Gustavo Krieger Publicado em 10/08/2007, às 16h16 - Atualizado em 20/02/2013, às 14h58
Todo mundo já passou por isso. o sujeito recém-contratado, novinho no emprego, vai ao departamento de pessoal e recebe um manual da empresa. Ali, em letra impressa e jargão formal, estão os direitos e deveres do novo funcionário. Normalmente, mais deveres que direitos. É preciso ler com cuidado as letras miúdas, ver o que o Plano de Saúde não cobre, que roupas você não deve usar no serviço, o que não dizer ao chefe... E por aí vai. A não ser, claro, que você seja um deputado federal prestes a assumir o novo mandato. Nesse caso, o manual da firma vira uma carta de boas-vindas. Um passaporte para um mundo cheio de mordomias e vantagens. A reportagem da Rolling Stone botou as mãos em um exemplar do livreto Informações Gerais aos Deputados Federais, distribuído a cada um dos 513 parlamentares que assumiram os mandatos no dia 1o de fevereiro. Em suas 45 páginas, o documento serve como uma radiografia da (boa) vida de nossos deputados e de quanto ela custa a todos nós. Vamos usá-lo como um guia para conhecer os bastidores do Congresso.
Os parlamentares, como todos os brasileiros, reclamam da vida. Quem caminha pelos corredores do Congresso ou escuta a conversa no cafezinho da Câmara (que, aliás, é de graça), ouve muitas queixas. Os deputados reclamam que o dinheiro não dá para nada, que o cheque especial está estourado, que sempre tem um eleitor para dar uma mordida... Quando eles estão no estado de origem, é gente pedindo dinheiro para comprar comida, arrumar a casa, material escolar para o filho. Quando ficam em Brasília, o pessoal bate nos gabinetes e pede uma verbinha para comprar a passagem e voltar para casa. O livreto dos deputados mostra que há dinheiro para tudo isso e mais um pouco.
Na página 13, está o que mais interessa: o salário. Quando o livro foi impresso, eram exatos R$ 12.847,20. Esse dinheiro é composto por três parcelas. São R$ 4.817,70 a título de "Subsídio Fixo", mais outros R$ 4.817,70 de "Subsídio Variável" (que, por sinal, também é fixo) e mais R$ 3.211,80 de "Subsídio Adicional de Atividade Parlamentar". É, os parlamentares recebem um extra pela atividade de... Parlamentares. Se você achou confuso, não se preocupe.
É mesmo para ser assim. Afinal, se fosse mais simples, qualquer pessoa poderia fiscalizar.
No parágrafo anterior, está escrito que o salário era de R$ 12,8 mil. É que essa edição foi fechada no final de janeiro e suas excelências tinham programado para fevereiro uma nova ofensiva para aumentar os próprios vencimentos. Esse assunto foi tratado em todas as conversas sobre a eleição do novo presidente da Câmara. Em voz baixa, para não irritar a opinião pública. Em dezembro de 2006, os deputados aproveitaram o finalzinho de ano para engordar os contracheques com um aumento de 91%.
"Corrigiram" os salários para R$ 24 mil sem se dar o trabalho de aprovar um projeto de lei. A reação da sociedade foi dura. Até o bispo de Brasília aproveitou uma missa no Congresso para dar uma bronca nos políticos. Nem assim eles desistiram. Foi preciso que o Supremo Tribunal Federal decidisse que o aumento era ilegal. Pela decisão do Supremo, se quiserem aumentar a própria renda, os deputados terão de fazer isso no plenário, com transmissão pela TV e tudo.
Mas há vantagens que amenizam a falta de reajuste salarial. A tal página 13 é bem ilustrativa. Uma frase diz que "o pagamento do salário é feito no segundo dia útil após o dia 20 de cada mês". O que isso significa? Que suas excelências recebem os salários entre o dia 22 e 23 do mês trabalhado. Para os brasileiros normais, o pagamento só sai no quinto dia útil do mês seguinte. Enquanto os trabalhadores normais passam o ano esperando pelo 130 salário, os deputados recebem 14 salários. Além do salário extra em dezembro, ganham outro em fevereiro.
