Atualmente com 73 anos, Fausto Silva fez história na TV brasileira e chegou a ser capa da Rolling Stone Brasil em 2007; relembre
Ricardo Franca Cruz* Publicado em 22/08/2023, às 09h40
Você já parou para pensar que a televisão aberta do Brasil talvez não seja feita para você? Fausto Silva já. Há quase 20 anos, ele comanda um programa popular, consegue preservar sua privacidade e se manteve como o maior apresentador do país. Quer você goste ou não...
Uma aposta, dessas simples que se fazem entre amigos, e Fausto Silva, o maior apresentador da televisão brasileira, está na capa desta edição de primeiro aniversário da Rolling Stone Brasil. Criador de cães e responsável pela vinda da raça italiana cane corso ao país, ele apostou com um de nossos publishers que seu principal animal, o corso negro César, um exemplar perfeito da raça, não levaria, pela terceira vez, o troféu de campeão mundial este ano.
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“Se o seu cão for novamente campeão, você aceita nosso convite para estar em nossa capa comemorativa como ‘O Rei do Domingo na TV do Brasil’ e nos concede uma entrevista”, sugeriu o publisher, durante uma das famosas, mas nunca mostradas pizzas na casa de Fausto, no bairro paulistano do Morumbi.
“Entrevista? Enchem o saco pra eu dar entrevista. Você tem que dar entrevista quando tem alguma coisa pra falar. Mas, se a capa for com o César, eu topo. Ele, sim, que é rei – ainda mais se for tri”, impôs o apresentador. Aceitamos. Um aperto de mãos entre cavalheiros e a aposta estava selada. Passaram-se meses.
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Cerca de 300 cães participaram da competição, em maio, na Cidade do México. Nascido em terrae brasilis, César sagra-se tricampeão mundial da raça. Logo depois, um telefonema. “Zé, o César foi campeão de novo. Quando faremos a entrevista e fotografamos a capa?”. Fausto Corrêa da Silva, não tenha dúvidas, é um homem de palavra.
Semanas mais tarde, encontramos o homem que mais tempo fica no ar nos domingos globais em um dos restaurantes mais tradicionais de São Paulo, no Jardim Europa. Almoços são perfeitos para aproximações com artistas. Não que eles, os artistas, baixem a guarda enquanto comem ou que a satisfação fisiológica causada pela alimentação os deixe mais abertos a perguntas difíceis de serem respondidas.
É bem mais simples que isso, sem grandes teorias sobre técnicas de entrevista: agenda de celebridade é sempre concorrida, mas todo ser humano em condições normais de existência para alguma hora para comer. Naquela tarde, Fausto Silva havia reservado três horas do seu tempo para a Rolling Stone.
Depois da conversa durante o almoço, seguiríamos para o estúdio do fotógrafo Maurício Nahas, onde encontraríamos o tricampeão César, acompanhado de seu veterinário, Dr. Edgard Brito, e de seu tratador, José Luiz Guedes, e a foto seria realizada. O encontro no restaurante prometia ser a primeira de, ao menos, duas entrevistas. Não foi. Se vira nos 30.
Fausto Silva não é tricampeão mundial da raça – de apresentadores de televisão, de seres humanos, do que for – mas ostenta silenciosamente o título de “homem que tirou o domingo de Silvio Santos”. E isso, em uma perspectiva histórica da televisão brasileira, não é pouca coisa. E silenciosamente, por que memória no Brasil é o que mesmo? Já se vão 18 anos desde sua estreia global.
Após um reinado solitário desde os anos 60, seu Silvio foi atropelado por um paulista gordo e bonachão, 15 anos mais novo, treinado nas improvisações do rádio, das reportagens esportivas aos programas de humor, e com um talento nato para se autossacanear. E rei no Perdidos na Noite, um programa de auditório tosquérrimo e, por isso mesmo, sensacional, que ia ao ar nos finais de semana dos anos 80. “Muda de canal, tá passando um filmão na Globo hoje” ou “isso aqui é uma zona mesmo”, costumava dizer na TV Gazeta, depois na Record, depois na Bandeirantes (de 1985 a 1988).
O histórico programa que apresentou Fausto Silva, primeiro para São Paulo, depois para o Brasil, mudando a cara das atrações de auditório, virou febre entre a juventude. Em São Paulo, jovens se acotovelavam em filas gigantescas para assistir às gravações. A sensação naqueles distantes anos 1980 era a de liberdade pós-militares. Bandas de rock eram habituês do Perdidos na Noite e ali tocavam ao vivo, falando o que bem entendiam e fazendo parte da divertida tosqueira.
Acompanhado de Luiz Schmidt, seu advogado, e de Eugênio Dell Agnolo, seu assessor, Fausto Silva chega no restaurante na hora marcada. Traz uma gravata de presente para o nosso publisher, um dos vários regalos que costuma dar aos amigos. Espero que todos escolham seus lugares e sento-me à cabeceira da mesa, a seu lado. Depois de gentilmente pedir minhas credenciais profissionais, começa a beliscar as entradas do restaurante chique.
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Ligo o pequeno gravador digital e o posiciono à frente do apresentador. Uma matéria no jornal Folha de S.Paulo sobre o Domingão do Faustão no fim de semana anterior ao nosso encontro ainda ecoava na cabeça de Fausto Silva. “Então, o que acontece? Encheram o saco: ‘Ah, dá uma entrevista, porque é um cara legal, porque isso, porque aquilo’. Aí, o cara vai lá, faz a entrevista, você atende bem, com educação, e ele coloca no jornal: ‘O Verborrágico Faustão’. P*** me***! Tenho certeza de que não sou verborrágico. Mas, se fosse inseguro, eu daria um tiro na cabeça. Tem que ter equilíbrio.”
Aproveito a deixa e começo com o tema Perdidos na Noite. “Existe a crítica saudosista das viúvas do Perdidos na Noite”, ele diz. “Até entendo, mas é aquele negócio: se eu tivesse ficado do mesmo jeito, o que os caras iriam falar? Se você fica a vida inteira como marginal e como antitelevisão, o cara fala: ‘Porra, esse cara não muda, é sempre a mesma coisa’. Se você muda, ele fala: ‘Por que esse cara mudou?’.”
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*Texto publicado originalmente na 13ª edição da Rolling Stone, em outubro de 2007
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