A 15ª edição do Cinefantasy acontece até sábado, 9, no MIS e no Cine Satyros Bijou, com programação que inclui longas e curta-metragens
Heloísa Lisboa (@helocoptero) Publicado em 08/12/2023, às 12h09
O Cinefantasy (Festival Internacional de Cinema Fantástico) celebrou sua 15ª edição com uma programação que incluiu 110 filmes de 20 países, além dos quatro cantos do Brasil, com o melhor do cinema fantástico da atualidade, uma homenagem ao produtor Rodrigo Teixeira e atividades formativas.
Iniciado no último sábado, 2, o evento acontece até 9 de dezembro, no MIS (Museu da Imagem e do Som) e no Cine Satyros Bijou, com entrada gratuita. Um recorte da programação estará disponível online, até 11 de dezembro, no streaming da Spcine.
A programação apresenta 14 mostras competitivas, divididas em longas e curta-metragens, nas seguintes categorias: Amador, Animação, Brasil Fantástico, Espanha Fantástica, Estudante, Fantasia, Fantasteen, Fantastic Black Power, Fantástica Diversidade, Ficção Científica, Horror, Mulheres Fantásticas, Pequenos Fantásticos.
A curadoria da mostra competitiva de longas ficou nas mãos de Eduardo Santana, Javier Fernández Cuarto e Filippo Pitanga. Embora o quadro pareça pouco diverso, Pitanga garantiu que "esses nomes não são os únicos" que participaram do processo.
"Existem várias colaborações. Algumas vezes, essas colaborações não querem, necessariamente, ou pedem, para não ter um crédito oficial, porque elas estão em outros departamentos, competindo em outros editais, com outros formatos jurídicos", explicou o crítico de cinema em entrevista à Rolling Stone Brasil.
Ele destacou que Monica Trigo — presidente da ABRAFAN (Associação Brasileira de Festivais de Cinema Fantástico) e da FANTLATAM (Alianza Latinoamericana de Festivales de Cine Fantástico) — faz parte da direção do festival e também contribui no processo de curadoria.
"Fomos o primeiro festival de cinema fantástico do Brasil — quiçá da América Latina — a ter categorias de direção específicas para representatividades negras, como Fantastic Black Power, Mulheres Fantásticas, para diretoras mulheres, e Fantástica Diversidade, com representatividade LGBTQIAPN+ atrás", lembrou Filippo.
Os curadores da mostra competitiva de curtas parecem muito adequados para cada sessão pela qual ficaram responsáveis. Além da representatividade, eles são importantes porque colocam produções que "talvez não se inscrevessem naturalmente" no radar do Cinefantasy.
Unir e propagar o cinema latino-americano também está entre as preocupações do festival. Uma das iniciativas propostas por Trigo, por exemplo, foi o convite para que o argentino Javier Fernández Cuarto se juntasse aos curadores. "Temos déficits muito sérios para além dos interseccionais, de gênero, raça e classe", pontuou Pitanga. Ele deixou claro, porém, que não existe uma hierarquia de opressão, fazendo referência a Audre Lorde.
Parte da programação do Cinefantasy está disponível no serviço de streaming da Spcine até 11 de dezembro, obedecendo ao que Pitanga caracterizou como uma "necessidade cultural", conjugada com "novidades tecnológicas que alcançaram mais pessoas". Entretanto, Filippo advogou pela ocupação das salas de cinema e "que [ela] ainda seja uma atividade cultural, social e coletiva, nos tempos em que, mais do que nunca, fala-se sobre solidão".
O próprio MIS, um dos nossos locais de exibição, falou ontem mesmo o quanto está feliz de estar vendo algumas das nossas sessões absolutamente lotadas, porque ele não via o público voltar à sala de cinema dele, apesar das exposições estarem muito bombadas.
Pitanga ainda abordou um aspecto "predatório" dos streamings, que fazem com que "os filmes precisem buscar as plataformas para poder sobreviver pós-circuitos de festivais". Serviços como a Netflix, por exemplo, foram apontados pelo curador como, por vezes, "desleais", já que vivem um cabo de guerra com as mostras de cinema para que as produções sejam "cada vez menos exibidas em festivais e, quando cheguem ao streaming, estejam mais inéditos".
Os streamings estão lutando muito contra os festivais regionais com o monopólio. Eles não querem que os filmes alcancem certos territórios e a gente tem alguns problemas de distribuição muito severamente afetados por causa disso.
A expressão "cinema de gênero" é usada para categorizar filmes como os de fantasia, horror e ficção-científica. Essas produções, no entanto, nem sempre são vistas como dignas de premiações populares, a exemplo do Oscar, ou até mesmo de serem levadas a sério. Por isso, o Cinefantasy faz, há quase duas décadas, um papel muito importante para esse tipo de cinema, que "enfrenta preconceitos e o desmantelamento das políticas públicas", conforme Filippo ressaltou.
O festival precisa lutar por espaço em meio a mostras que podem ser consideradas mais importantes por não serem tão específicas, mas o cenário tem mudado: "Éramos como o primo pobre do cinema. Hoje, o cinema de gênero tem cada vez mais reconhecimento", ponderou Pitanga.
Para Filippo, a única diferença entre os festivais de cinema internacionais e os nacionais está no "monopólio de privilégios, principalmente no hemisfério norte". Ele associou esses privilégios ao "monopólio cultural da língua inglesa", que confina a pluralidade. "As pessoas se restringem ao que elas acham que querem ver, e isso, às vezes, prejudica o acesso a outros continentes, outras culturas, outras línguas, outras estéticas", disse.
Sabemos muito bem que o sul é o berço do mundo, aquilo que geralmente gera a grande riqueza exportada para o norte e que muitas vezes é apropriada.
O homenageado da 15ª edição do Cinefantasy é Rodrigo Teixeira, produtor que tem alçado o cinema brasileiro a um patamar global. Ele é fundador da produtora RT Features — responsável por longa-metragens aclamados como Frances Ha (2012), Me Chame Pelo Seu Nome (2017) e A Vida Invisível (2019)— e colabora com grandes nomes de Hollywood, como Martin Scorsese e Brad Pitt. Sem deixar o Brasil de fora, Teixeira também tem se dedicado a parcerias no país, como com a produtora Filmes de Plástico e o diretor Gabriel Martins, em Vicentina Pede Desculpas.
A relação com o Rodrigo é de admiração pela extrema diversificação de campo de atuação dos filmes e projetos que ele escolhe, do bom olhar apurado que ele tem para novos projetos — para que ele venha ampliando cada vez mais o escopo dele, entendendo que ele também tem um lugar de privilégio e sabendo compartilhar esse lugar.
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