Em janeiro, vários deputados federais deixaram o Congresso para assumir cargos em governos estaduais. Em seu lugar, assumiram os suplentes. Eles tomaram posse com o Congresso em recesso. Ou seja, não há sessões, nem projetos a votar, nem nada. Mesmo assim, ganharam o salário pelo mês de férias remuneradas, mais o "140 salário" pelo final da legislatura. Somando tudo, deu quase mil reais por dia não trabalhado.
Salário não é tudo na vida de um político. Tem muitas outras vantagens... Por exemplo, a moradia. Está lá, na página 16 do manual. Os deputados têm direito a casa de graça. A Câmara dos Deputados é dona de 432 apartamentos funcionais. São imóveis amplos, de 225 metros quadrados, com quatro quartos, localizados nas áreas mais nobres de Brasília. No mercado, imóveis semelhantes chegam a valer R$ 1 milhão. Mas não atendem às exigências dos parlamentares. No final do ano passado, 225 deles estavam desocupados. Antes de ser cassado, o folclórico deputado Roberto Jefferson viveu a insólita situação de ser o único morador em um prédio de seis andares. Sem vizinhos, sentia-se livre para soltar a voz em suas interpretações de ópera. Pela manhã, praticava corrida na garagem vazia. Bom para o deputado, ruim para os cofres públicos. Cada apartamento vazio custa R$ 2 mil para o Congresso, entre taxas de condomínio, segurança e outras contas. Todo mês, R$ 450 mil são jogados fora na manutenção desses esqueletos.
Os políticos reclamam que os apartamentos, construídos nas décadas de 1960 e 70, estão velhos e têm problemas nas instalações hidráulicas e elétricas. Para resolver essas queixas, a Câmara vai gastar R$ 37 milhões este ano e reformar 144 apartamentos. O detalhe é que, mesmo com esse gasto e com a reforma, nada garante que os imóveis serão ocupados. É que os deputados podem escolher entre morar no imóvel funcional ou embolsar R$ 3 mil de "auxílio-moradia". E sem precisar prestar contas. Existem casos de parlamentares que dividem um apartamento funcional para que um deles embolse o auxílio. Receber o dinheiro foi a opção de 301 deputados no ano passado. Ou seja, de um lado a Câmara gasta quase meio milhão de reais por mês para manter apartamentos vazios. De outro, desembolsa mais um milhão mensal para pagar auxílio-moradia aos parlamentares que não querem morar nos apartamentos.
Oficialmente, o auxílio é pago para compensar a despesa dos parlamentares, que têm de manter duas casas. Uma em Brasília e outra no seu estado de origem. O caso da bancada de Brasília mostra que não é bem assim. O Distrito Federal elege oito deputados federais. Em princípio, imagina-se que todos eles tenham residência em Brasília. Mesmo assim, da bancada anterior, seis dos oito parlamentares requisitaram e receberam todos os meses o auxílio-moradia. A lista incluía desde uma deputada do PSol até o deputado Osório Adriano, considerado um dos homens mais ricos do Distrito Federal. Foi também um dos políticos que mais gastaram dinheiro do próprio bolso para se reeleger em 2006. Quando foi questionado pelos jornalistas sobre porque recebia o dinheiro, o empresário explicou que era uma forma de aumentar o salário de deputado, que considerava baixo.
Muitos parlamentares lamentam que não exista um "auxílio-escritório", nos mesmos moldes do auxílio-moradia. Se houvesse, imediatamente esvaziariam os acanhados gabinetes do Congresso. Há três tipos de sala para os parlamentares. As mais comuns são as do anexo 4, um prédio que ganhou o ingrato apelido de "Serra Pelada", pelas janelas cor-de-terra que sugerem a paisagem do garimpo paraense. O deputado conta com banheiro privativo e uma saleta de quinze metros quadrados. Ao lado, em outra sala com o dobro do tamanho, espremem-se os assessores. Outro conjunto de salas fica no anexo 3. São o terror dos parlamentares. Nelas não há banheiro e suas excelências têm de usar os sanitários coletivos do corredor. A luta para não ser um "sem-banheiro" é tão grande que já foram registrados casos de venda de gabinetes. Deputados não reeleitos reservavam seus gabinetes para colegas que estavam chegando. Em troca, esses contratavam alguns de seus antigos assessores ou ajudavam a pagar velhas dívidas de campanha. Este ano, para evitar a corretagem, a Câmara obrigou os parlamentares a participar de um sorteio das salas. As regras estão detalhadas no livreto entregue aos parlamentares.
