Menos politizados e chegando aos 40, os três integrantes do Green Day continuam soando e se comportando como adolescentes revoltados – e não estão nem um pouco preocupados em mudar
Por David Fricke Publicado em 16/05/2011, às 12h42
"Me entrego em tudo o que escrevo - cada melodia, cada palavra, cada parte da música", diz Billie Joe Armstrong, sentado em uma cadeira confortável na sala que tem no porão de sua casa. O guitarrista, vocalista e principal compositor do Green Day vive em uma vizinhança pendurada em uma colina, ao leste do centro de Oakland, na Califórnia. Uma porta de vidro dá acesso a um pátio com uma invejável vista da Baía de San Francisco, de onde é possível ver toda a paisagem até a ponte Golden Gate. Mas Armstrong está olhando para o outro lado enquanto fala. E seu olhar passeia pela parede vermelho-cereja no lado oposto do recinto, onde há fotografias enquadradas de Pete Townshend, do The Who, quebrando uma guitarra durante os anos 60 e de um trio de Beatles bem jovens - John Lennon, George Harrison e o baixista original, Stuart Sutcliffe - em Hamburgo, na Alemanha. "Isso é o tipo de coisa que pode foder com a sua cabeça", dispara Armstrong. "Você tem essa liberdade do rock & roll. Tenho a oportunidade de poder me expressar pelo resto da minha vida, o que é fantástico. Mas, ao mesmo tempo, é como se minha vida dependesse disso." "Isso é o que pega para mim", diz o guitarrista, 37, com suas eternas feições de garoto punk e seu corte de cabelo moderno, ambos assegurando que ele não pareça ter um dia a mais do que 22 anos, a idade que tinha quando Dookie, o álbum do Green Day lançado em 1994, os transformou em estrelas do dia para a noite. "Tenho que me certificar de que estou totalmente imerso no momento."
O que ele quer dizer é o seguinte: na noite anterior, o Green Day - Armstrong, o baixista Mike Dirnt e o baterista Tré Cool - tocaram no Fox Theater, em Oakland. O show fez parte dos quatro shows-surpresa na região, realizados como aquecimento para a primeira turnê mundial da banda desde 2005 (começa em 3 de julho, em Seattle). A maratona de duas horas e meia começou com uma performance na íntegra de sua nova ópera rock, 21st Century Breakdown. O álbum é composto de petardos roqueiros delirantes, ataques punks sem perdão e pitadas de pop. É como um cruzamento de London Calling (The Clash), Quadrophenia (The Who) e Zen Arcade (Hüsker Dü) comprimido em 18 faixas.
Logo de cara, Armstrong já entra no clima. Durante "21st Century Breakdown", segura a guitarra no alto como Bruce Springsteen e toca os acordes balançando o braço em círculos, no estilo de Pete Townshend. Ele poga em "Know Your Enemy", soca o ar como se estivesse boxeando com Deus em "East Jesus Nowhere" e se pendura na beira do palco em "Horseshoes and Handgrenades" cantando a frase "I'm not fucking around!" ("Eu não estou para brincadeira!"), olhando nos olhos dos garotos colados na grade. Dirnt é uma parte importante nas harmonias estranhamente doces que incrementam "Christian's Inferno" e "Murder City". Cool conduz tudo isso como Keith Moon com o suingue de Charlie Watts.
Armstrong, que escreveu literalmente cada nota e palavra de 21st Century Breakdown, é o centro irrefreável desse furacão - mesmo durante o segundo set, que inclui sucessos de Dookie e de American Idiot, álbum carregado de mensagens políticas, lançado em 2004. E paga o preço disso. Depois do show, nos bastidores, dúzias de amigos e familiares cercam Dirnt e Cool. Armstrong, entretanto, não está ali - está no camarim, se recuperando.
