Redação Publicado em 16/09/2015, às 18h02 - Atualizado às 20h48
Foi cedo na carreira que Johnny Depp percebeu que os visuais dele seriam mais interessantes como um obstáculo do que como uma muleta – e Tim Burton foi o diretor perfeito para direcioná-lo ao caminho devido.
Essencialmente interpretando um barbeiro, uma versão sombria de Frankenstein, Depp transformou um personagem definido por sua isolação com um tipo de performance que seria compreendida por todo mundo, dos leitores de revistas de fofoca aos esnobes dos museus de arte.
A versão de Depp de Willy Wonka é como se uma pequena criança estivesse tendo uma experiência de terror noturno protagonizada pela versão de Gene Wilder, do filme original. O icônico magnata das calorias de Roald Dahl é reinventado como uma mistura de Howard Hughes e algo que poderia ser retratado no reality norte-americano To Catch a Predator .
O look de Depp é definido por uma maquiagem branca no estilo Kabuki e imensos óculos escuros brancos – é uma confusão de novas ideias ruins e ideias ruins que ele e Burton já haviam tido antes (parece que Ed Wood está por trás de todas essas propostas).
Depp não tem exatamente uma história rica em interpretar um homem comum, tradicional (O Turista é provavelmente o maior perto que ele chegou disso ultimamente e, bem, melhor não comentar muito).
Mesmo em 1993, a normalidade do papel epônimo do astro neste drama foi impressionantemente contra o estereótipo: a primeira grande cena traz ele colando etiquetas de preços em latas de sopa na humilde quitanda em que trabalha.
Pode não ser tanta culpa de Depp, devido às pressões do sistema de estúdios, mas a visão de Tim Burton para Alice no País das Maravilhas nunca desceria por um buraco de coelho sem um grande papel para um dos astros pagáveis da Terra.
Pegar um personagem de pequena participação do romance de Lewis Carroll, grampear uns tufos de cabelo laranja em seu couro e enchê-lo de conversa fiada: o Chapeleiro de Depp – exageradamente modificado digitalmente – é um exemplo que serve de alerta para atores que acham que fazer muitas escolhas sobre um personagem irá naturalmente guiá-los à escolha correta.
Seria irresponsável não observar que uma das melhores performances de Depp resultou de ele interpretando um homem que, entusiasmadamente, ilude-se ao pensar que está fazendo grandes filmes. Mas seria leviano sugerir que a propensão de Ed Wood à ilusão é o que fez de Depp o ator perfeito para resgatar o personagem da tradição de Hollywood.
Pelo contrário, Depp é a pessoal ideal para o papel porque – e esse filme deixa isso claro – o ator trabalha a partir de um lugar amoroso (O fato de que ele não desviou desta abordagem é o que faz a performance dele como Whitey Bulger ser fascinantemente arrojada).
A carreira de Depp nunca mais foi a mesma desde que ele cruzou o caminho do Capitão Jack Sparrow e fez sucesso: o papel central da comédia-ação da franquia da Disney basicamente transformou o ator em um "vale dinheiro" humano.
O pirata mais inofensivo e tagarela em um filme na história, Sparrow foi inicialmente forjado a partir dor ares de superioridade de Keith Richards e da falta de jeito de Buster Keaton. Quando o príncipe dos sete mares retornou para sua quarta aventura, contudo, sua atuação foi menos “deus da guitarra perpetuamente bêbado” e mais “homem com uma infecção interna no ouvido que talvez esteja curtindo cosplays demais.”
Quando as pessoas se referem a Johnny Depp dizendo que ele é um “bom ator”, estão possivelmente pensando no sólido gângster de Mike Newell responsável por provar que Depp pode oferecer uma atuação séria, inquietante, quando ele quer.
Dando vida ao agente secreto do FBI (da vida real) Joseph D. Pistone (ou Donnie Brasco), Depp interpreta cada frase comum a uma realidade de gangues com uma ansiedade quase perceptível de um garoto que está fazendo um teste para o papel da vida dele. Tudo isso leva a um dos melhores momentos da carreira dele, quando Pistone declara à esposa: “Não estou ficando como eles, Maggie. Eu sou eles.”
Se o trabalho de Johnny Depp em Benny & Joon - Corações em Conflito pegou – parcialmente – algo emprestado de Buster Keaton, a performance do astro em O Cavaleiro Solitário rouba em varejo de Keaton, criando um desastrado acrobático com o poder de transformar um trem em velocidade no seu próprio brinquedo.
Mas a esta altura da carreira, Depp está roubando majoritariamente dele mesmo. Enxertando o andar trêmulo de Jack Sparrow em uma fala que é parte William Blake parte Hunter S. Thompson, o Tonto de olhos arregalados de Depp representa um pastiche zumbificado das escolhas de maior sucesso da carreira de Depp. O corvo na cabeça não é um adereço; é uma metáfora.
Hunter S. Thompson vive nesta atuação de Depp. A coisa mais incrível nesta transformação não é que ele encarna tanto a voz e o visual do Gonzo, mas que ela a sustenta por quase duas horas.
Engraçada e assustadora na mesma proporção, é fantástico o quanto desta performance iria terminar ajudando a criar o icônico Capitão Jack Sparrow. De fato, Depp foi tão bem quando interpretou o “doutor” em jornalismo que, como uma resistente folha de ácido, jamais deixaria aquele papel para trás.
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