O que o livro não diz é que há exceções a essas regras. Deputados que presidem comissões, lideram bancadas ou fazem parte da mesa diretora do Congresso têm direito a salas mais amplas. No Senado, vale o poder. Quanto mais importante o parlamentar, mais metros quadrados ele ocupa, mesmo sem ter cargos que justifiquem o latifúndio. O ex-presidente José Sarney é dono de um andar numa das torres do Congresso. Quando era presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães investiu no futuro. Construiu um enorme gabinete ao lado da sala da presidência e mudou-se para lá. Quando renunciou ao mandato para escapar da cassação por ter violado o sigilo do painel de votações do Senado, deixou seu antigo suplente ocupando o lugar. Reeleito, reassumiu a sala. Este ano, quem entrou em encrenca foi seu vizinho de porta, o líder do governo, Ney Suassuna. Acusado de envolvimento em corrupção, Suassuna não conseguiu reeleger-se. Enquanto ele ainda lutava para salvar o mandato, ACM aproveitou e aumentou seu gabinete às custas de parte da área do colega. O poder é cruel.
Na Câmara, a maior parte dos parlamentares tem de se conformar com as salinhas apertadas. Para quem lê o manual dos deputados, a primeira coisa que vem à cabeça é tentar entender como eles fazem para enfiar lá dentro tantos assessores. Está lá, a partir da página 37: "o deputado pode indicar pessoas de sua confiança para exercer os cargos de secretário parlamentar". Podem ser até 25 funcionários por gabinete. Como seria fisicamente impossível acomodar tanta gente em salas onde não cabem mais do que cinco pessoas, o texto esclarece que eles podem prestar serviços "nos gabinetes em Brasília ou em suas projeções nos estados". Oficialmente, eles têm de trabalhar oito horas por dia, mas, na prática, não precisam passar nem perto do Congresso para bater ponto. Para pagar toda essa gente, cada deputado tem um orçamento de R$ 50,8 mil por mês e decide como vai gastá-lo.
Não perca as contas. Até aqui, cada deputado está custando R$ 66.662,82. São R$ 12,8 mil e uns quebrados de salário, R$ 3 mil de auxílio-moradia e mais R$ 50,8 mil e trocados para pagar os assessores. E ainda tem mais coisa. O limite de R$ 50 mil para salários é para os deputados comuns. Os que pertencem à elite da Câmara e ocupam cargos mais importantes têm folhas de pagamento mais amplas. Há cargos de confiança vinculados à mesa diretora, às comissões e às lideranças. São os Cargos de Natureza Especial, ou CNEs, com salários que chegam a R$ 8,2 mil mensais.
Em agosto do ano passado, o jornal Correio Braziliense investigou onde andavam esses "assessores especiais". A descoberta confirmou velhas suspeitas. Entre eles, havia parentes de parlamentares, assessores de políticos que não tinham mais mandato e muita gente que nunca pisou em Brasília. O jornal descobriu que, mesmo sem exercer mandato, 22 ex-deputados mantinham 48 afilhados em cargos de natureza especial na Câmara ao custo de R$ 1 milhão por ano. O recordista em nomeações era o ex-presidente da Câmara, Severino Cavalcanti. O deputado pernambucano, que renunciou para não ser cassado depois de ser acusado de extorquir o administrador de um dos restaurantes da Câmara, mantinha 12 afilhados na folha de pagamento do Congresso.
A festa dos empregos comissionados custava R$ 20 milhões à Câmara. Os cargos, supostamente técnicos, eram loteados entre 173 deputados e ex-parlamentares. Os repórteres Lúcio Vaz e Fabíola Góis foram visitar a Coordenação de Registro Funcional da Câmara, que ocupa o 100 andar da torre sul do Congresso. Em oito salas, trabalhavam 38 servidores. Bem menos que os 236 ocupantes de CNEs que supostamente dariam expediente naquela repartição. A lista de ocupantes de cargos de confiança incluía parentes de deputados e assessores que trabalhavam nos estados, sem nunca ter aparecido no Congresso. Um caso exemplar desses desvios era o de Gandhy Lua Patriota. O nome, pouco usual, é o da filha do deputado Gonzaga Patriota (PSB-PE). Pouco usual também era sua situação funcional. Gandhy não trabalhava em Brasília, onde fica a Câmara. Tampouco em Pernambuco, onde o pai foi eleito. Desenvolvia suas funções de "natureza especial" em Salvador, na Bahia. Foi demitida quando o caso veio a público.
