Com milhões de discos vendidos, turnês esgotadas, um programa de TV incrivelmente popular e um crescente império pessoal de negócios, o líder do Maroon 5 está redefinindo o conceito de estrelato pop um hit por vez. Mas o que move Adam Levine?
Mickey Rapkin
Publicado em 13/04/2016, às 21h15 - Atualizado em 28/08/2016, às 12h10Adam Levine tirou os móveis da sala de estar e, basicamente, instalou uma academia. Dois personal trainers esperam por ele, armados com pesos kettlebell, bolas de exercício e aparelhos su cientes para deixar um jogador de futebol americano esgotado. Levine entra na sala e começa a alongar a panturrilha. “Gosto do meu visual quando me exercito”, diz. “Não estou fazendo isso para ser vaidoso, embora seja parte do motivo, mas a sensação é muito boa. Fico feliz pra caralho o tempo todo. É sério, sem a ioga e os exercícios, eu seria uma bagunça.”
É uma tarde chuvosa em Los Angeles e Levine, que malha seis vezes por semana, está usando regata preta e short cinza. Quando o assunto é o próprio corpo, bem como tudo na vida dele, nada é feito nas coxas. Afinal, esse é um homem que não se satisfaz com uma tatuagem, tem os braços fechados de tatuagens. Não é apenas um astro pop, vocalista do Maroon 5, é também um astro de TV – o jurado macho alfa na competição de cantores The Voice.
O instrutor de ioga de Levine, Chad Dennis – que também treina Harry Styles, do One Direction conta que eles trabalham juntos, intermitentemente, há oito anos. Dennis frequentemente viaja com o Maroon 5 nas turnês e se lembra de uma conversa com o empresário de Levine, quando começou a trabalhar com o cantor. “Ele me ligou e perguntou: ‘Quanto custaria ter você exclusivamente o ano inteiro?’ Dei um número absurdo. Literalmente dez segundos depois ele respondeu que tínhamos um acordo.”
Enquanto Levine exibe sua flexibilidade alongando o corpo para cima na postura da árvore, não posso deixar de notar que há um ar brincalhão nele que quase nunca é mostrado nas telas. Diferentemente do personagem que criou para o programa The Voice, no qual frequentemente (e intencionalmente) parece ser um idiota questionador saído de um filme dos anos 1980, na vida real está mais para o garoto travesso da escola – aquele que se gabava de ter ficado com duas meninas no acampamento. Só que isso faz parte do charme de Levine: o cara que é ameaçador na medida certa para que não seja considerado perigoso.
É uma fórmula que claramente funciona para ele. Tirando Justin Timberlake ou Beyoncé, Levine é basicamente tão bem sucedido quanto um artista da música pode ser, prosperando em uma indústria temerosa atormentada por quedas nas vendas de discos e alianças instáveis com serviços de streaming. Embora tecnicamente seja seu trabalho secundário, aparecer no The Voice, que estreou nos Estados Unidos em 2011, atualmente rende a ele cerca de US$ 22 milhões por ano. O último álbum do Maroon 5, V, lançado em 2014, estreou no número 1 nas paradas norte-americanas depois da turnê mais lucrativa da banda até então, no ano anterior. Em 2013, ele abraçou Hollywood quando estrelou ao lado de Keira Knightley o drama Mesmo se Nada Der Certo. E no ano passado iniciou a atual turnê mundial do Maroon 5, com duas noites no Madison Square Garden, em Nova York. No Brasil, em março, foram shows lotados em São Paulo (dois, no estádio Allianz Parque), Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador e Fortaleza.
Isso é apenas uma parte da Adam Levine Ltda. Em 2013, dois anos depois de detonar perfumes lançados por celebridades (tuitou: “Quero banir oficialmente perfumes de celebridades. Punível com morte de agora em diante”), lançou uma fragrância com seu nome. Também promoveu a linha de tratamento de acne Proactiv, assinou um acordo com a NBC para produzir um seriado parcialmente inspirado em sua vida e até entrou no negócio da moda, lançando uma linha de roupas vendida exclusivamente no supermercado Kmart e se tornando, posteriormente, o rosto da grife brasileira John John. Em 2013, o The Hollywood Reporter estimou seus ganhos anuais em US$ 35 milhões. “Não me vejo como um magnata”, afirma. “Acho hilário dizerem isso, mas, ao mesmo tempo, aproveito muitas oportunidades que chegam até mim.”
