CRÍTICA

‘Predador: Terras Selvagens’ nos faz torcer pelo alienígena pela primeira vez na franquia

Dan Trachtenberg expande o universo da franquia ao situar a história em novo mundo e transformar o predador em protagonista de uma jornada de redenção

Angelo Cordeiro (@angelocordeirosilva)

'Predador Terras Selvagens' nos faz torcer pelo alienígena pela primeira vez na franquia (Divulgação/20th Century Studios)

Em tempos nos quais as franquias se repetem até o esgotamento, Predador: Terras Selvagens se destaca justamente por ser um blockbuster que entende o essencial: ritmo, clareza e propósito. O diretor Dan Trachtenberg (Rua Cloverfield, 10) — que já havia revitalizado a saga alienígena com O Predador: A Caçada (2022) e Predador: Assassino de Assassinos (2025) — leva agora a franquia a um território totalmente novo: o planeta natal dos Yautja. Ao contrário das entradas anteriores, aqui não há humanos ou soldados tentando sobreviver; o que temos é um épico de ação protagonizado por um predador de nome Dek (Dimitrius Schuster-Koloamatangi), um pária que busca redenção em uma cultura que elimina qualquer sinal de fraqueza.

A ousadia de Trachtenberg está em inverter a lógica da franquia. Desde Predador (1987), o alienígena caçador sempre foi o inimigo invisível; agora, ele é o herói — ou algo próximo disso. Dek, interpretado com intensidade e vulnerabilidade por Schuster-Koloamatangi, carrega o peso da exclusão e a necessidade de provar seu valor ao clã Yautja. Sua missão é caçar o Kalisk, uma criatura praticamente imortal, em um planeta distante chamado Genna — e o que começa como uma jornada de sobrevivência se transforma em uma busca por identidade e pertencimento.

Visualmente, Terras Selvagens é uma imersão total. Filmado na Nova Zelândia, o longa combina locações naturais com efeitos práticos e digitais de tirar o fôlego (existem pelo menos três grandes sequências de ação que valem o ingresso na melhor sala de cinema possível). Em Genna, florestas se movem, a fauna reage como se tivesse consciência, e cada plano transmite a sensação de estarmos em um ecossistema vivo. Nesse ambiente hostil, até mesmo para uma criatura imponente como o predador, Trachtenberg cria uma alegoria da própria natureza dos Yautja — seres que vivem entre a honra e a brutalidade, a civilização e o instinto.

É nesse cenário que o diretor expande de fato o universo da franquia, com uma visão quase mítica do clã e das possibilidades que ainda existem na lore de Predador. Ele mergulha em seus códigos e dilemas morais, revelando contradições que humanizam os monstros. O conflito, desta vez, é mais interno: o verdadeiro inimigo de Dek é seu próprio passado — e, nas sombras, a influência da Weyland-Yutani, empresa de exploração espacial recentemente citada na série Alien: Earth, que surge aqui não como simples fan service, mas como elo definitivo entre os universos de Predador e Alien. A conexão pode sugerir futuros encontros, mas Terras Selvagens não depende disso para funcionar.

Sem humanos para guiar o olhar do espectador, Trachtenberg encontra uma nova forma de empatia: faz o público torcer, pela primeira vez, por quem sempre foi o vilão. Essa virada ganha força com a presença de Thia, uma androide falante e carismática interpretada por Elle Fanning (Um Completo Desconhecido). Criada pela Weyland-Yutani, Thia é um resquício de uma missão em Genna e funciona não só como alívio cômico, mas também como contraponto emocional e moral a Dek. É ela quem desperta no predador a capacidade de compreender sentimentos e liderança, transformando essa relação improvável no coração do filme.

As tentativas anteriores de renovação da franquia — Predadores (2010) e O Predador (2018) — tropeçavam justamente na falta de interesse por seus personagens. Dan Trachtenberg prova que o que mantém Predador interessante não é a nostalgia ou os seres humanos, mas a capacidade de reimaginar essa criatura alienígena. Em vez de reciclar fórmulas, ele nos faz enxergar o predador sob uma nova luz — não como monstro, mas como um ser que pode se redimir. Em suma, Predador: Terras Selvagens é um espetáculo de ação e aventura que honra sua mitologia sem se prender a ela e que reafirma Trachtenberg como o cineasta mais inventivo que essa franquia já teve.

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Angelo Cordeiro é repórter do núcleo de cinema da Editora Perfil, que inclui CineBuzz, Rolling Stone Brasil e Contigo. Formado em Jornalismo pela Universidade São Judas, escreve sobre filmes desde 2014. Paulistano do bairro de Interlagos e fanático por Fórmula 1. Pisciano, mas não acredita em astrologia. São-paulino, pai de pet e cinéfilo obcecado por listas e rankings.
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