro é repórter do núcleo de cinema da Editora Perfil, que inclui CineBuzz, Rolling Stone Brasil e Contigo. Formado em Jornalismo pela Universidade São Judas, escreve sobre filmes desde 2014. Paulistano do bairro de Interlagos e fanático por Fórmula 1. Pisciano, mas não acredita em astrologia. São-paulino, pai de pet e cinéfilo obcecado por listas e rankings.
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