Enquanto isso, Levine conseguiu se tornar uma espécie de assunto cultural da discórdia. Foi zombado em um episódio de Girls, da HBO (presa no carro em uma viagem, a personagem principal, interpretada por Lena Dunham, canta “One More Night”, do Maroon 5, até o namorado dar um soco no rádio). Quando a revista People o escolheu como O Homem Mais Sexy de 2013, o site Jezebel chamou isso de “uma vitória impressionante para babacas mundo afora”.
Claro, todo grande astro tem muitos fãs e muitos detratores, mas há algo em Levine que parece suscitar opiniões particularmente fortes dos dois lados. Seria a infância privilegiada que teve? Ou a voz em falsete, como a de Steve Perry, ex-vocalista do Journey? Ou é simplesmente ciúme da ala masculina? Afinal, ele já teve o nome ligado a mulheres como a tenista Maria Sharapova e estrelas de Hollywood como Jessica Simpson e Cameron Diaz. Agora, é casado com a supermodelo Behati Prinsloo (mas, se você se questiona sobre o fato de Levine ter sossegado, fique sabendo que ele tem um bloco de madeira sobre a pia da cozinha que diz: “O único motivo para eu te botar para fora da cama é para trepar com você no chão”). A esta altura, o desfile anual da Victoria’s Secret é basicamente um episódio de reunião de sua própria temporada pessoal do reality show The Bachelor.
Só que, enquanto o vejo passar de poses de ioga para uma série de exercícios punitivos de resistência, fica claro que Levine está no olho de seu próprio furacão: ele é intenso e focado por inteiro. Também se esforça demais cada movimento tem mais impulso do que o anterior para ser simplesmente um roqueiro contente que navega pela vida. Quando acho que está pronto para desacelerar, Levine aumenta ainda mais o volume de sua seleção de músicas do Beastie Boys e deita para mais uma série de abdominais.
De onde raios vem toda essa intensidade?
Adam Levine, de 37 anos, foi criado em Los Angeles, onde o pai era dono de uma rede de sofisticadas lojas de roupas chamadas M.Fredric. Quando mais novo, Levine aparecia nos comerciais de TV locais para a loja. Ele e o pai continuam muito próximos. O cantor mostra uma foto dos dois participando de uma corrida beneficente de 10 km em 1985 o pai está parecidíssimo com Tom Selleck na série oitentista Magnum, de bigode e braços musculosos.
Levine cresceu frequentando escolas particulares de elite e participou de pelo menos uma temporada de verão em um acampamento de teatro no interior de Nova York. Na infância, passava as festas de final de ano com os melhores amigos dos pais, que, por acaso, eram os pais do ator Jonah Hill. No ensino médio, montou uma banda de rock; ele e os amigos tocavam em boates na Sunset Strip e ficavam bêbados e chapados em festas em casas de Hollywood. Então, se ele tem confiança no que é hoje talvez seja porque sabe quem não é.
“Cresci nessa porra de Los Angeles com um bando de hipsters e queria dar um soco na boca deles constantemente”, diz Levine. “Eles eram tão cool. Eu odiava aquilo. Dizia: ‘Cara, não quero ser cool. Que se foda isso. É estúpido. É entediante. E é triste. Quero me divertir. E fazer música pop’.”
Aparentemente, dá para fazer as duas coisas. O primeiro álbum do Maroon 5, Songs about Jane (2002) – basicamente um disco de separação sobre o coração destroçado de Levine – vendeu mais de 5 milhões de cópias. A banda ganhou o Grammy de Artista Revelação em 2005 e ele aproveitou o sucesso como muitos astros do rock antes dele. Não foi, porém, o suficiente. No final de 2010, o grupo chegou a uma encruzilhada. “Estávamos passando por um período um pouco difícil. Ainda fazíamos sucesso, mas já tínhamos lançado três discos. [A música] não estava trazendo nada de novo. Não estava dando certo.” Foi quando Mark Burnett, produtor de TV responsável pelo reality show Survivor, ligou para ele.
No papel, a ideia de fazer o The Voice – uma versão modernizada do American Idol em que os juízes famosos, incluindo Levine, disputam a chance de treinar os competidores – não fazia muito sentido. “Não é como se eu fosse uma espécie de mestre manipulador, pensando ‘o The Voice vai abrir as portas para mim e, então, lançarei uma linha de roupas’. Achei que seria, no máximo, uma grana e uma experiência. E, talvez, uma pequena mancha no meu currículo, mas pensar que isso aumentaria a credibilidade da nossa banda? Jamais poderia ter previsto isso.”