"Deve estar exausto", diz sua mãe, Ollie, uma mulher miúda já na casa dos 70, de cabelos loiros enrolados, um sorriso aconchegante e, no momento, com uma ponta de preocupação maternal na voz. Billie é o caçula de seis; seu pai, Andy, morreu de câncer quando Billie tinha 10 anos. "Fico preocupada", diz Ollie sobre o filho famoso. "Ele se entrega tanto à música, aos shows. Isso exige muito dele." Mais tarde, Billie recebe uma mensagem de texto de sua irmã, Anna, que também esperava no backstage: "Você tem que se cuidar" ("Eu estou bem", ele responde para tranquilizá-la). Butch Vig, que produziu o novo disco ao lado da banda, reconhece esse tipo de imersão profunda: foi ele quem coproduziu Nevermind (1991), do Nirvana.
"Via a mesma coisa acontecer com Kurt", diz, se referindo ao vocalista e guitarrista Kurt Cobain. "Quando tocava, parecia que se sentia livre. E Billie Joe me disse exatamente isso: 'Quando estou no palco, estou livre. Não preciso pensar'."
Vig também viu o lado ruim dessa intensidade. "Às vezes, eles estavam trabalhando em alguma música que não estava dando certo e Billie ficava frustrado. Largava a guitarra e dizia: 'Estou indo para casa'" - largando Dirnt e Cool parados lá, sem ação. "Billie tem um padrão bem alto e espera que todo mundo atinja esse nível com a mesma facilidade que ele. Mas Mike e Tré conseguem acompanhá-lo. Quando eles se entrosam, tocam melhor que qualquer banda com quem eu já tenha trabalhado."
Cool, 36 anos, descreve Armstrong como "talentoso e atormentado. O cérebro de Billie é como 18 gravadores rodando simultânea e ininterruptamente. Ele acaba tentando conversar comigo e com sua mulher, Adrienne, por exemplo, ao mesmo tempo. E aí, você chega para ele e pergunta: 'Ok, o que você acha disso aqui?' E ele te olha de volta e diz, 'Hein?'" Dirnt, 37, usa uma metáfora semelhante: "Billie não consegue desligar as seis estações de rádio que tocam ao mesmo tempo em sua cabeça". Os dois se conheceram na 5ª série, em uma escola em Crockett, ao norte de Oakland - Armstrong é de Rodeo, uma cidade próxima; Dirnt nasceu em Oakland - e os dois têm tocado juntos praticamente desde então. Criaram o Green Day, originalmente chamado de Sweet Children, quando tinham 15 (o nome verdadeiro de Dirnt é Michael Ryan Pritchard. O apelido foi colocado por um amigo por causa da onomatopeia da língua inglesa para o som do contrabaixo - "dirnt").
"Somos uma democracia com um líder eleito", diz Dirnt sobre a banda. Ele e Cool, cujo nome real é Frank Edwin Wright III, estão lá "para dar apoio a Billie. Porque ele se leva à loucura. E nessas horas estamos lá para dizer: 'Estamos aqui por você, cara. Levamos a sério o que você está fazendo'".
Em casa, diz Armstrong, "me pego me desculpando bastante". Ele faz uma pausa e sorri. "Não bastante", se corrige rapidamente: "o suficiente". Para um cara que abertamente admite a intenção de se tornar "o deus do rock vindo do inferno", ele até que se esforça para ter uma vida familiar normal. Ele e a mulher - que são sócios em uma loja de roupas e móveis orgânicos, a Atomic Garden - estão casados desde 1994 e têm dois filhos. Questionado sobre sua rotina de composição para o novo álbum, Armstrong diz que a primeira coisa que fazia todos os dias era "levantar e mandar as crianças para a escola". Durante a temporada de beisebol, ele é assistente técnico de um time da liga juvenil. Mesmo assim, Armstrong admite, "às vezes eu chegava à Adrienne e dizia: 'Sabe, estive completamente concentrado em mim mesmo. Me desculpe se pelos últimos 15 anos o único assunto que tive foi a banda'". "Billie é música", afirma Dirnt (ele e Tré Cool também têm dois filhos cada um). "Se você tirar a música dele, ainda terá um bom marido e um bom pai, que é responsável e cuida das crianças. Mas o resto", ele completa, "será apenas uma casca vazia".
