James Corden Uma Aventura Norte Americana - Mark Seliger

James Corden: Uma Aventura Norte-Americana

Este apresentador está redefinindo o alcance da programação de fim de noite na TV – uma carona por vez

Stephen Rodrick Publicado em 22/11/2016, às 14h57 - Atualizado em 31/07/2018, às 13h51

Matt Damon está no topo de um edifício em Los Angeles correndo em direção à beirada e as pessoas estão com medo de que ele morra. James Corden não é uma delas. Damon está reprisando seu papel de Jason Bourne, andando rapidamente e olhando sobre o ombro de sua surrada jaqueta de couro. Então, dá de cara com um inglês gordinho que está usando exatamente a mesma roupa. Damon sorri.

É Corden, apresentador do The Late Late Show e orgulhoso filho de Hazlemere, Buckinghamshire, um condado da Inglaterra. Falta uma hora para a gravação do programa de Corden e ele e Damon estão gravando uma espécie de cena de ação. A ideia é que Corden aborde Damon e conte histórias de quantas vezes foi confundido com ele (Corden tem uns 40 kg a mais, provavelmente). Damon promete colocá-lo no próximo filme da franquia Bourne (como dublê), apenas para fazê-lo calar a boca.

Damon só tem duas horas para filmar o esquete de três cenas antes de pegar um voo para Nova York. Infelizmente, alguma bobagem está retardando as coisas. Há uma última cena a filmar no heliporto da CBS, na qual Damon e depois Corden fingem que estão pulando do teto e caindo em uma lixeira, com o ator convencendo Corden de que acrescentar air bags fará o truque parecer falso (no esquete, o apresentador cai fora da lixeira e desloca o pênis). Surge um problema quando os executivos do canal querem interromper a gravação porque acham que Damon deveria usar um dispositivo de segurança enquanto chega perto da beirada do teto. O tempo está passando. Corden perde a paciência. “Ele não vai pular do prédio pra valer”, diz, aumentando o tom de voz e ficando com o rosto vermelho. “Deus do céu, não está no roteiro ele pular, não vai acontecer. Isso é loucura.” Sheila Rogers, diretora de agendamentos de Corden, o abraça e caminha com ele até uma tenda, onde o apresentador se recompõe. Minutos depois, ele vem até mim e ri de um jeito mordaz britânico: “Será que eu me sentiria mal se Matt realmente caísse?”, pergunta. “Como sairia dessa?”

Cenas assim são o que sustentam o programa de Corden. Seu “Carpool Karaoke”, quadro no qual ele e uma celebridade dirigem por aí em uma SUV cantando sucessos, já teve de tudo, de Adele a Michelle Obama e Stevie Wonder. Se juntar todos os episódios, dá quase 1 bilhão de visualizações no YouTube. “Karaoke” é a parte mais conhecida, mas tudo é monetizado no The Late Late Show. Há 1 milhão de maneiras de ter 1 milhão de acessos no YouTube, e parece que o programa já tentou todas. Há Corden lendo notícias escritas apenas em emojis. Há Corden vestido como uma colegial para uma interpretação de “All About That Bass”, da cantora Meghan Trainor. O mais importante é que The Late Late Show, que já foi visto apenas por insones e universitários, agora está disponível para gente normal. “O programa vai ao ar à 0h37”, Corden conta. “Só concorremos com pessoas que escolhem ir dormir ou não, mas, na internet, o jogo é completamente diferente.”

Damon e Corden finalmente rodam a cena no teto sem ninguém morrer. Enquanto todos voltam correndo ao estúdio para tomar um banho, Damon conta um segredinho a Corden: a última vez em que chorou foi quando Corden fez o “Carpool Karaoke” com Stevie Wonder, que ligou para a esposa de Corden e cantou “I Just Called to Say James Loves You”.

Em um mar de gente ambiciosa, James Corden é o homem mais bem-sucedido e versátil entre os apresentadores de programas de late night em canais abertos. Ele já ganhou um prêmio Tony. Já foi apresentador da cerimônia dos prêmios Tony. Coescreveu a amada sitcom britânica Gavin & Stacey. Estrelou filmes independentes aclamados pela crítica. Colocou a Broadway e um piloto para a HBO em espera para apresentar o The Late Late Show, que, em seu primeiro ano completo, recebeu quatro indicações ao Emmy. Igualmente crucial para os contadores de dinheiro da CBS, transformou o The Late Late Show em uma empreitada lucrativa disponível para qualquer um que tenha entre 8 e 80 anos de idade e saiba clicar em um link.

O programa de Corden pode ser relativamente novo, mas ele está tentando entrar no jogo de Hollywood há anos. “Tinha reuniões com pessoas que me diziam o quanto queriam trabalhar comigo e nada acontecia”, conta. “Nas primeiras vezes em que fui para Los Angeles, ficava dirigindo por aí morrendo com tanto encorajamento [sem resultados práticos].” Foi algo revelador para Corden, que ganhou um Tony em 2012 por One Man, Two Guvnors e tinha sido um dos maiores astros na Inglaterra durante toda uma década. “O negócio é que a maioria das pessoas aqui nos Estados Unidos não sabe que trabalhei minhas 10 mil horas”, diz, citando a ideia do escritor Malcolm Gladwell de que são necessárias 10 mil horas para se tornar proficiente em qualquer tarefa.