A maior crítica contra o The Voice é que o programa ainda não produziu uma estrela no nível de Kelly Clarkson (ganhadora da primeira temporada do American Idol), mas isso não é exatamente verdade. Quem mais se beneficiou com o The Voice foi o Maroon 5. A música “Moves Like Jagger” (com participação da também jurada do The Voice Christina Aguilera) se tornou o sexto download digital mais vendido de todos os tempos. Toda essa exposição e publicidade em horário nobre fizeram de Levine um verdadeiro mega astro e ele não hesita em tirar proveito de sua liquidez. Quando sente que vem uma pergunta sobre ganância, ele me corta: “Já deixei de lado acordos comerciais para coisas que não pareciam certas”.
Falo do Proactiv. “Cresci com uma acne cística horrível”, ele se defende. “Estava no ensino médio. Era um adolescente irritado. Quando o Proactiv me contatou, pensei: ‘Ótimo, vou ganhar um dinheiro e também ajudar um moleque’. Pareceu uma transação honesta”.
“Toda a natureza da indústria da música mudou muito”, ele prossegue. “Antigamente, todos tinham muito orgulho e alguma pureza. Era algo realmente bonito. Em vez de lamentar que as coisas não são mais assim e passei muito tempo fazendo isso –, estou mais interessado em explorar o que é o futuro. As pessoas se prendem em muitas coisas nas quais não precisam mais se prender.” Em outras palavras: não odeie o jogador, odeie o jogo.
Pergunto se os fãs da banda mudaram desde The Voice. “Não”, responde, rindo. “Só há mais deles.” Ele para um minuto para pensar no assunto e acrescenta: “Sabe o que é rock and roll? É fazer o que diabos você quiser”.
A filosofia de Levine de “agarrar cada oportunidade” não é muito diferente do princípio que move o modo como ele cuida de si mesmo. “Vou envelhecer e não vou conseguir fazer muita coisa”, afirma, apontando para um kettlebell. “Pelo menos conseguirei dizer ‘já consegui fazer essa merda antes’. Quero ver aonde posso chegar com meu corpo.”
Neste momento, ele consegue fazer muita coisa. Quando os treinadores pegam pesado, Levine só reduz a marcha nos exercícios que podem machucar seu cotovelo, que atualmente está enrolado em uma tala elástica. “Tenho um ‘cotovelo de golfe’”, explica, rindo. “Como você se machuca jogando golfe? É o jeito mais besta de se lesionar.” É tão louco pelo esporte que diz que estuda os movimentos de jogadores profissionais no YouTube até tarde da noite.
Então, ele tem problemas para dormir? “Meu problema é que nunca quero ir dormir, porque estou empolgado demais em estar vivo. Sempre penso: ‘Estou na cama, mas poderia estar fazendo algo incrível agora’.” Dennis, instrutor de ioga dele, ri: “Todo dia é Natal para o Adam”.
É uma piada, mas Dennis pode estar certo. Levine parece estar se divertindo mais do que o mega astro típico, uma das razões que fazem dele uma presença tão atraente na TV e em videoclipes, para começo de conversa. Para o vídeo da faixa “Animals”, por exemplo, ele e a esposa tiraram a roupa e se cobriram de sangue falso. Comento que Lena Dunham escreveu na época sobre a explícita letra da música no Twitter: “Sou uma mulher que escreve muito sobre sexo no trabalho e ainda fico escandalizada quando Adam Levine canta sobre estar ‘dentro’ de alguém”. Ele começa a rir e fica empolgado. “Eu a superei no quesito sexo?” A letra em questão é: “Não negue o animal que ganha vida quando estou dentro de você”.
“Não é nada exatamente envolto em metáforas”, diz, falando sobre os singles do Maroon 5. “Virou uma espécie de jogo: como posso dizer a mesma coisa que todo mundo diz, mas de um jeito levemente mais evocativo? Essa é uma das coisas empolgantes na música: você consegue mexer com as pessoas. O problema com a música hoje em dia é que em boa parte do tempo ela não assume riscos.”
sta é a segunda vez que me encontro com Adam Levine. A primeira foi há quase dois anos. Ele tinha terminado um relacionamento havia pouco tempo, e disse: “Se você não se casa, não pode se divorciar. Por que não podemos aprender com a porcentagem arrasadoramente baixa de casamentos bem sucedidos que nossa última geração enfrentou?”
