Paul Scanlon Publicado em 01/05/2007, às 00h00 - Atualizado em 01/09/2007, às 18h39
Em uma tarde ensolarada de primavera no ano passado (1976), um velho amigo, fã de cinema como eu, levou-me de carro até um galpão de dois andares insuspeito em Van Nuys (Califórnia). O prédio era a sede da Industrial Light and Magic, uma organização de jovens técnicos a quem coube a responsabilidade de criar os efeitos especiais de Guerra nas Estrelas, a fantasia espacial de US$ 9,5 milhões criada pelo roteirista e diretor George Lucas.
Lucas e a unidade principal tinham acabado de dar início às filmagens na Tunísia, mas a atividade na IL&M naquele dia era tão intensa que parecia até que o filme estrearia dali a um ou dois meses. Os responsáveis pelos modelos trabalhavam duro, dando os últimos retoques em naves espaciais em miniatura (em grande parte com a canibalização de kits de modelos comprados em lojas); uma equipe de animadores trabalhava com afinco em protótipos de efeitos; o pessoal dos explosivos estava preocupado com testes que seriam feitos em breve e todo mundo estava maravilhado com a câmera que John Dykstra e seus técnicos tinham construído - do zero - para filmar as seqüências espaciais.
Dykstra, supervisor de efeitos fotográficos do filme, que trabalhara anteriormente com Douglas Trumbull (2001: Uma Odisséia no Espaço, de 1968), levou vários de nós ao andar de cima, até uma sala de exibição improvisada atulhada de cadeiras e um par de sofás volumosos. Um dos jovens animadores tinha acabado de terminar uma série de explosões a laser para que Dykstra aprovasse. A sala ficou escura e vimos quando os "lasers" iluminaram a tela. Os melhores foram recebidos com aplausos. Os mais espetaculares arrancaram gritos.
Mais tarde, estava espiando alguns storyboards de uma cena de batalha espacial. Várias imagens mostravam uma criatura peluda com dentes enormes que parecia dirigir a nave. "O que é isso?", pergunto a uma técnica que passa por ali. "Um Wookie, é claro", ela respondeu e seguiu em frente, sem mais explicações.
Mesmo naquela época, já deu para perceber que a jovem equipe estava absorta pela visão única e pela imaginação excepcional de George Lucas. Ele diz que todos os seus filmes são caracterizados por uma "espécie de rapidez vertiginosa efervescente". Independentemente do título dado à sensação, é algo que parece afetar tanto as pessoas que trabalham para ele quanto as que assistem a seus projetos. Seu primeiro longa-metragem, THX 1138 (1971), era tecnicamente brilhante, mas não caiu no gosto popular. Mesmo assim, ganhou status de cult e é um dos filmes preferidos entre os universitários há anos. Daí veio American Graffiti - Loucuras de Verão (1973), o tributo de George à juventude de 62, à paquera e ao rock'n'roll. Feito com orçamento de US$ 750 mil, com equipe reduzida e 28 dias de filmagem, transformou-se no 11º campeão de bilheterias. E caso você tenha passado os dois últimos meses dormindo, ou em Marte, o terceiro longa de George Lucas, Guerra nas Estrelas (que estreou no dia 25 de maio de 1977), certamente vai chegar à lista dos dez mais e pode até se transformar na maior bilheteria de todos os tempos. Em oito semanas de exibição, já tinha arrecadado US$ 54 milhões. A versão em forma de romance do roteiro, lançada sem alarde pela Ballantine Books no final do ano passado, foi vista pela última vez no número 4 da lista dos livros mais vendidos, com 2 milhões de cópias em circulação hoje. A trilha sonora já ganhou disco de ouro e devem ser lançados pôsteres, camisetas, modelos e máscaras dos personagens principais. Nada mal para um filme que quase nem chegou a decolar e era considerado um tiro no escuro até praticamente o dia do lançamento.