Descendo as escadas para a sala no porão, Armstrong aponta alguns suvenires musicais de sua casa: em uma parede, uma réplica da pintura de Bob Dylan na capa de seu álbum de 1970, Self Portrait; em outra, uma fotografia dos membros do Green Day e do U2 reencenando a capa de Abbey Road, dos Beatles, tirada em 2006, quando as duas bandas gravaram juntas um single beneficente em Londres; e, virando o corredor, o estúdio caseiro de Armstrong, onde o novo álbum foi gerado. 21st Century Breakdown é, como a crítica anti-Bush de American Idiot, uma ficção ambientada nos tempos modernos: um casal de punks, Christian e Gloria, luta através de um novo século que já começou terrivelmente errado. "Estamos passando por uma transição, de uma era de destruição para algo novo", diz Armstrong. "Isso é tão assustador quanto o passado."
Mas, embutido na metralhadora de riffs e refrãos feitos para se gritar junto, está o disco mais pessoal e emocionalmente convulsivo da carreira do vocalista. Algumas referências vêm de casa, como "the class of '13" ("a classe de '13") em "21st Century Breakdown" - o filho mais velho de Armstrong, Joseph, 14, se forma no ensino médio em 2013. Dirnt tem certeza de que o guitarrista escreveu "Last of the American Girls" pensando em Adrienne: "Ela tem opiniões fortes e luta por tudo o que acredita". Armstrong começa a canção-título citando seu próprio nascimento - "Born into Nixon, I was raised in hell" ("Nascido nos tempos de Nixon, fui criado no inferno" - ele nasceu em 1972). Quando canta sobre abandono e vingança em canções como "Before the Lobotomy", "Christian's Inferno" e "Peacemaker", o faz em primeira pessoa. "You'd be surprised what I endure" ("Você fi caria surpreso com o que tenho que suportar"), canta em um tom que lembra o John Lennon dos anos 70, durante a parte calma de "Restless Heart Syndrome", antes que o wah-wah psicótico da guitarra exploda na parte final.
"Não tenho ideia do que estava me preparando para fazer", ele confessa. Por meses, enquanto o Green Day gravava no Studio 880 - onde costumam gravar e ensaiar em Oakland - e depois nas sessões de pré-produção com Vig, Dirnt e Cool não tinham a menor ideia sobre o que Armstrong estava escrevendo. "Não contava como eram as letras", diz ele. As demos também não davam pistas. Armstrong mixava seus vocais tão abaixo das guitarras, conta Cool, que ele e Dirnt só conseguiam entender metade do que ele cantava. Finalmente um dia, no ano passado, Armstrong sentou-se com Vig e os outros dois e leu as letras em voz alta - cada música, em ordem. "Olho para Christian e Gloria", diz Armstrong hoje, "e sou eu. Gloria é um lado: tentando manter suas crenças, tentando ser boa. Enquanto Christian está afundado em seus próprios demônios, se vitimizando por isso. Às vezes me sinto como se estivesse protegendo meus fi lhos de mim mesmo", diz baixo, como se tivesse medo de que Joseph e Jakob pudessem ouvi-lo (no momento, eles estão fora com a mãe). "Escrevo músicas como 'Christian's Inferno' ou 'East Jesus Nowhere' e fico com medo que eles leiam as letras. Mesmo Adrienne às vezes ouve algumas letras e pergunta se está tudo bem."
Dirnt conta que Armstrong, que abandonou o ensino médio antes de se formar, sempre escreveu com "seriedade, sob sua visão política pessoal. 'Basket Case' (de Dookie) é sobre alguém tentando se manter mentalmente são". Cool, que entrou no Green Day em 1991, se lembra da reação de seu pai, piloto de helicóptero do exército norte-americano durante a Guerra do Vietnã, ao modo como Armstrong descreve a ausência paterna em "Wake Me When September Ends", de American Idiot: "Ele ficou muito tocado. Porque foi exatamente o que aconteceu com ele e minha mãe. Eles se casaram, ela engravidou e ele foi mandado para a guerra. Era como a história de amor dele".
