Com um estilo espontâneo, Janette Beckman captou duas das expressões musicais mais importantes das ruas: o hip-hop e o punk
Lucas Brêda Publicado em 18/01/2017, às 10h15 - Atualizado às 16h35
"Tenho boas histórias, mas acho que sou sortuda. Eu era como o garoto de Quase Famosos, rondando as pessoas, tipo: ‘Posso tirar uma foto?’”, se autodescreve a fotógrafa britânica Janette Beckman. Com faro apurado e abordagem precisa, ela circulou entre gigantes da música – quando eles ainda engatinhavam –, registrando dois dos movimentos urbanos mais definidores da história: o punk londrino e o hip-hop norte-americano.
Janette começou frequentando os shows pequenos e incendiários do punk (viu bandas como Siouxsie & the Banshees, Sex Pistols e The Clash), que tomava forma na efervescente Londres de 1977. Na época, trabalhava para as publicações Sounds e Melody Maker. “O punk mudou a lógica de classes”, analisa. “Foi a primeira vez que os jovens da classe trabalhadora – que estavam desempregados, já que a economia estava péssima – começaram a falar sobre a vida deles e protestar.”
Na década seguinte, a fotógrafa atravessou o Atlântico para encontrar em Nova York uma atmosfera equivalente. “Você entrava em um trem e ele estava inteiro coberto por grafites”, relembra Janette, referindo-se aos primórdios do hip-hop, quando emergiam nomes como Cold Crush Brothers e Public Enemy. “Eles estranhavam: o que alguém de Londres estava fazendo no Bronx, fotografando artistas que nem eram famosos? Então tive acesso e liberdade incríveis. Eles estavam curiosos sobre mim e eu sobre eles.”
A fotógrafa traça paralelos entre as cenas, segundo ela, “porque a economia norte-americana também estava ruim e eles não conseguiam emprego”. “Além disso [os dois movimentos] não vieram de gente com dinheiro. Não tinha roupa de marca, estilista, gente para bancar nada. Eles mesmos faziam tudo.”
Adolescente na inglaterra dos anos 1970, Janette frequentava escolas de arte e queria ser pintora, mas não se achava “boa o suficiente” e passou a frequentar aulas de fotografia. “Havia dois caras que andavam pelo meu bairro vestidos como mods, diferentes, e [um retrato da dupla na rua] foi a primeira foto que eu fi z desse estilo urbano, meio rebelde.”
Meses depois, em 1977, o semanário Sounds aceitou contratar os serviços de Janette, enviando-a para fotografar o Siouxsie & the Banshees no Roundhouse – e dali em diante ela não parou. Em uma ocasião, ela sugeriu à Melody Maker colocar um jovem chamado Boy George na capa. “O primeiro single dele ia sair e nós sabíamos que ia estourar”, conta. “Mas eles não queriam colocar alguém tão ‘gay’ na capa. Acabei fotografando-o na rua, a imagem foi capa e o single foi direto para o topo das paradas naquela semana.”
O primeiro contato dela com o hip-hop foi em 1982, quando um espetáculo intitulado Hip-Hop Show passou por Londres. “Não sabíamos nada sobre o estilo”, confessa. “Encontrei aqueles caras e comecei a tirar fotos. Não sabia quem eram, mas achava-os incríveis. E o show foi uma maluquice: tinha gente fazendo grafite, dançando break, cantando rap. Eu me apaixonei.”
Mesmo quando era uma “estranha no ninho” (uma estrangeira branca entre rappers negros), Janette soube caminhar com desenvoltura entre ícones, segundo ela, por acreditar na representação mais crua e espontânea de um artista. “Deixo as pessoas serem quem são e não tento fazê-las parecer outra coisa”, diz. “Não fico pedindo para fazer poses nem se mexerem para ‘onde a luz está melhor’. Deixo-as fazerem o que quiserem. Isso, e ser amigável, parece funcionar para mim.”
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