Quando visitei o set de filmagem em Londres posteriormente, naquela mesma primavera, percebi uma ausência notável de "rapidez vertiginosa efervescente". Com certeza foi algo bem impressionante: todos os oito estúdios do Elstree Studios, da EMI, estavam sendo usados para Guerra nas Estrelas. Tudo parecia estar no prazo, mas George Lucas andava preocupado. Alguns atores questionavam os diálogos. Os robôs não estavam perfeitos. Uma seqüência inteira com Peter Cushing teve que ser refeita. O personagem de Alec Guinness seria morto a dois terços do filme e o estúdio ainda não sabia disso. As equipes inglesas não trabalhavam nem um minuto além de oito horas por dia e tinham dois intervalos obrigatórios para o chá.
Em sua casa em San Anselmo (Califórnia), mais para a frente, naquele verão, George e o produtor Gary Kurtz pareciam ainda mais preocupados. O estúdio estava querendo ver uma versão bruta do filme e nem um terço dos efeitos estava finalizado. Os robôs pareciam ainda piores. A trilha sonora não estava pronta. Havia problemas de iluminação, de som.
De algum modo - basicamente por meio de trabalho sem descanso - a coisa toda se encaixou. Mas, uma semana antes da estréia, a master ainda não estava pronta. George e a equipe de som colocaram efeitos sonoros na versão de 70 milímetros até o último minuto. A única questão que estava no ar era: será que vai dar certo? E deu.
Não é difícil fazer a sinopse do filme. Aliás, Guerra nas Estrelas tem tudo a ver com Buck Rogers e Flash Gordon misturados com J.R.R. Tolkien, O Príncipe Valente, O Mágico de Oz e praticamente todos os grandes westerns já feitos. Nosso herói, Luke Skywalker (Mark Hamill), é um rapazinho do interior de um planeta árido, Tatooine, que, de repente, se vê arrebatado por uma série de acontecimentos improváveis bem no meio de uma guerra intergaláctica. Entre seus aliados estão Han Solo (Harrison Ford), um piloto espacial mercenário temerário; Obi-Wan Kenobi (Alec Guinness), um senhor de idade místico que é o último representante de um grupo chamado Cavaleiros Jedi (e que conheceu o pai de Luke); a princesa Leia Organa (Carrie Fisher), uma das principais rebeldes opositoras do Império; Chewbacca, o wookie, um antropóide inteligente e feroz de quase 2,5 metros de altura; e dois robôs metidos a espertinhos chamados R2D2 e C3PO - o primeiro fala andróide, o segundo inglês - que roubam a cena.
Os principais vilões são Darth Vader (David Prowse) e Grand Moff Tarkin (Peter Cushing), auxiliados por uma horda de serventes e soldados. Eles operam a partir da Estrela da Morte, um satélite enorme criado especificamente para disparar galáxia afora atacando planetas desobedientes que não querem tomar o lado do Império. Fica claro, já no começo do filme, que o confronto é inevitável. Também fica claro quem vai vencer.
O que distingue Guerra nas Estrelas de seus predecessores são os efeitos especiais (cerca de 365 filmagens separadas) e a riqueza extraordinária da imaginação de Lucas. Há a seqüência da Cantina, por exemplo, quando os heróis vão parar em um bar cujos freqüentadores são originários de uma dúzia de galáxias. E há criaturas de castas inferiores, como os jawas, pequenos seres tagarelas que desmantelam robôs para sobreviver. No que diz respeito aos efeitos ópticos e às miniaturas, Lucas e Dykstra apresentam um novo padrão que servirá como base para julgar todos os futuros filmes de ficção espacial. Antes do lançamento de Guerra nas Estrelas, Dykstra declarou que a seqüência da batalha final seria exatamente tão emocionante quanto a perseguição automobilística de Operação França (1971). Ele tinha razão.
Então, aqui está George Lucas, 33 anos, em uma suíte de hotel com vista para o Central Park, em Nova York. Ele está na cidade para assistir à estréia de New York, New York, de seu amigo Martin Scorsese, que foi editado por sua mulher, Marcia (que também é responsável por boa parte de Guerra nas Estrelas). Em algum lugar lá fora, tem gente fazendo fila para a próxima sessão de seu filme, e George Lucas, que acaba de chegar do Havaí, sorri.
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