Armstrong fala francamente das raízes de seu descontentamento, como os "anos de desconexão" de sua família após a morte de seu pai. "O problema era que eu tinha cinco pais: meus irmãos e irmãs mais velhos. Eles estavam lidando com a própria perda, mas ao mesmo tempo tinham uma certa responsabilidade sobre mim - minha mãe tinha que trabalhar de madrugada como garçonete. O ressentimento aumentou. E eu não queria ser um fardo. Queria ser só o irmão mais novo. Levou anos para que superássemos."
"Mas nascemos todos com os mesmos demônios", argumenta. "Vejo um garoto vestindo uma camiseta do Green Day e penso: 'O que será que há de errado com ele? Pelo que será que está passando?' Há sempre essa parte de você, no lado subterrâneo da sociedade. Você não se enquadra. Você vê coisas que te deixam com raiva. Eu internalizo essas merdas. E depois cuspo."
"Minha raiz ainda é o punk rock", diz com fervor. "Gosto de traçar um panorama pessimista. De algum modo me anima cantar sobre as merdas mais horríveis que alguém possa ser capaz de cantar." Ele sorri. "Vem do meu DNA."
Quando pergunto se seu fi lho mais velho já ouviu o novo disco, Armstrong abre um grande sorriso. "Eu tinha acabado de pegar a master de volta, mas tive que viajar em seguida", conta. "Adrienne disse que foi muito engraçado - Joseph e seus amigos no carro batendo cabeça o tempo todo. Às vezes me sinto inseguro - quero me certificar de que 'Christian's Inferno' não seja tocada nesta casa. Não acho que ele entenda tudo o que rola na letra. Ele só sabe que o som é legal." "Mas em alguns anos", admite, com um frio na barriga, "ele definitivamente acabará descobrindo sozinho".
Posso te dizer o nome de qualquer rua lá embaixo", fala Mike Dirnt, olhando através da porta de vidro que dá para o pátio. O baixista vive com sua mulher, Brittney (se casaram em março), seu fi lho mais novo e a fi lha adolescente de outro casamento em uma casa no alto de uma região serrana com vista para Oakland e próxima a uma área de preservação natural. Dirnt frequentemente sai de manhã para andar descalço pela região, procurando coiotes, raposas e gatos do mato. A visão do pátio é ainda melhor que a da casa de Armstrong. Dirnt pode ver dali não só toda a área da Baía de São Francisco, mas também toda sua história de vida e do início de carreira do Green Day: as casas, as baladas e os clubes em Oakland e Berkeley onde ele, Armstrong e Cool se divertiam e tocavam antes do estrelato. "Andei de bicicleta em todas essas ruas", diz Dirnt. "Nasci ali" - conta, apontando para a esquerda - "Se chama Oakland Highland. Hoje em dia, se você quer tomar um tiro é só ir para lá".
"Isso aqui é nossa casa", diz Armstrong sobre Oakland, "do mesmo modo que Nova Jersey é para Bruce Springsteen e Dublin é para o U2. Nós a representamos. Ou tentamos, pelo menos". Armstrong, Dirnt e Cool moram a 15 minutos de carro um do outro. A casa de Cool fica numa rua arborizada, bem mais perto do nível do mar (ele tem uma filha adolescente, um garoto mais novo - ambos de casamentos anteriores - e uma namorada). Quando a banda não está excursionando, os três costumam se encontrar regularmente no Studio 808. A ideia de férias para o Green Day, durante os ensaios de 21st Century Breakdown, era compor e gravar um álbum no estilo do rock de garagem dos anos 60 sob a alcunha de Foxboro Hot Tubs. Quando alguém pergunta a Dirnt "Você tem algum conselho para o meu fi lho? Ele quer ter uma banda", sua resposta imediata é "Diga a ele para tocar com os amigos dele".
