Wanessa investe na carreira pop, grava em inglês e cai nas graças do público GLBT
Por Pablo Miyazawa Publicado em 17/01/2011, às 11h00
Em 2009, Wanessa Camargo deixou o sobrenome famoso para trás e se tornou apenas Wanessa. A mudança não veio sozinha: a cantora, por muito tempo carregando o estigma de "a filha artista de Zezé Di Camargo", deu novas direções à carreira através de mudanças radicais: passou a cantar em inglês ("Fly", ao lado do rapper Ja Rule, foi o primeiro experimento nesse sentido) e focou esforços para cativar o "público da noite", em suas próprias palavras. Confiante na guinada, ela prepara um álbum totalmente cantado no idioma estrangeiro, previsto para março. Na entrevista a seguir, realizada em uma tarde de dezembro na boate Royal (de propriedade de seu marido e empresário Marcus Buaiz), Wanessa fala sobre a nova empreitada musical mais direcionada para o pop dançante, sobre suas pretensões artísticas no exterior e a relação com a nova gama de fãs.
Você já lançou um EP em 2010 [Você Não Perde por Esperar] e agora está prestes a gravar um novo disco, em março. Já há uma direção? Como você definiria esse projeto, musicalmente falando?
O que estou fazendo agora é o melhor. Sempre busco uma entrega muito grande. Nesses últimos anos, tive a oportunidade de conquistar uma liberdade musical dentro de meu trabalho. Nesse novo CD, tenho um direcionamento muito forte, já focado numa direção certa, nesse disco mais do que em qualquer outro. Sei o que vai ser, onde quero chegar com ele, qual vai ser a minha mensagem. Nos outros, eu sempre ia definindo e achando o caminho dentro do trabalho. Com esse, antes de as músicas aparecerem, eu já sei o que eu quero. Essa é a diferença: a segurança e a liberdade de fazer isso.
E qual seria esse direcionamento?
Na questão do som, é um som em inglês, pop. Quero buscar uma identidade pop, mas que traga muito de minha identidade brasileira. Eu só quero não fazer uma música pop que qualquer cantora estiver cantando. E que tipo de música é essa? É muito mais um sentimento do que uma coisa certa. No meu coração, na minha cabeça, esse som está muito definido. Tem muito a ver com o que estou fazendo agora, que é aquela linha específica de música pop com direcionamento forte para o público GLBT [sigla para Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros], que fala de atitudes específicas de liberdade, que fortalece a mulher. Eu busco muito essas mensagens.
O que faz uma música, ou direcionamento artístico, ser focado num público - no caso, o GLBT?
Identificação.
Mas tem a ver com mensagem, com atitude, com declarações, com como você se comporta no palco?
É o jeito com que me expresso no palco, ou cantando uma música, ou quando gravo uma música e ela tem uma identificação grande com certos públicos, no caso, o GLBT. Esse é um público muito forte, que se identifica. Não que eu faça um trabalho só para eles, mas é um público muito direcionado com o qual quero trabalhar, com o qual me identifico muito. Tenho um prazer enorme de fazer um trabalho para eles, gosto e sei que é quem melhor entende o meu trabalho.
Por que você acha que aconteceu essa identificação? Ela foi natural, ou de alguma maneira arquitetada num laboratório? Foi algo "vamos focar nesse público porque ele está carente de ícones", ou foi uma coisa muito mais espontânea do que calculada?
Completamente espontânea. Quando fiz o Meu Momento [álbum de 2009], a gente resolveu fazer um show na The Week, em São Paulo, que é a boate que tem essa expressão muito grande com o público GLBT. Mas não foi porque eu queria o público GLBT, mas sim porque queria focar no público da noite. Entrei, cantei cinco músicas, e foi um encontro tão grande no palco, como se eu descobrisse que existe outra pessoa ali dentro de mim, aguardando um espaço para se apresentar daquele jeito. Eu me senti muito à vontade, a ponto de fazer um show com uma entrega que eu nunca tinha feito, de realmente me expressar sem pensar que estava rebolando ou fazendo cena demais. Porque aquele público entende de qualquer tipo de expressão, é muito tolerante, que respeita muito. Talvez porque eles vivam isso na vida deles o tempo inteiro. E a gente começou a vender shows para as baladas, tanto hetero quanto GLBTs, e foi dando certo: fui crescendo no palco como artista, me encontrando, conhecendo mais esse público. Eles sempre estiveram comigo desde o começo de minha carreira, mas senti que, com essa turnê, eu os encontrei de verdade. A gente se encontrou numa paquera e foi virando um casamento.
