Redação Publicado em 05/08/2016, às 15h23 - Atualizado às 15h55
"Deixe que eu fale como vai ser. É um para você, e dezenove para mim. Porque eu sou o homem do imposto de renda." A cáustica "Taxman" já abria Revolver de maneira impactante. A canção foi escrita por George Harrison e era uma nada sutil reclamação contra o notório imposto de renda britânico, conhecido por esfoliar cidadãos endinheirados, especialmente astros do rock. O vocal do guitarrista é puro desprezo, direcionando o veneno ao "homem do imposto". Muitos comentaram que o guitarrista resolveu escrever a música por ser um notório avarento que ficava revoltado de ver seu dinheiro levado embora pelo governo. Mas não é só a letra que chama atenção. A melodia é marcante e todos os Beatles brilham na parte instrumental, com destaque para o baixo musculoso e a guitarra nervosa, ambos executados por Paul McCartney. Dentre as várias versões para "Taxman", selecionamos esta feita por Tom Petty, amigo de Harrison. Foi gravada no Concert for George, uma homenagem ao ex-Beatle feita em 2002 no Royal Albert Hall, em Londres.
Em uma entrevista, Paul McCartney disse que uma tia dele chamada Lil o questionou: "Por que você e seus amigos só escrevem músicas sobre romance e namorados? Porque vocês não fazem uma canção sobre um encontro de cúpula ou sobre um cavalo?" McCartney então pensou: "Ok, tia Lil, desafio aceito!" Se essa história é verídica ou não, nunca saberemos. Mas, impulsionado pela tal tia, ele compôs algo cujo enredo se assemelhava a um dramalhão radiofônico inglês. Assim surgiu "Eleanor Rigby", cuja letra versava sobre a personagem-título, uma solteirona que "morreu na igreja e ninguém foi vê-la". Sobre o padre Mackenzie, que "escrevia sermões para ninguém ouvir" e "as pessoas solitárias – de onde elas vêm, qual é o lugar delas?" Enfim, tudo era muito enigmático, mas a canção aumentou a aura de músicos sérios e filosóficos que havia em torno dos Beatles, eles tinham “algo a dizer”. O uso de um octeto de cordas arranjado por George Martin deu a "Eleanor Rigby" solenidade e pungência. Ela foi intensamente regravada e, mesmo com todos os méritos da gravação original, a versão feita por Ray Charles, sempre um grande intérprete dos Beatles, é a preferida de muita gente. O cantor e pianista injeta soul e um desespero cru à canção. Através do Brother Ray, sentimos na pele a dor e a alienação das pessoas solitárias descritas na letra.
John Lennon tinha fama de ser preguiçoso e gostava de alimentar o folclore sobre curtir ficar um bom tempo na cama. Mas ele não ficava apenas dormindo – Lennon gostava de ler, ver televisão e escrever novas canções enquanto permanecia deitado. "I'm Only Sleeping" surgiu como mais uma manifestação de “fluxo de consciência” do músico. “Por favor, não me acorde, não me sacuda, afinal de contas, eu estou apenas dormindo”, clamava a letra onírica. Além de abrir uma janela para a personalidade de Lennon, a faixa se notabilizou por ser um dos mais interessantes experimentos dos Beatles em Revolver. A cadência da melodia lembra um pouco a da música indiana, mas não se engane: "I'm Only Sleeping" é puro rock. Os efeitos de guitarra tocados de trás para frente, com execução de George Harrison, produzem uma sensação desconcertante e psicodélica. O guitarrista levou nove horas para elaborar os solos. Depois, ele, o produtor George Martin e o engenheiro Geoff Emerick trataram de montar o quebra-cabeça sonoro. Suggs, cantor do Madness, deu à canção um tratamento de ska e o single alcançou a sétima posição da parada inglesa em 1995.
Após conversar com David Crosby, do The Byrds, George Harrison ficou interessado na música hindu. O som do sitar foi usado na trilha do filme Help!, o que o deixou mais intrigado. Ele comprou o instrumento e o usou em "Norwegian Wood (This Bird Has Flown)" , faixa de Rubber Soul (1965). O beatle começou a estudar com o mestre Ravi Shankar e logo já dominava a arte de tocar o instrumento. Apesar de em "Norwegian Wood (This Bird Has Flown)" ele ter usado o sitar para apenas dar um “colorido”, Harrison tinha a intenção de fazer uma música com a autêntica sonoridade hindu, explorando seus peculiares timbres e afinações. Assim, surgiu ”Love You To”, possivelmente a primeira demonstração do raga rock, que é a junção de música pop com o som exótico da Índia. Nela, Harrison tocou o sitar, McCartney ajudou nos vocais e Ringo Starr se encarregou do pandeiro. Lennon não participou. A tabla foi tocada por Anil Bhagwat e outros músicos hindus se ocuparam da tamboura e de sons adicionais de sitar. A letra junta divagações filosóficas e existenciais. A faixa foi também um divisor de águas ao apresentar para os ocidentais um pouco do sabor da música da Índia, mas sem que ela soasse como uma mera paródia. Como apresenta uma atmosfera muito específica, “Love You To” não recebeu tantas covers quanto outras canções dos Beatles, mas esta versão da banda britânica Cornershop segue fielmente a original.