Armstrong e Dirnt se tornaram inseparáveis, diz o guitarrista, desde o momento em que se conheceram. "Nós sentíamos um vazio em nossa vida na época." O pai de Armstrong estava morrendo; Dirnt, que é adotado, se dividia entre seus pais separados. Em certo ponto, Dirnt, o palhaço da classe na escola, mudou-se para a casa do amigo. "Ele era um moleque de pavio hipercurto", se lembra Armstrong, "falando, insultando as pessoas sem parar". Ao conhecer Dirnt, uma das irmãs do guitarrista o perseguiu com uma faca de açougueiro. "Pensei: 'Isso quer dizer que você é parte da família'", completa. Cool era o músico com mais experiência na banda, quando entrou para substituir o baterista original, John Kiffmeyer, em tempo de tocar na gravação de Kerplunk (1992). Dois anos depois de Cool ter nascido em Frankfurt (Alemanha), onde seu pai servia na época, a família se estabeleceu em uma montanha remota no norte da Califórnia. Um dos poucos vizinhos era Larry Livermore, um punk na casa dos 30, que fundou a banda Lookouts com o pré-adolescente Cool em 1985. Livermore também foi o co-fundador da Lookout Records, responsável pelos primeiros discos do Green Day. "O que primeiro me chamou a atenção em Billie foram suas melodias", recorda Cool. "Ele não tentava gritar o maior número de sílabas possíveis em uma única nota. Tinha essa coisa meio Beatles." Cool teve problemas para se encaixar no Green Day no início. Dirnt e Armstrong tinham esse "lance meio Paul-e-John", diz se referindo a McCartney e Lennon. Quando pergunto quem era quem, Cool responde sorrindo: "Ainda não sei. Acho que hoje em dia Billie é Paul e John".
"Não estávamos acostumados a ter alguém com tanta energia", diz Dirnt sobre Cool, o que é de se impressionar vindo do baixista tagarela. "Sério. Nós acordávamos de manhã durante a turnê e a primeira coisa que ele fazia era falar. Quando era mais novo, sua voz tinha um tom bem mais alto. E eu dizia: 'Cara, cala a porra dessa boca. Vou te matar'." Em sua defesa, Cool diz que Dirnt "acorda sempre de mau humor. Qualquer coisa irrita Mike pela manhã. Ninguém quer acordá-lo. Você tem que cutucá-lo com uma vareta bem longa e correr direto para a porta". Armstrong é quem manda nas composições do Green Day, mas há muita verdade nos créditos colocados nos álbuns, que dão a autoria à banda como um todo. Armstrong, Dirnt e Cool fazem juntos todos os arranjos e ensaiam o resultado com intensidade quase militar. "Eles têm uma sensibilidade conjunta que só se ganha com o tempo, estando muito próximos por um longo período", diz Vig. 21st Century Breakdown é seu primeiro trabalho com o Green Day (a maior parte dos trabalhos anteriores da banda foi produzida com Rob Cavallo), mas eles foram apresentados antes, quando participaram de alguns festivais com o Garbage, banda em que Vig toca bateria.
"Eles eram como uma gangue", conta Vig. "Um terminava a frase do outro. E tocavam incrivelmente bem. Quando eles fazem o que o Green Day faz de melhor - o som rápido, totalmente no ritmo - Billie praticamente se torna uma máquina."
"Ainda nos movemos em supervelocidade - não esperamos ninguém", declara Dirnt, satisfeito. "Há uma criança dentro de nós que é muito mais substancial na gente do que nas pessoas com quem crescemos - ou do que nas pessoas que cresceram em famílias normais. Acho que um bom teste para ver se um adulto perdeu ou não sua criança interior é perguntar se ele ainda tem um número da sorte ou uma cor favorita."