Revelada a farra, a Câmara demitiu a metade dos 2,2 mil ocupantes de CNEs e aprovou um projeto para extingüir os cargos. Tomou duas outras medidas revolucionárias: proibiu a contratação de parentes de deputados para os cargos e ainda decidiu ordenar que eles assinem uma folha de ponto na própria repartição. Ah, não vale contratar pais, filhos, mães ou irmãos. Mas primos e sobrinhos estão liberados.
Um dos trechos mais instrutivos do manual para o deputado iniciante começa na página 17, sob o título: "Verba Indenizatória do Exercício Parlamentar". Diz ali que todo deputado tem direito a receber R$ 15 mil por mês para "ressarcir despesas com o exercício do mandato". Valem "apenas" gastos com aluguel, condomínio, IPTU, contas de água, telefone, luz, além de gastos com passagens, gasolina, alimentação, contratação de consultoria, pesquisas, trabalhos técnicos, propaganda do mandato, compra de material de expediente, correspondência, assinatura de TV a cabo, provedor de internet, aluguel de móveis e equipamentos e serviços de segurança. Enfim, vale tudo. E o controle deixa muito a desejar. Afinal, são funcionários da Câmara examinando notas fiscais e recibos apresentados pelos homens que mandam na Câmara. É como se você tivesse de pegar aquela nota fiscal de R$ 300,00 do almoço do seu chefe e dizer para ele que assim não dá...
Bem que o texto se esforça. Diz que "para evitar a recusa de notas fiscais, os parlamentares devem informar-se sobre as regras com a burocracia da Câmara". Ao menos para evitar absurdos. Em 2005, os deputados apresentaram uma montanha de notas fiscais de postos de gasolina. Declararam ter gasto R$ 41 milhões com combustível. Isso daria para comprar 20,5 milhões de litros de gasolina a preços da época. Suficientes para rodar 2,5 milhões de quilômetros em um carro popular. Ou seja, daria para dar 64 voltas ao mundo ou fazer três viagens de ida e volta à lua. Só um deputado declarou ter comprado gasolina suficiente para fazer duas viagens por mês de Manaus a Porto Alegre.
Mais uma vez, seguiu-se o ritual. Quando os jornais revelaram a farra da gasolina, a Câmara mudou as regras. Determinou que cada deputado pode justificar apenas R$ 4,5 mil por mês em despesas com combustível. Fazendo a conta do preço médio do litro da gasolina, ainda dá para cada parlamentar percorrer mais de 15 mil quilômetros de estrada por mês com dinheiro público.
O resto do dinheiro eles têm de justificar de outra forma. A nova moda é a nota de consultoria, além das despesas com a "divulgação do mandato". O que não dá é para deixar essa verba dormindo no cofre. As cotas são distribuídas por semestre. A R$ 15 mil por mês, cada parlamentar tem R$ 90 mil por semestre. O que não é usado nesse período volta aos cofres da Câmara. Ou pelo menos deveria voltar. No final do ano, houve uma verdadeira corrida dos parlamentares para gastar os recursos. O deputado Herculano Anghinetti, do PP de Minas Gerais, chegou a dezembro com um saldo de R$ 49.813,72. Numa impressionante coincidência, contratou serviços de consultoria em dezembro de 2006. O trabalho custou exatos R$ 49.813,72.
Ointeressante é que os deputados gastam uma fortuna com consultores enquanto a Câmara possui um corpo de 197 "consultores legislativos" - profissionais da mais alta competência e que prestam assessoria de graça aos parlamentares. Mas aí não dá para receber o dinheiro de volta.
A boa notícia é que você pode acompanhar pela internet como seu deputado diz que está gastando a verba. O endereço é www2.camara.gov.br/transparencia/verbainden.html. A má é que não dá para investigar se ele diz a verdade. O site só traz a descrição das despesas, não permite ver as notas fiscais.