Você sentiu que essa liberdade de palco estava reprimida em suas personas anteriores?
Eu acho que o ambiente do show, do palco, tudo isso conta muito na hora. É algo mais intimista, então você tem um contato muito próximo. Essa turnê me trouxe muitos outros jeitos de ver um show. Não que eu me sentisse tolhida antes, mas talvez eu mesma não soubesse que tivesse mais ainda para dar. Era muito mais eu descobrir que podia ir além e me divertir mais ainda.
E agora, em matéria de diversão, dá para comparar o que você sente hoje fazendo essas músicas e o que fazia antes em sua carreira?
O palco sempre me trouxe coisas maravilhosas, mas acho que tudo passa por um amadurecimento. Você leva para o palco a tua vaidade, teus egos, tuas inseguranças, não adianta. Por mais que seja mágico e você consiga deixar muita coisa para trás, você acaba levando para o palco tudo isso junto. Com o tempo, com a maturidade, com as coisas que a vida vai te dando, inclusive dentro dos palcos da vida - uma luz que falha, um público que não está legal, um público que está maravilhoso -, tudo isso você leva de lição e aprende a lidar com tudo. Fui cada vez me tornado mais segura, mais tranquila. Mas essa turnê Balada e esse novo momento me trouxeram um... Vou falar um palavrão. Ela me ensinou a ligar um "foda-se", literalmente.
Para quem?
Para o medo, para a insegurança, para o querer que todo mundo saia dali achando que o show é o máximo... Faz o melhor e se divirta, faz o que tem vontade, sem se prender, faz o melhor que tem para fazer na hora em que estiver cantando. Isso realmente veio com a turnê, de realmente ligar esse botãozinho e não me preocupar tanto que a roupa tem que ficar perfeita, por exemplo. Isso me acrescentou muito no palco. Acho que funciono mais com esse descompromisso.
Observando sua carreira de dez anos, nota-se que você é uma artista completamente diferente e parece que nunca esteve tão à vontade. Há essa coisa de se reinventar a cada novo projeto, e esse momento talvez defina melhor quem você é de verdade, artista e pessoa. Você concorda?
Vou dizer o seguinte: o artista, o cantor, não há como inventar um personagem. Tudo o que eu trouxe como Wanessa Camargo, ou como Wanessa, transitando na música e fazendo um trabalho atrás do outro - tudo aquilo foi verdade. Eu era aquela menina que gostava de ouvir Celine Dion, música romântica. Eu fui aquilo, e fui passando por transformações na minha vida toda. Não sou do tipo de pessoa que nasceu sabendo das coisas. Eu gosto de coisa nova, de experimentar, de ver ideias diferentes. Gosto das coisas que mudam, que estão sempre em constante transformação. Eu me tornei uma pessoa muito mais segura, obviamente, do que quando tinha 17 anos. A grande diferença é que antes eu tinha dez milhões de inseguranças, como qualquer adolescente. Hoje, claro que ainda tenho as minhas inseguranças, mas as coisas que antes me deixavam insegura, agora para mim são muito certas. Você aprende a dizer não, a se respeitar mais, a se conhecer mais. Eu nunca vou estar pronta. Eu sempre quero aprender e posso aprender mais. Mesmo com 80 anos, eu espero estar fazendo aulas, aprendendo alguma coisa diferente. Não adianta, é uma coisa natural minha. Hoje, consigo me ver como uma artista de música pop, e é isso que eu tenho de fazer. Me identifico, me sinto em casa, é o que eu sei fazer melhor.
Talvez há dez anos, a Wanessa Camargo não imaginaria fazer o que você faz agora, os caminhos que tomou, ou até a coragem de permitir certas concessões na carreira.