Em maio de 1966, Bruce Johnston foi a Londres divulgar Pet Sounds, LP que os Beach Boys, banda da qual ele fazia parte, havia acabado de lançar. Claro, Pet Sounds hoje é considerado um dos maiores álbuns de todos os tempos, mas naquele momento apenas alguns privilegiados da elite do rock inglês iam ter a chance de ouvi-lo em primeira mão. Johnston se hospedou no The Waldorf e lá recebeu John Lennon e Paul McCartney. Os dois Beatles saíram boquiabertos após a audição, acharam que aquele era o maior disco do rock já feito. Como competir com a obra idealizada por Brian Wilson? McCartney encarou o desafio naquela mesma noite. Ao chegar em casa escreveu "Here, There and Everywhere", uma belíssima canção de amor que emulava as intrincadas harmonias vocais dos Beach Boys. O curioso é que os Beatles não lançaram a canção como single – se tivessem feito isso, ela certamente teria sido um gigantesco hit mundial. De qualquer forma, a faixa logo se tornou muito popular e recebeu inúmeras covers. Essa versão do trio vocal The Letterman dá uma ideia de como ela ficaria se fosse gravada pelos Beach Boys.
Até hoje marca registrada de Ringo Starr, "Yellow Submarine" é provavelmente a canção infantil mais conhecida no mundo. Na verdade, os autores John Lennon e Paul McCartney talvez não tivessem esse intuito, afinal, eles só queriam criar algo lúdico para o amigo baterista cantar. Mas "Yellow Submarine" – com sua melodia simples, mas contagiante, efeitos sonoros inusitados e uma refrão que gruda na cabeça no primeiro instante – logo capturou a imaginação do grande público. Comercialmente, é o maior sucesso de Revolver. O single, com "Eleanor Rigby" do outro lado, chegou ao primeiro lugar no mundo todo. Em 1968, batizou a animação na qual os Beatles tentavam salvar a fictícia Pepperland. Aqui, mostramos uma irreverente versão dos Muppets feita para o programa Vila Sésamo, em 1970.
A canção que encerra o lado A de Revolver foi inspirada nos eventos acontecidos em uma festa regada a LSD que os Beatles deram em Los Angeles. Nela estavam membros do The Byrds, o ator Peter Fonda e outras celebridades. A certa altura, Fonda estava muito louco e ficava repetindo "Eu sei como é estar morto. Vocês me fazem sentir como se eu nunca tivesse nascido”. Lennon, mais tarde, aproveitou a frase de Fonda (o beatle nem sabia quem era aquele sujeito) e, a partir dela, criou toda uma atmosfera lisérgica e dissonante. Esta versão do The Black Keys foi incluída no álbum The Big Come Up (2002) e tem uma austeridade fiel à gravação dos Beatles.
Na manhã do dia 1 de janeiro de 1962, os Beatles estiveram nos estúdio da Decca, em Londres, para fazer um teste para a gravadora. Durante a tarde, estiveram no mesmo local Brian Poole and The Tremeloes, também ansiando por um lugar no casting da companhia. No final, eles foram contratados e os Beatles, rejeitados. Logo, Brian Poole and The Tremeloes se tornaram uma banda muito conhecida, mas é claro, nunca atingiram o patamar de musicalidade, sucesso e influência dos músicos rivais de Liverpool. Em 1966, Poole tinha saído em carreira solo e os Tremeloes começaram a gravar sem ele. O segundo single desta nova fase foi "Good Day Sunshine", uma cópia fiel da canção criada por Paul McCartney, uma faixa com toques de music hall e que tinha o clima de um raro dia de sol em Londres. A versão do The Tremeloes não fez sucesso, mas logo eles acertaram o passo e voltaram a dominar as paradas.
