Juízes do Tribunal Regional Eleitoral investigam cinco favelas cariocas usadas como currais eleitorais. Três estão em poder das milícias, grupos de agentes do estado que agora buscam seus representantes no Legislativo
Marco Antônio Martins Publicado em 07/08/2008, às 18h18 - Atualizado em 14/08/2008, às 13h34
Candidato à prefeitura do Rio de Janeiro, o senador Marcelo Crivella (PRB) se surpreendeu ao chegar à favela de Rio das Pedras, na Zona Oeste da cidade, para um corpo a corpo com os eleitores. Um morador, que não se identificou, foi até ele e o advertiu de que "deveria pedir autorização" para fazer campanha no local. Como não tinha, o político e sua comitiva foram obrigados a deixar a comunidade e seguir para outro ponto do município.
Se em um primeiro momento a cena surpreende, na verdade, ela se tornou comum entre aqueles que disputam cargos nas eleições municipais de outubro e querem levar suas propostas a morros e favelas.
Traficantes de drogas ou milícias (grupos armados formados por ex-policiais, policiais civis, militares, agentes penitenciários e bombeiros) que dominam áreas carentes definem quem entra ou não nessas regiões. Pior. Esses milicianos, como são chamados, inventaram uma nova forma para influenciar o voto e garantir a eleição dos candidatos de sua preferência. Criaram uma espécie de "recenseamento" em que cadastram os títulos de eleitor dos moradores e depois vendem a um postulante à Câmara dos Vereadores. Não há confirmação oficial sobre os valores, mas estima-se, nas comunidades, que possam chegar a R$ 100 mil. Para garantir o "negócio", esses grupos passam a ameaçar a todos com agressões, com a expulsão de suas casas ou até com a morte. A prática é a nova forma do voto de cabresto, método freqüentemente utilizado no período da história do país conhecido como República Velha, mas que agora se vê presente na capital carioca.
Passado o primeiro mês de campanha, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) registra cinco denúncias sobre a existência de currais eleitorais em favelas. Três delas estão localizadas em regiões dominadas por milícias; duas pelo tráfico. Carobinha (em Campo Grande), Santa Cruz e Rio das Pedras, onde o senador foi impedido de fazer campanha, são comunidades sob o domínio de milicianos. Essa região da Zona Oeste possui cerca de 1 milhão de habitantes, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e cerca de 300 mil eleitores, segundo o próprio TRE. Rocinha, na Zona Sul, e o Complexo do Alemão, dominadas pelo tráfico, completam a lista dos locais sob suspeita.
"Esses grupos se sofisticaram e agora se utilizam de um instrumento que fere a regra mínima de cidadania, que é o direito ao voto. Eles usam a lógica do terror para ameaçar pessoas, cadastrar os títulos de eleitor e depois obrigam moradores a votar em um determinado candidato. Utilizam essa lógica do medo com um agravante: é uma prática patrocinada por agentes do estado, já que os integrantes da milícia são servidores públicos. São agentes do estado que se organizaram e querem representantes no Legislativo. Imagine que compromisso terá com o estado democrático alguém que é eleito com o apoio desses grupos", analisa o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), presidente de uma Comissão Parlamentar de Inquérito criada na Assembléia Legislativa do Rio para investigar o avanço das milícias nas favelas.
A preocupação não é por acaso. Em 2003, apenas Rio das Pedras era dominada por milicianos. Passados cinco anos, 83 comunidades já estão em poder desses grupos. A Secretaria de Segurança Pública investiga 179 servidores que participariam dessas quadrilhas. Em junho, o ministro da Justiça, Tarso Genro, telefonou para o deputado Freixo preocupado com a expansão das milícias na cidade. Desde 2006, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) acompanha o terror que essas pessoas levam às favelas.
Inicialmente, a proposta de trocar traficantes pela milícia parece sedutora aos moradores, depois a situação representa, no mínimo, um tiro no próprio pé. Afinal, para quem sempre viveu em um ambiente em que é comum o comércio de drogas, os roubos e os estupros às jovens de sua família, se livrar de tudo isso com o patrocínio de alguns integrantes da comunidade parece um fio de esperança. Engano. A milícia passa a cobrar por tudo. Ganha-se dinheiro com os serviços básicos: transporte alternativo, segurança e aluguel de casas e lojas.
Você lê esta matéria na íntegra na edição 23 da Rolling Stone Brasil, agosto/2008
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