O rapper gravou, em parceria com a cantora Ivete Sangalo, um disco com releituras de Tim Maia
Luciana Rabassallo
Publicado em 07/09/2015, às 10h03 - Atualizado em 08/09/2015, às 10h51Por Luciana Rabassallo
Criolo, DJ Dan Dan (Cassiano Sena) e Da Antiga conversam em um campinho de terra batida enquanto alguns adolescentes disputam uma pelada. O tema do bate-papo é o desemprego de um aspirante a músico (Criolo) que acaba de descobrir que a namorada está grávida. Da Antiga oferece ao talentoso jovem “um trampo na biqueira”. Dan Dan, por sua vez, tenta encontrar um estúdio onde a dupla possa gravar uma fita demo para depois emplacar alguns shows. A cena de ficção, que mostra o momento exato da escolha entre o rap e o crime, está no roteiro do média-metragem Profissão MC (2009), de Alessandro Buzo, mas poderia ser um capítulo da vida de Kleber Cavalcante Gomes, o Criolo.
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Protagonizado por ele, o filme de baixíssimo orçamento conta a história de um artista que sonha em viver de música, mas se vê obrigado a seguir outro caminho. Na vida real, o rapper driblou as dificuldades financeiras para se tornar uma das grandes revelações da música brasileira na última década. Com 40 anos recém-completados e três discos lançados – Ainda Há Tempo (2006), Nó na Orelha (2011) e Convoque Seu Buda (2014) –, Criolo navega por ondas sonoras diferentes das que o destacaram na cena do rap e tem um novo desafio: afrouxar as amarras que o prendem ao gênero sem perder a própria essência. “Eu ainda sou o mesmo Kleber que gravou umas rimas com o sonho de se conectar com as pessoas. A única coisa que mudou é o fato de hoje eu me conhecer melhor”, analisa Criolo.
A evolução pessoal é perceptível na obra do artista. Ele atravessou os versos agressivos e as batidas cruas de Ainda Há Tempo para desaguar nos sambas, reggaes e baladas que compõem os registros seguintes. “Eu sou um cantor de rap, uma sonoridade que vem das ruas. Então, se hoje estão dizendo que eu sou um músico de MPB, que nada mais é do que música popular brasileira, isso tem sentido para mim”, declara. “Eu sou do povo. Não me importo com os rótulos.”
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Para Criolo, a percepção que as pessoas têm de uma sonoridade está intimamente atrelada ao repertório delas. “Eu faço rap há 27 anos. Tenho muito carinho e orgulho de dizer que o hip-hop foi a minha manjedoura. Atualmente, me alegro apenas em saber que as pessoas conhecem meu trabalho. Isso é uma honra para mim. Mas é inegável que cada indivíduo se debruça sobre as canções de determinados artistas que ele conhece para classificar uma nova obra. Essa percepção de que a música que eu faço é rap ou é MPB está baseada na biblioteca sonora de quem está rotulando.”
A vontade de experimentar e “dividir grandes momentos com o público” levou o rapper a uma parceria inusitada com uma das maiores estrelas do pop nacional. Em fevereiro, Criolo e Ivete Sangalo foram escolhidos por uma empresa de cosméticos para realizar a turnê Viva Tim Maia, que rodou o país homenageando o síndico do Brasil, morto em 1998. Do encontro nasceu um disco homônimo, previsto para este mês. As gravações ocorreram no estúdio da cantora baiana, em Salvador. O rapper diz que Ivete é “uma pessoa extremamente simples, por isso tudo transcorreu da forma mais tranquila e agradável”.
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A relação com Tim Maia, como ele gosta de ressaltar, vem da época em que Criolo acompanhava o pai em campeonatos de futebol de várzea. “Eu e o meu irmão carregávamos a chuteira dele e, depois do jogo, sempre havia um churrasco. Os amigos se encontravam e alguém ligava o som do carro. Foi dessa fase muito especial que saíram algumas das minhas melhores lembranças da obra do Tim Maia. É uma bela trilha sonora.”