Noel Murray Publicado em 13/01/2016, às 18h18 - Atualizado às 18h54
Ninguém que estivesse prestando atenção na carreira de David Bowie ficou surpreso quando ele começou a atuar em filmes. O único mistério era o motivo de ele ter demorado tanto e por que razão fez tão poucos trabalhos no cinema. Como astro do rock, o homem nascido como David Robert Jones passou a década de 1970 experimentando com personagens diferentes e cantando músicas como "Ziggy Stardust" ou "Thin White Duke". Ele fazia shows descaradamente teatrais e divulgava sua música em curtas viajantes anos antes da MTV ser criada. Com sua voz macia e agradável, rosto angular e olhos distantes, Bowie tinha uma presença naturalmente magnética na tela.
E embora a filmografia de David Bowie seja, para a surpresa de ninguém, bastante variada – ele interpretou de tudo, do vampiro secular decadente a Pôncio Pilatos, passando por Andy Warhol – ela também é bem curta, infelizmente. Foi apenas um punhado de papéis principais e uma série de longas nos quais ele dava uma passada, fazia participação e roubava a cena. A seguir, os melhores momentos da carreira alternativa do roqueiro.
Por Noel Murray
Bowie já ficava no topo das paradas pop fazia meia década quando o diretor Nicolas Roeg pediu a ele que interpretasse um alienígena neste exercício alegórico e artístico de ficção científica, com base no livro de Walter Tevis. Assim como Bowie, o anti-herói do filme é alguém que se parece muito e age como nós, só que de forma muito mais esperta – como se ele tivesse tido acesso a alguma sabedoria secreta que simplesmente não conseguiríamos entender nunca. Apesar de o filme ter naves espaciais e tecnologia avançada, ele ao mesmo tempo é um docudrama a respeito de como é ser extraordinário e mostra o quanto o personagem único vai se tornando mais fraco conforme evolui para algo mais humano.
O triunfo de O Homem que Caiu na Terra durou pouco para Bowie, cuja tentativa seguinte de glória na tela grande veio na forma desse melodrama de época do diretor David Hemmings. A trama se passa em Berlim (cidade que o músico já estava explorando em discos como Heroes), entre as guerras, e mostra Bowie como um soldado do leste europeu que trabalha como gigolô de alto nível em um prostíbulo alemão. Visualmente tão belo quanto o astro, o longa não se aproveita direito do carisma e charme de Bowie.
Em 1983, Bowie teve seu maior hit com o disco Let's Dance, o trabalho mais abertamente pop que ele tinha feito até então. Mais ou menos naquela mesma época, ele também assumiu seu papel mais "normal" no cinema, como um corajoso e atormentado prisioneiro de guerra neste drama sobre a Segunda Guerra do diretor japonês Nagisa Oshima. O personagem se torna objeto de desejo de um de seus captores. Aqui, Bowie mostrou que tinha todos os requisitos para ser um astro sério do cinema.
Bowie interpreta um vampire que, sem querer, atrai uma médica jovem e prestativa demais (Susan Sarandon) para a vida de sua mortífera esposa (Catherine Deneuve). As protagonistas são as duas mulheres, mas o cupido accidental delas tem várias cenas memoráveis. A performance serve quase que como uma continuação da angústia existencial de O Homem que Caiu na Terra (mas com muito mais sangue). E a abertura, com Bowie em um clube enquanto toca "Bela Lugosi's Dead", do Bauhaus, é um ícone do cinema gótico.
Bowie tem um papel pequeno no musical de Julien Temple sobre a vida noturna em Londres na década de 1950, mas se destaca como um agente que tenta influenciar um jovem fotógrafo para que ele “se venda”. Além de ter fornecido a ótima música que dá nome ao longa, ele conseguiu canalizar muito bem todos os nojentos mestres da manipulação que conheceu no showbusiness. Além disso, ele dança em uma máquina de escrever gigante. Sim, você leu certo.
Foi uma colaboração entre o criador de Os Muppets, Jim Henson, George Lucas e o integrante do Monty Python Terry Jones – mas muitos dos que amam o filme atualmente foram atraídos pela presença de Bowie. Ele interpreta Jareth, que exige que uma adolescente sobreviva a um labirinto e chegue ao final para salvar o irmão mais novo. Ele está testando a heroína porque está profundamente apaixonado por ela.