Está é uma das grandes canções de John Lennon incluída em Revolver, com uma melodia que tem pegada de power pop unida a um arranjo de folk rock. E o que chama logo atenção é parede de guitarras de doze cordas tocada em conjunto por George Harrison e Paul McCartney, criando um efeito. Lennon canta de forma persuasiva e sedutora e McCartney dá apoio vocal de forma entusiasmada. Apesar de ela ter sido basicamente uma criação de Lennon, McCartney também ajudou nos versos e em algumas partes da melodia. A letra é críptica e pode ter sido inspirada por uma viagem de LSD. Mas ela também reforça a influência poética que Bob Dylan exercia em Lennon na época. O trio inglês The Jam, liderado por Paul Weller, gravou "And Your Bird Can Sing" em uma demo bastante fiel. Ela foi lançada na caixa de raridades Extras.
Na época de Revolver Paul McCartney namorava a atriz Jane Asher. Mas a relação nem sempre corria às mil maravilhas e ocasionalmente o músico relatava o que sentia em forma de música. "For No One" é um exemplo, falando sobre um relacionamento que morria em meio à indiferença. A faixa tem uma bela melodia, mas a atmosfera condiz com a mensagem e é um tanto fria e indiferente. George Harrison e John Lennon não participaram da gravação. Já o autor tocou baixo e teclados, sendo que Ringo Starr contribuiu na percussão. O destaque da parte instrumental é o solo de trompa executado pelo músico Alan Civil, que traz um clima barroco à canção. "For No One" também recebeu inúmeras versões, incluindo uma feita por Caetano Veloso. A suave interpretação do brasileiro vai pela linha do cool jazz e foi incluída em Qualquer Coisa (1975).
Com uma marota levada de country rock, “Doctor Robert”, em termos melódicos, é uma das composições mais pop de Revolver. Mas a letra escondia outras intenções. Trata-se de mais uma canção dos Beatles a lidar com o experimento de substâncias químicas. O autor, John Lennon, nunca foi muito claro sobre ela e até hoje as indagações sobre quem seria o doutor da canção permanecem no ar. Na letra, o tal médico é um cara que faz com que todos se sintam bem, é só procurá-lo. Um dos suspeitos é Dr. Robert Freymann, que atuava em Nova York e receitava injeções de vitamina B-12 junto com anfetamina. A informação foi revelada no livro Paul McCartney: Many Years from Now, escrito por Barry Miles. Apesar da melodia de “Doctor Robert” ser bastante comercial, ela recebeu relativamente poucas covers. Nessa gravação, o cantor folk indie Luke Temple parte para a total desconstrução.
A participação de George Harrison em Revolver foi decisiva. As três canções do disco que são contribuições dele, além de serem de primeira linha, influenciaram os colegas da banda e outros colegas da fraternidade do rock. "I Want to Tell You" surgiu depois de uma experiência do guitarrista com o LSD. No titulo, ele já diz que queria contar alguma coisa. Mas depois, quando ouvimos a gravação, percebemos que Harrison ainda estava travado, apesar de ter um milhão de coisas para dizer. Confessa: "Se eu pareço agir de forma desagradável/Sou apenas eu, não a minha mente? São coisas que me confundem". Ele admite a frustração por não conseguir se comunicar adequadamente. "Me sinto travado e não sei o motivo", diz. Na melodia, o uso da dissonância foi decisiva. Ela ajudou a tornar "I Want to Tell You" uma experiência ligeiramente desconcertante, mas profundamente hipnótica. A seminal banda proto grunge The Melvins fez uma cover lo-fi no recém-lançado Basses Loaded.
O filme Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1978), estrelado por Peter Frampton e pelos Bee Gees, e que tinha na trilha várias faixas de discos diversos dos Beatles, foi um fracasso de público e crítica. Pelo menos a trilha tem muita coisa aproveitável, como esta versão do Earth, Wind & Fire para a canção de Paul McCartney. Originalmente, o baixista queria homenagear a soul music da gravadora Motown e obteve um bom efeito ao usar um naipe de metais. O fato é que a gravação da trupe exala autenticidade e tem muito mais groove do que o registro dos Beatles. Este é um daqueles exemplos em que a cover pode até ser considerada superior ao original.
Esta faixa é simplesmente o suprassumo do psicodelismo e encerra Revolver com chave-de-ouro. Com o tempo, o status dela subiu e hoje "Tomorrow Never Knows" é sempre apontada como uma das composições mais influentes dos Beatles. Ela ajudou a formatar o acid rock e sua técnica de produção chegou até a influenciar artistas de música eletrônica. Com uma melodia que parece um forte zumbido no vento, efeitos delirantes de trás para frente, letra impenetrável e vocal enigmático de John Lennon, "Tomorrow Never Knows'' é a viagem definitiva às entranhas do ácido. Dentre as inúmeras versões feitas para canção, escolhemos esta excelente gravação feita pelo grupo paulistano Violeta de Outono. O registro está no primeiro LP da banda, eles, autointitulado, lançado em 1987.
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