Cineasta estreante, Dave Grohl explica as motivações por trás de seu filme, Sound City
Katie Van Syckle | Tradução: Ligia Fonseca Publicado em 14/02/2013, às 12h07 - Atualizado às 12h09
Depois de estrear o longa-metragem Sound City, sobre o lendário estúdio de gravação norte-americano, e apresentar a superbanda Sound City Players no Festival Sundance de cinema, no mês passado, Dave Grohl finalmente está pronto para comemorar. “Sundance sempre foi a nossa meta”, conta. “Se conseguíssemos cumprir o prazo, enviar e ser aceitos, é onde estrearíamos o filme. [Em 2012] ficamos superbêbados em uma cabana nas montanhas e pensamos: ‘Se voltarmos, a festa vai ser aqui’. Isso foi há um ano e realmente aconteceu.” A Rolling Stone se encontrou com Grohl em um apartamento perto das montanhas com vista para Park City, e falou com o baterista e diretor estreante sobre por que o filme é a coisa mais importante que ele já realizou na vida.
Tenho uma teoria de que Sound City é, na verdade, sua autobiografia. É mesmo?
Bom, o filme é estruturado com três caras de Seattle entrando em uma van. O legal sobre a história de Sound City é que não é uma história só. Tenho certeza de que cada um dos músicos contaria a história da mesmíssima forma. O amor pelo estúdio, como foi importante para eles, como aquele lugar mudou a vida deles, o que a tecnologia fez com a maneira de compormos músicas e o que fez com Sound City e a importância do elemento humano na música. Aposto que Neil Young, Tom Petty, Stevie Nicks e Rick Springfield poderiam rodar o mesmo filme que rodei, porque, mesmo na introdução, quando digo “éramos moleques, tínhamos essas músicas e sonhos e os jogamos no porta-malas de uma van”, cada um deles poderia dizer a mesma coisa. Sempre tive uma ligação forte com esse estúdio, porque o Nirvana não era para ser a maior banda do mundo. Simplesmente não era. Quando ficamos lá 16 dias, não estávamos gravando o álbum com a intenção de mudar o mundo. Só queríamos que soasse bem... O fato de o que aconteceu realmente ter acontecido me faz pensar que há mais do que fios e botões naquele lugar. Pessoalmente, tenho uma ligação emocional forte com ele. Musicalmente, há algo mágico ali, e, quando ouvi que estava fechando as portas, pensei: “Tenho um estúdio, gravo discos todo dia. Se pudesse ficar com aquele equipamento que considero a melhor mesa de som na qual já trabalhei e que é responsável pela pessoa que sou seria um encontro emocional que fecharia um ciclo enorme para mim”. E é por isso que fiz o filme.
Como você chegou lá? Como foi parar no Sound City?
Não me lembro. Acho que o Nirvana tinha assinado com a David Geffen Company e a gravadora nos deu... Talvez US$ 100 mil, ou US$ 60 mil, para fazer um álbum e, em vez de simplesmente nos mandar um cheque para Seattle, decidiu que queria que viéssemos a Los Angeles para poder nos vigiar. Não podíamos pagar um daqueles lugares chiques no centro, então ficamos sabendo de um lugar que tinha uma antiga mesa de som Neve. Nenhum de nós havia estado lá antes.
E como decidiu convidar todos os artistas para gravar com você no filme?
Parte de cada discussão com os músicos era sobre o elemento humano de fazer música. Sentimento, imperfeição, emoção, a conversa como instrumentista, a conversa entre instrumentistas, o ofício. Se você está falando de espontaneidade e conexão em um momento, o trecho McCartney/Nirvana faz todo o sentido. Eu nem teria de dizer isso, você simplesmente assiste e pensa: “Uau, eles acabaram de entrar juntos em uma sala e fizeram algo explosivo do nada por causa da energia naquele lugar”. Poderia levar anos explicando como ou por que isso acontece, mas, se você assistir, esses sete minutos fazem todo o sentido.
Lançar um disco da trilha sonora foi o próximo passo?
Queria mostrar que todos esses músicos vêm do mesmo lugar. Queria formar essas combinações de pessoas que normalmente não fariam discos juntas. Um cara do Germs tocando com um beatle. Rick Springfield tocando com o Foo Fighters. Essas configurações foram feitas para mostrar que somos pessoas e somos músicos. Comecei na garagem, você começou na garagem, pode ter ido por esse caminho, e posso ter ido por aquele caminho, mas, no fundo, ainda estamos no lugar onde começamos, espero. Então, foi divertido fazer músicas novas e não simplesmente voltar e tocar coisas velhas.
McCartney fará turnê com você?