Muito do épico bíblico de Martin Scorsese foi feito para trazer a história da crucificação de Jesus a um nível extremo. Mas na única e longa cena de Bowie como um inquisidor de Cristo, ele aparece como uma das versões hollywoodianas de filmes católicos: estéril, indiferente e perigoso. É uma combinação brilhante em uma atuação, explorando os sentidos de quem Pôncio Pilatos e David Bowie são, como uma maneira de revelar o que está acontecendo nos corredores do poder enquanto o Messias pregas nas ruas imundas. Ajuda que o ator interpreta isso muito bem, parecendo quase simpático conforme coloca o salvador da raça humana no corredor da morte.
Houve uma combinação de diretor/ator mais natural do que o homem que cantou “Life on Mars” com o homem que fez Eraserhead? Assim como A Última Tentação de Cristo, a aparição de Bowie no longa de David Lynch Twin Peaks: Os Últimos Dias de Laura Palmer tem duração de apenas alguns minutos. Mas como um obsessivo agente do FBI – falando em um sotaque sulista ridículo –, o ator é tão esquisito quanto os fãs esperariam, chegando para balançar o gabinete com uma visão sombria do futuro imediato. Ele é um profeta da desgraça elegantemente vestido.
Para alguém cujos papéis em filmes eram sempre muito excêntricos, Bowie teve algumas de suas melhores atuações na telona como figuras históricas da vida real. Ele está especialmente doce nesta cinebiografia da lenda da arte urbana Jeaa-Michel Basquiat, interpretando o conhecido do protagonista (e de Bowie na vida real) Andy Warhol. Outras versões cinematográficas do excêntrico artista pop o retrataram de alguma forma cruel ou fora de alcance, mas neste filme ele está justamente encantador, mesmo quando o ícone da Pop-Art está se alimentando da energia de um jovem pintor. Quando ele fala sobre o verdadeiro preço da arte – enquanto fala em sílabas e murmura sutilmente – o Warhol de Bowie é tão vital quanto o que ele canta em Hunky Dory.
A genialidade da abordagem camaleônica de Bowie na música, arte e cinema era visível até quando ele estava sendo “ele mesmo” – ninguém poderia nunca acreditar que estava vendo o David real (À propósito, isto o permitiu manter a vida pessoal e familiar longe dos olhares do público). Mas alguns dos melhores momentos dele nas telonas foram como David Bowie: interpretando a própria música no filme do show Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1973), de D.A. Pennebaker, e no drama alemão sobre vício em drogas Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada e Prostituída (1981); advogando pelo roqueiro Scott Walker no documentário 30th Century Man (2006); e até interpretando a última autoridade em modelos na comédia cult de Bem Stiller Zoolander. A cena na qual ele diz: “Talvez eu possa ajudar” e o nome David Bowie surge em uma tela foi suficiente para abalar com tudo. Quando e onde aparecesse na tela, o homem estava completamente fascinante, trazendo sua estranheza inata e entusiasmo teatral todo momento.
Outra abordagem fantástica e uma personalidade da vida real: a interpretação de Bowie de Nikola Tesla é fundamental na adaptação de Christopher Nolan do romance de Christopher Priest, porque marca o momento em que o filme faz a transição de pura ciência para mágica. Quando o grande engenheiro elétrico emerge de uma nova de fumaça e luzes artificiais – ostentando o rosto de uma lenda do pop – ele é imediatamente convincente. Ninguém nunca duvidaria de que David Bowie poderia fazer uma máquina que faz tudo.
Andrea Bocelli ganha documentário sobre carreira e vida pessoal
Janis Joplin no Brasil: Apenas uma Beatnik de Volta à Estrada
Bonecos colecionáveis: 13 opções incríveis para presentear no Natal
Adicionados recentemente: 5 produções para assistir no Prime Video
As últimas confissões de Kurt Cobain [Arquivo RS]
Violões, ukuleles, guitarras e baixos: 12 instrumentos musicais que vão te conquistar