"Eu ainda tenho. Meu número da sorte é 11. A cor favorita é um azul-escuro."
Ok, pedidos!", berra armstrong. "É a hora da porra dos pedidos!" É a noite após o show no Fox Theater e o Green Day está no palco novamente - desta vez do outro lado da rua, espremido no minúsculo palco do Uptown Bar, tocando para uma plateia de 220 pessoas igualmente apertadas. A banda toca todas as músicas de 21st Century Breakdown pela segunda vez em dois dias. Então Armstrong desencana da segunda metade do set list, começa uma cover dos Buzzcocks e depois engata com o resto da banda em um trecho de "Ziggy Stardust", de David Bowie ("Conseguimos tocar 30 segundos de qualquer música já gravada", se gaba Armstrong). Quando alguém na plateia grita "Cheap Trick!", o Green Day começa um medley fantástico de "Surrender" e "Bastard of Young", do Replacements, alternando os refrãos das duas músicas. "Me sinto como se tivesse passado por um período de privação nos últimos três anos", diz Armstrong na tarde antes do show, se referindo ao tempo que a banda levou para elaborar 21st Century Breakdown. "Quando entro no palco, me sinto completamente dentro do meu elemento, totalmente feliz. É o meu lugar." E é lá que o Green Day estará ao longo de 2009. Não é preciso muito esforço para fazer Armstrong falar sobre a pilha de ideias em sua cabeça para um novo disco da banda. A mais curiosa: "Gostaria de gravar na China. E também de ver Mike compondo mais. Gostaria de tornar as coisas mais enxutas, acústicas - ver o quão mais calmo nosso som pode ficar sem perder o drama e a força."
Armstrong já está envolvido na adaptação teatral de American Idiot, dirigida por Michael Mayer e com estreia marcada para 4 de setembro em São Francisco. "Billie tem muita parte nisso", diz Mayer, que também dirigiu o musical da Broadway vencedor do prêmio Tony, Spring Awakening. "Continuo mandando para ele diferentes versões do meu cenário por e-mail - ele é totalmente a favor dos experimentos que quero fazer." Recentemente, conta Mayer, Armstrong lhe disse que "'A próxima coisa que quero fazer é escrever algo inédito para você dirigir'".
"No momento, ele está sendo atormentado por alguma composição nova em seu cérebro, tenho certeza", diz Cool. "É algo que ele não consegue parar." Mas
há uma ponta de preocupação em toda essa empolgação constante de Armstrong, como se não conseguisse parar de correr com medo de ficar para trás. O guitarrista conta uma história a respeito de um colega de escola, James Washburn, que levou uma cópia do primeiro álbum do Green Day para a aula de inglês, logo depois do lançamento.
"Eu já tinha largado os estudos", relembra Armstrong. "Ele disse ao professor, 'Olha só o que Billie fez'. O professor viu e começou a corrigir minha ortografia no encarte." Armstrong dá um risinho nervoso. "É o tipo de coisa que pode te deixar bem inseguro e vulnerável."
"Talvez seja por isso que tão pouca gente tente", continua. "É possível se assustar com a ambição - ter a audácia de querer ser tão bom quanto Lennon, McCartney ou Strummer, que fi zeram coisas fantásticas antes de mim. Me sinto um estudante: 'Quem diabos penso que sou?'"
"Mas você tem que lutar para superar isso", insiste, com seu discurso rápido. "Quem lança os maiores montes de merda são justamente os que confiam demais em si mesmos. Se você chegou a um ponto em que está trabalhando duro, mas não tem mais ideia do que está fazendo, é porque está no caminho certo."
Armstrong ainda não tem noção se o próximo álbum do Green Day vai ser outro monstro conceitual ou apenas um amontoado de canções punk. Mas vai saber quando a ideia vier. Porque, como ele mesmo descreve, "ela me acerta a cabeça como se fosse 1 tonelada de tijolos. E não é só uma ideia. É uma obsessão".
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