Corden lembra que quis ser artista pela primeira vez aos 4 anos, quando foi ao batismo de sua irmã Ruth, ficou em pé em uma cadeira para poder ver e começou a sorrir para os paroquianos. Ficou maravilhado com as risadas. Alguns anos depois, cabulou aula, ligou para um programa de TV sobre bullying e inventou uma história exagerada sobre ter ficado em casa porque tinha pavor de ser zoado. Enganou a todos – exceto uma tia que estava ouvindo e o denunciou aos pais. Seus dias mais produtivos eram passados com o pai, que o levava para fazer testes por toda Londres, sem resultado algum. Finalmente, depois de anos de rejeições, começou a conseguir papéis baseados nas duas facções de seu tipo físico corpulento. Uma de suas primeiras chances foi com o papel de um valentão gordo, violento e deprimido no filme Agora ou Nunca (2002), do amado diretor britânico Mike Leigh. Depois, foi para o lado oposto no drama da BBC Fat Friends, como um adolescente impiedosamente ridicularizado e agredido por ser obeso. Durante toda a carreira, Corden fez piada com seu peso. Foi revelado na Broadway com o papel de Timms, o gordinho engraçado da turma em The History Boys. No começo, compreensivelmente, Corden usava clichês para falar sobre os desafios de ser um homem grande no mundo do entretenimento, dizendo que os pais o amavam e ele nunca se sentiu desconfortável na própria pele, mas, em nosso segundo dia, ele dá mais detalhes. Criamos uma conexão depois que ambos admitimos que, após bebedeiras, já havíamos roubado comida de bandejas abandonadas de serviço de quarto. “Meio hambúrguer”, Corden revela rindo alto. “Foi a primeira vez na vida que percebi que as pessoas pedem comida e não comem tudo.” Depois, ele fica um pouco mais introspectivo sobre ser o gordinho alegre na cruel adolescência. “Se você é um cara na escola, tem duas opções”, afirma, quase sussurrando. “Vai ser um alvo. Se está no meu lugar, diz: ‘Certo, vou virar um alvo maior. Minha confiança os deixará apavorados’. Era assim que me sentia. Por dentro, você está apavorado, mas, se é engraçado e mais rápido do que eles, não vão voltar a te incomodar.” Ainda assim, Corden revira os olhos azuis quando discute a forma como Hollywood vê pessoas consideradas acima do peso. “Nunca consegui entender, quando assisto a comédias românticas”, diz, “a noção de que, por algum motivo, gente feia ou gorda não se apaixona. Se isso acontece, é de um jeito estranho, maluco, indireto – e não é assim. É exatamente do mesmo jeito [como é com qualquer pessoa]. Conheci minha mulher, ela mal tinha uma TV e trabalhava para a ONG Save the Children. Sentamos uma noite e nos apaixonamos e foi isso”.

Na primeira vez em que o CEO da CBS, Les Moonves, entrou em contato com Corden, o ator não sabia ao certo se queria ser apresentador de mais um late show. “O fato de a primeira oferta ter sido muito baixa ajudou”, diz Corden. No entanto, alguns meses depois, ele estava filmando The Wrong Mans na África do Sul enquanto a família estava a milhares de quilômetros, na Inglaterra. “Pensei: ‘Isso vai ficar cada vez mais difícil’”, afirma. “Achei que, se pudesse fazer algo criativo e interessante no programa, seria uma oportunidade que não teria novamente.” Quando Moonves fez uma oferta melhor, Corden aceitou. “Tirando o fato de que sou um homem branco, ter me escolhido foi algo ousado”, diz com um sorriso irônico.

Corden e o produtor executivo Ben Winston sabiam desde o começo que o programa tinha de ser notavelmente diferente dos outros para compensar o semianonimato dele. Precisavam de um quadro recorrente característico, como as listas de Top 10 de David Letterman, as celebridades lendo posts raivosos do Twitter de Jimmy Kimmel e as notícias cantadas de Jimmy Fallon. Corden teve a ideia de “Carpool Karaoke” anos antes, desde que fez uma cena para arrecadar fundos para uma entidade beneficente. Nos primeiros dias do programa, a representante de Mariah Carey estava no escritório do Late Late Show com outra cliente e Corden a convenceu de que a cantora deveria fazer o primeiro episódio do quadro. Foi um sucesso instantâneo, com mais de 26 milhões de visualizações no YouTube. Todo mundo, de Wonder a Justin Bieber, veio depois, incluindo Elton John, que apareceu no programa imediatamente depois da transmissão do Super Bowl.

O segmento é marcado pela empolgação de Corden. No de Adele, ele cantou uma nota aguda em “Hello”. A cantora ficou espantada e mandou ver. Os segmentos são produções simples e cabe a Corden deixar todos à vontade. “Você entra no carro. As portas fecham. Só estão vocês dois. Você coloca música e vamos cantar a plenos pulmões. O que digo para todos é que este é um lugar seguro. Quanto mais você se entregar nas músicas, melhor fica. Tenho de entrar em um acordo com eles nisso. Se fico tímido nesses momentos, eles dirão: ‘Espera, o que estou fazendo?’”

O motivo para dar tão certo é que há uma afabilidade natural em Corden. Diferentemente dos Lettermans e Conans de antigamente, ele não é uma espécie de lunático obscuro. É só um rapaz fofinho na sua TV pedindo que você o ame. “Carpool Karaoke” é uma grande plataforma no compromisso de Corden e do produtor Ben Winston com um tipo de talk show diferente, que faz as pessoas esquecerem o ciclo ininterrupto de notícias sobre terror e caos em vez de usar a idiotice dessas notícias como material para um programa de TV.

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