Só para atualizar as contas. Com a verba indenizatória mais as outras despesas, o custo do deputado já chega a R$ 81.662,82 mensais. E ainda tem mais... A página 19 do manual fala de um assunto chato, o controle de freqüência. O texto avisa que há duas formas de controlar se o deputado apareceu para trabalhar. O primeiro controle é feito quando ele entra no prédio. O segundo acontece no plenário ou nas comissões. Quando há votação com registro no painel eletrônico do plenário, é esse registro que vale. Nesse caso, mais importante é o que não está escrito. Para começar, não está em lugar nenhum que a semana de trabalho no Congresso obedece a um calendário peculiar. Às segundas-feiras, não se vota nada. Nem às sextas. Nem nas manhãs de terça ou tardes de quinta-feira. As sessões de votação são concentradas em apenas 48h por semana. Isso quando acontecem. No ano passado, por exemplo, durante a campanha eleitoral, cada parlamentar foi cuidar de sua reeleição. O trabalho no Congresso ficou relegado a uma semana por mês. Além disso, para anular as faltas, basta que o deputado mande para a mesa da Câmara uma declaração dizendo que estava cumprindo qualquer outra atividade do mandato - reunião com assessores, um comício, uma audiência com o governo.
Superado esse "probleminha", a cartilha dos políticos da Câmara fala de assuntos mais agradáveis. Os parlamentares podem escolher entre contribuir para a previdência como pessoas comuns ou aderir a um plano específico para os deputados. Por ele, os parlamentares aposentam-se com as regras dos servidores públicos. Isso significa que, aos 60 anos de idade e 35 anos de contribuição, podem levar para a aposentadoria o salário de deputado. É uma evolução em relação ao antigo Instituto de Previdência dos Congressistas, o IPC, uma mamata que permitia a aposentadoria proporcional a partir de oito anos de mandato. Mas ainda assim é um regime especial, feito para 513 pessoas a cada quatro anos. Existe também um plano de saúde específico para os deputados e suas famílias, bem mais camarada que as condições oferecidas pelos planos que estão no mercado. No caso do parlamentar, todas as despesas médicas são reembolsáveis.
Mas, em poucos lugares o deputado é tão deputado quanto no aeroporto. Para começar, como informa o livreto na página 28, suas excelências têm direito a passaporte diplomático. Aquele especial, que garante passagem livre pela alfândega em qualquer lugar no mundo. E não é só o deputado. A regalia vale para as mulheres e filhos dos políticos. No aeroporto de Brasília, para evitar que os parlamentares enfrentem problemas rotineiros como filas, despacho de bagagem e ameaças de overbooking, a Câmara mantém um "serviço de atendimento" - servidores engravatados estão lá de plantão para garantir que os deputados tenham um embarque tranqüilo. E tudo isso sem pagar pela própria passagem. Cada deputado tem direito a uma cota de passagens aéreas, financiadas com dinheiro público, que varia de acordo com o estado. Em dezembro do ano passado, a mais generosa era a da bancada do Acre. Nada menos que R$ 15.695,56 por cabeça todo mês. A reserva diminui na mesma medida em que o preço dos vôos para Brasília cai. Os deputados de São Paulo podem gastar R$ 9,3 mil por mês com aviões. Mais uma vez, o que chama a atenção é a diminuta, mas privilegiada, bancada de Brasília. Cada um deles tem direito a gastar R$ 4,1 mil por mês em passagens aéreas, embora já morem na cidade onde fica o Congresso. Bom, eles também recebem auxílio-moradia. Ninguém pode acusar a Câmara de incoerência.
Lembra daquela verba indenizatória de R$15 mil que os parlamentares podem usar para quase tudo, inclusive pagar contas telefônicas e enviar correspondências? Pois eles têm outra cota, específica para telefones e cartas. São mais R$ 4.268,55 por mês. Vale a conta do celular, telefone de casa, do escritório do estado.... E ainda tem muito mais. Existe até cota de fita de máquina de escrever, além de 200 copos descartáveis para cafezinho e 300 para água. Tudo lá, em preto no branco no manual do deputado.
Somando tudo e, sem pensar em possíveis aumentos no salário dos políticos, cada deputado custa até R$ 101 mil mensais. Os privilégios e as mordomias são muitos. Mas já foram maiores. Vão desaparecendo à medida que são expostos para a opinião pública. A vida de um deputado hoje ainda não parece com a dos brasileiros que eles representam. Mas as diferenças diminuem ao mesmo tempo em que a informação e a cobrança da sociedade aumentam.
O repórter Gustavo Krieger escreveu o perfil da deputada federal Manuela D'Ávila na edição 4 da Rolling Stone (jan. 2007)
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