Apesar de uma proposta divertida e interessante, Ele É Demais não consegue convencer tanto para além da nostalgia
Isabela Guiduci
Publicado em 28/08/2021, às 11h00Nostalgia foi um sentimento muito presente ao longo de 2020 devido ao confinamento constante pela pandemia de Covid-19, com as pessoas revivendo apenas as próprias memórias de um passado, às vezes, nem tão distante. E, é por conta do relacionamento aguçado com as lembranças neste período que Ele É Demais, remake da Netflix do clássico adolescente Ela É Demais (1999), consegue ser efetivo. Se estreasse em outra realidade, talvez não convencesse da mesma maneira.
Adaptação moderna da peça Pigmalião, de George Bernard Shaw, e do clássico longa My Fair Lady, de George Cukor, o original de 1999 acompanha Zach Siler (Freddie Prinze Jr.), um garoto popular do Ensino Médio da escola, quem é deixado pela então namorada. Frustrado e na busca pela superação, decide ajudar a nerd Laney (Rachael Leigh Cook) a se tornar a próxima rainha do baile da escola.
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Apesar de não ser muito querido pela crítica, o filme conquistou o coração de muitos jovens e adolescentes da época pela proposta divertida de narrativa. Agora, a Netflix traz uma perspectiva contemporânea desta história, revivendo elementos do passado para dar um tom emotivo à produção, principalmente para aqueles que assistiram ao clássico do fim dos anos 1999.
Ele É Demais segue essencialmente a mesma história - mas com tramas invertidas dos protagonistas. No remake da Netflix, após ser traída pelo então namorado, a influenciadora Padgett Sawyer (Addison Rae) aceita o desafio de transformar o garoto pouco popular e totalmente diferente dela, Cameron Kweller (Tanner Buchanan), em rei do baile. Tudo isso, é claro, a partir de uma concepção moderna da realidade.
A alternativa de reimaginar um clichê desgastado do gênero adolescente em que o garoto popular repensa as atitudes devido à paixão por uma menina excluída socialmente é interessante, o que evita alguns machismos. Há também um cuidado em não repetir gordofobia, objetificação da mulher, entre outras problemáticas do filme original.
Apesar de repetir estereótipos do universo teen, como o desespero pelo conhecimento do período escolar, a trama ganha uma nova perspectiva com o universo online - transformando a busca por atenção em uma competição de aceitação. A principal diferença entre os dois filmes é a chegada da internet, a qual é impulsiona os eventos da trama, especialmente porque a protagonista Padgett é uma influenciadora.
Ambientando em 2021, portanto, o longa-metragem apresenta discussões acerca das vivências dos jovens e adolescentes nos ambientes virtuais: seja em meio aos riscos de ‘viralizar’ ou ao desespero em manter uma boa imagem online. Infelizmente, os debates sobre os temas são bem superficiais.
De fato, o roteiro está longe de ser perfeito e grande parte da trama pode soar bastante fraca. Diversos personagens secundários ficam perdidos na narrativa e aparecem sem desenvolvimento ou uma apresentação suficiente. Além disso, posteriormente, são esquecidos de tal maneira que é difícil recordar os nomes deles.
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Há personagens, como o próprio o ex-namorado de Padgett, Jordan (Peyton Meyer), os quais propositalmente não têm conteúdo para somar à narrativa. Ainda, as histórias sem desdobramentos são frequentes. Os furos da narrativa, porém, são disfarçados pela empolgação juvenil e ofuscados pelas doses de nostalgia e diversão. Não é o tipo de comédia que faz gargalhar, mas é possível esboçar alguns sorrisos com as bizarrices dos adolescentes.
No caso específico de Jordan, existem exageros na personalidade para transformá-lo em uma espécie de alívio cômico. As cenas divertidas são positivamente bem-encaixadas no filme, com excessos para satirizar o comportamento adolescente - e, no fim das contas, essa alternativa alcança um bom resultado.
O casal protagonista, diferente dos outros personagens, ganha um agradável desenvolvimento com uma naturalidade delicada de assistir. Importante elemento para o gênero romântico adolescente, a química de Addison Rae e Tanner Buchanan é leve e cumpre um papel apropriado, mas está distante de ser excelente.
Logo no início, o cenário parece mergulhar o espectador no final dos anos 1999 e início dos anos 2000, com elementos que levam imediatamente ao passado. A cor rosa, por exemplo, em seus diversos tons, especialmente pastel - tendência naquele período -, as plumas em todos os lugares, a roupa da protagonista, entre outros, remetem diretamente à estética da época.
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Algumas cenas são recriadas de modo semelhante ao longa-metragem original, reforçando esse apelo à nostalgia. Um grande exemplo (a foto que estampa a matéria) é o icônico momento dos protagonistas montados no cavalo - até mesmo as roupas, posturas e cortes de câmera são pensados a fim de despertar memórias no público.
Esse trabalho de colocar o espectador em uma espécie de máquina do tempo a partir de elementos visuais, os quais eram tendência no período do lançamento do filme, é atraente e provoca o sentimento de saudade. Em meio às falhas narrativas, Ele É Demais consegue combinar o contemporâneo com o clássico.
No pacote nostalgia também há Rachael Leigh Cook, protagonista do longa original, quem está de volta ao elenco, mas não reprisa o mesmo papel. Na nova produção, é a mãe de Padgett na narrativa. O mesmo caso acontece com o ator Matthew Lillard (Brock Hudson no filme de 1999). A trilha clássica da produção “Kiss Me”, do Sixpence None the Richer, é mais uma das responsáveis por reviver as memórias de Ela É Demais.
Em meio à mescla de nostalgia e cenas divertidas, Ele É Demais é um bom passatempo. O remake da Netflix cumpre seu papel de deixar o público com saudade da virada dos anos 2000 e de um dos grandes clássicos adolescentes da década de 1990. Com leveza, romance e comicidade adolescente, o longa-metragem chegou ao catálogo do streaming nesta sexta, 27.
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