Eu era muito menina, pensando hoje em como eu pensava, as coisas em que imaginava e as ilusões que tinha. Eu era uma criança, e é natural a pessoa andar para frente ou para trás. Mas, no meu caso, eu acredito que andei para frente.
Você se lembra o que a Wanessa Camargo de 17 anos esperava da carreira artística? Olhando para trás, você vê que os seus planos estavam de acordo?
Não, muda tudo. A minha ideia era completamente diferente do que era uma carreira. Até antes de começar a cantar. Era muito conto de fadas, quase um livro de príncipe e princesa. "Ah, eu vou cantar, vou fazer uma música linda, vou fazer um show lindo". Eu não tinha números na cabeça, eu tinha, na verdade, que ia ser "sucesso". Sucesso era uma palavra que vinha muito na minha cabeça. E eu achava que o momento mais importante na vida era aquele.
E para a Wanessa de agora, o quão diferente é o seu ponto de vista? O que é o sucesso?
Eu vou trocar a palavra sucesso por trabalho. É um trabalho de lutar pelas suas coisas, é uma vida. Depende de como você vê, o meu foco é o trabalho. É bem diferente.
Você não sentia que havia tanto trabalho? Era uma coisa mais divertida?
Era diversão, era exatamente isso: uma coisa linda, conto de fadas, felicidade. E o trabalho é preenchedor, traz dez milhões de coisas além de felicidade. Ele te traz responsabilidade, faz você ser um ser humano melhor, te faz crescer, te dá tapa na cara. É um trabalho, é uma coisa que você tem que merecer, se esforçar, suar. Isso para mim que é a grande diferença.
Em 2007, você declarou à Rolling Stone que "ser artista tem riscos e é preciso estar preparado para não acontecer". Como funciona esse conceito de "acontecer" em um mercado tão pulverizado?
Depende do que você põe como objetivo. Eu gravei uma música chamada "Worth It" [veja o clipe abaixo], e quero que essa música chegue às pessoas. E tenho que ter canais de comunicação para chegar nisso, já que quero que um grande número de pessoas a ouça. Meu segundo objetivo é que elas gostem, que sintam que a música veio para fazer alguma diferença na vida delas, mesmo que seja uma troca rápida, mas que tenha um objetivo - alegrar, faça cantar, pensar, o que seja. Depende do que você põe. O "não acontecer" significa esse objetivo não rolar.
O sue projeto é em inglês. Você sabe do fator limitador que é cantar em outro idioma, mas também está ciente que é um fator "abridor de portas". Como se aproveita esses dois lados de cantar em outra língua?
Você tem que saber abrir mão do que você não vai ter mais. Tem que saber que você não vai ter as pessoas cantando toda a sua música de cabo a rabo, como já aconteceu. Tem que saber que as pessoas falam português aqui - quem fala inglês é porque estudou numa escola, teve oportunidade, ou morou fora. E nem todas as pessoas vão entender sua letra. Mas se você for pensar no mundo, saberá que está perdendo ali, mas pode ganhar em muitos outros lugares.
Nesse momento você não está querendo divulgar nenhum plano de ataque ao exterior. Porém, isso deve estar em seus planos. Qual o próximo passo?
Gosto de fazer as coisas parte por parte. O plano está aqui. A vontade de fazer uma carreira internacional existe, não é mentira, sempre tive essa vontade, e cada vez se torna mais palpável. Mas agora quero gravar meu novo CD em inglês e vou lançá-lo aqui no Brasil. A gravação é a coisa mais importante no momento. E formatar o que vai ser esse CD, essa imagem, é o principal. E claro que, sem muita euforia, sem muita ansiedade, nada é à toa. Sem pretensão ou euforia, já estamos colhendo algumas coisas. Pretensão tem que existir, o que não pode é haver uma ansiedade só porque estou cantando em inglês. Eu quero chegar lá. No mercado internacional é preciso chegar muito certo do que se quer. Você concorre hoje com dez aqui no Brasil, e vai concorrer com um milhão lá fora, porque é o mundo inteiro tentando cantar em inglês. E tem que ser uma coisa especial. Não posso chegar lá querendo ser uma americana, eu sou uma brasileira. Tem todo um jeito de fazer e de chegar. Tem que saber fazer direito.
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