Estou cruzando os dedos e esperando que sim. Muitas vezes, a coisa é de última hora. Não sei se você já o encontrou, mas ele é o máximo. É muito gentil, ama tocar e realmente entende quem é e o que representa para todos, mas da melhor maneira possível. Cheguei ao ponto de não ter medo de dizer: “Ei, Paul, quer tocar?” Porque sei que normalmente ele quer. Ele gosta de tocar com os outros.
Qual foi a sensação de estar naquele estúdio com ele?
Foi uma loucura. O interessante nos músicos daquela geração é que são pioneiros. Eles mudaram o mundo porque estavam fazendo algo que ninguém mais fazia e não tinham medo daquilo. Então, quando você toca com Roger Waters ou John Paul Jones ou Paul McCartney ou Mick Jagger, eles não têm medo de ficar esquisitos. Nossa geração é que é insegura com a música. Muita gente da minha geração está tão focada em tocar as coisas corretamente ou perfeitamente, que fica presa em uma zona de conforto. Não está disposta a, digamos, radicalizar. E Paul, definitivamente, está disposto. Aquele dia foi muito engraçado porque, sinceramente, Krist [Novoselic] e Pat [Smear] nunca tinham encontrado Paul e estavam muito nervosos – apavorados. Os Beatles significaram o mesmo para todos nós. Quer dizer, sem os Beatles não seríamos quem somos, então, quando começamos a tocar pelas primeiras duas horas, talvez, estávamos tão impressionados com o Paul, que nos esquecemos do Nirvana. Demoramos algumas horas antes de eu perceber – espera um pouco... Não fazemos isso há uns 20 anos, Krist e Pat e eu – uau, que legal. E o Paul está aqui também.
Por que as pessoas não assumem riscos como antes?
Esta é uma longa conversa. Parte da intenção do filme Sound City é mostrar que a música é algo muito humano e que não há certo ou errado. Quando você assiste às apresentações, vê essas lendas em uma posição muito vulnerável. Vê Paul McCartney pedindo conselhos a Butch Vig, vê Stevie Nicks dizendo: “Não, não, pare, estraguei tudo”. Talvez você não imagine essas coisas porque está acostumado ao ícone e ao álbum ser tão perfeito ou imaculado. A produção moderna faz com que a música pareça quase inumana e acho que isso não é algo desejável. Você deve aspirar ao oposto disso. Como posso ser mais verdadeiro? Como posso ser mais perturbado? Como posso transmitir mais emoção com minha voz? Como posso fazer minha voz falhar? Como o ritmo pode ser acelerado para trazer alguma tensão à música? Em vez de – como posso tocar perfeitamente na batida ou como cantar perfeitamente afinado? Cada músico deve se concentrar no ofício e ser o melhor que consegue, mas não acho que o objetivo seja a perfeição. Então, se você ouve uma música como “Helter Skelter” e a dá ao cara que produz os discos da Ke$ha e pergunta: “Ei, acha que vai ser um sucesso?”, o que diabos acha que ele diria? “Ahn, está fora do tom, do ritmo, a letra não é pegajosa.” Acho que o motivo para essa música ser tão incrível é como ela te faz sentir. Tem uma vibração, e tem isso porque são pessoas.
Você não é fã da Ke$ha?
Amo a Ke$ha, acho que ela é um doce, mas não acho que seu produtor goste do Álbum Branco. Talvez goste, não sei.
Foi difícil aprender a ser um diretor de cinema?
Não. Este filme não foi difícil de fazer. Apocalypse Now – esse provavelmente foi difícil. O filme Sound City foi realmente reunir amigos e ir fundo no que a música significa para cada um de nós, contar a história de um estúdio muito querido e tentar dar ao espectador algo que o inspire a se apaixonar pela música como eu me apaixonei.
Você disse na estreia do filme que a sensação é a de que é a coisa mais significativa que já fez.
Quando você está gravando discos, está tentando fazer o melhor álbum possível, para que ele represente a pessoa que você é ou a banda em que está. Sound City é diferente. É mais sobre moleques irem ver esse filme e ficarem inspirados a ir a uma loja, comprar uma guitarra, montar uma banda, tocar na garagem e conquistar o mundo, porque isso ainda pode rolar. Acontece o tempo todo. Pessoalmente, é a coisa mais importante que já fiz, porque não é para mim. A história e a ideia – parece uma autobiografia, posso entender, mas, essencialmente, estou tentando mostrar às pessoas o que é ser músico, e espero que elas absorvam isso. Para que exista outro moleque em uma garagem e, daqui a 20 anos, minha filha me dê um disco e diga: “Pai, acho que você vai gostar disso”. E será alguma banda nova que se tornará a maior do mundo.
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