Agora, leio essa frase para ele, que argumenta: “Isso vem de um homem temeroso, de um homem que vive com medo”.
Ele sentia medo?
“Não estava óbvio nesta frase?”, questiona. “Você basicamente está admitindo que tem medo de se casar por causa do divórcio. Não deveria ter medo de fazer as coisas. Não é um jeito bom de viver.”
À medida que nos aproximamos do fim da entrevista, ele me diz para “fazer com que pareça legal”, em referência a uma frase do filme Quase Famosos (“É tão difícil assim fazer a gente parecer legal?”). Mas não acho que realmente se importe. Ele sabe quem é: um astro pop com bom gosto em todos os aspectos da vida, incluindo arte. Tem um abajur desenhado por Philippe Starck em forma de um fuzil AK-47 e obras de Andy Warhol e Jean-Michel Basquiat guardadas.
Quando os exercícios terminam, Levine enxuga um tsunami de suor do rosto e lembra aos treinadores que vai tirar o dia seguinte de folga. Behati chega de Londres esta noite e vai querer dormir até mais tarde. “Minha mulher é mimada”, ele diz. “É abençoada com uma genética boa. Come cheeseburguer e toma cerveja. É meu tipo de garota.”
Expresso dúvida de que alguém que usa lingerie em uma passarela coma cheeseburguer e beba cerveja com alguma regularidade. Afinal, dizem, fingir comer junk food é algo que mulheres magérrimas fazem para que as outras se sintam mal, certo? Isso é verdade “para 99% das mulheres”, diz Levine. “Minha garota ela manda ver! Só se importa com o que come porque me importo com o que como. Ela não precisa disso, é jovem. Quando ficar mais velha, precisará malhar.” Pergunto se ele já disse isso à esposa.
“Não! Ela tem 26 anos. Quando eu tinha 26, se você me dissesse para malhar e comer bem, eu responderia: ‘Vá se foder, tenho 26 anos!’”
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O Maroon 5 retornou ao Brasil em março para uma longa turnê, desta vez apresentando o disco V, o quinto da carreira. Depois de passar por Fortaleza, Salvador Belo Horizonte e Porto Alegre a banda fez duas apresentações em São Paulo, no Allianz Parque. Na primeira, o grupo liderado por Adam Levine fez uma hora e meia de show certinho, sem um minuto a mais. No setlist, apenas sucessos, já que cada single lançado pela banda já sai do forno praticamente com a garantia de que será o hit do verão.
Nos 90 minutos de performance, Adam falou bem pouco, tendo focado mais na interpretação das músicas e em uma ou outra investida para seduzir a plateia majoritariamente feminina que lotou o estádio. Durante “She Will Be Loved”,especialmente, Levine assumiu uma veia de galã de boy band e mandou beijinhos para o público.Dentre as faixas tocadas, estavam os sucessos do início da carreira, como “This Love”, e outros mais recentes, como “Sugar” (que encerrou a noite), “Animals” e “Maps”, todas do disco V (2014), o mais recente do grupo californiano. “Harder to Breathe”, a gigantesca “Moves Like Jagger”, “Daylight” e “Wake Up Call” foram algumas das outras escolhidas. A lista ainda teve espaço para “Lost Stars”, faixa solo de Levine que integra a trilha do filme Mesmo se Nada der Certo, estrelado por ele, Mark Ruffalo e Keira Knightley.
Apesar de fazer um rock mais pop e causar reações de idolatria juvenil nos fãs, o público presente no estádio, em geral, já não era mais adolescente. Todas as músicas da noite eram hits, mas a clara preferência do público por faixas de Songs about Jane (2002) indicou que a plateia que o Maroon conquistou quando começava a explodir continua acompanhando a banda que, agora mais experiente, tem o privilégio de lotar estádios no mundo todo, provando-se mais relevante do que nunca. Se em São Paulo o M5 não saiu do protocolo, alguns dias mais tarde o grupo surpreendeu no Rio de Janeiro, presenteando os fãs com uma performance de uma das músicas brasileiras mais conhecidas internacionalmente, “Garota de Ipanema”. Levine se aventurou cantando a faixa de Vinicius de Moraes e Tom Jobim em uma mescla de português e inglês.