'ENGOLIDO PELO SISTEMA'

A grande crítica que Marcelo D2 faz ao rap atual

Rapper lamentou a cooptação do gênero pelo mainstream, sacrificando a retórica revolucionária dos seus primórdios no Brasil

Pedro Hollanda

Marcelo D2, do Planet Hemp
Marcelo D2, do Planet Hemp - Foto: Stephan Solon

Chamar Marcelo D2 de lenda do rap nacional parece redutivo. Seja como parte do Planet Hemp ou em sua carreira solo, ele foi influente não apenas para a popularização do gênero no país, como também em fazer o público perceber que dá para fazer esse tipo de música sem abdicar da brasilidade.

Todavia, ele tem críticas ao estilo. Mais especificamente, ao que ele se tornou.

Em entrevista a Ricardo Pinheiro para o jornal O Globo, D2 foi perguntado sobre arrependimentos em sua carreira. Na resposta, citou o estado atual do rap e a perda da essência do estilo musical, ao seu ver.

Ele falou:

“Pode parecer um saudosismo, mas eu sinto muita falta do rap. O rap se transformou em outra coisa. Assim como qualquer movimento revolucionário, o rap foi engolido pelo sistema e hoje em dia ele faz parte do sistema, não é mais um ‘outsider’. Eu, enquanto um ‘outsider’, um cara que gosta de viver à margem dessa sociedade, não me sinto mais tão representado. Tem muita coisa boa, mas o rap de maneira geral já virou ‘mainstream’. Sinto muita falta do rap ‘underground’. Ele ainda existe, mas é quase uma cópia do que foi feito naquela época. Sinto falta desse ‘movimento rap’, até porque eu vou ficando velho e não faço mais parte dessa parada, também, né? Nem me interessa muito mais.”

O rapper ainda falou sobre fazer músicas equilibrando a necessidade de entreter com sua vontade de oferecer conteúdo nas letras. Além disso, discutiu a utilidade de olhar para o passado em busca de inspiração.

D2 disse:

“Lembrando que o rap era uma música que não existia no Brasil. Cantar rap era ‘coisa de americano’. O jeito de fazer rap brasileiro era samplear os mais velhos. Não se escreve o futuro sem olhar para o passado, não existe. É o trabalho que faço hoje com o ‘Novo samba tradicional’, a metáfora do arco e flecha: quanto mais a gente puxa para trás, mais lá na frente vamos atingir. É burrice achar que sabemos de tudo e que não precisamos olhar para trás e reverenciar os mais velhos e agradecer o caminho que foi aberto. A gente não vai reinventar a roda, ela já está aí, não dá para ignorar. Então, vamos ver como a gente consegue fazer ela rodar melhor.”

Marcelo D2 também vê o “copo meio cheio”

Em entrevista de 2023 à Rolling Stone Brasil, Marcelo D2 apresentou ponto de vista similar. O artista citou que o momento atual é o “melhor para o hip hop no Brasil enquanto movimento, mas não na parte criativa”. Ainda assim, preferiu enxergar um lado mais positivo.

“O Playboy Carti diz em uma rima que está sustentando a família com um hobby. Para nós, que começamos no fim dos anos 1980 e começo dos anos 1990, ver que as pessoas conseguem sobreviver e viver com arte — e alguns estão ficando milionários — é muito interessante. O rap tem muito a contribuir com a discussão contemporânea. É quase um sonho. Eu não achava que o rap estaria tão forte 50 anos depois. Ele se adapta aos grandes guetos. Já viajei para fazer show em mais de 30 países e todo lugar tem um rap muito local. Essa regionalidade deixa o rap sobreviver.”

Shows de despedida

O Planet Hemp faz neste sábado, 15, o penúltimo show da carreira, no Allianz Parque. A apresentação faz parte da turnê Até a Última Ponta, que marca a despedida do grupo dos palcos. Ainda há ingressos à venda no site Eventim.

A performance final ocorrerá dia 13 de dezembro, na Fundição Progresso, Rio de Janeiro, cidade onde a banda foi criada. Ingressos também estão disponíveis via Eventim.

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Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como IgorMiranda.com.br, Scream & Yell e Rock'n'Beats.
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