Os Mutantes
Paulo Cavalcanti
Publicado em 13/05/2013, às 10h48 - Atualizado às 10h51Com ousadia, Sergio Dias e seu Mutantes reformado se arriscam novamente com material inédito
Os três jovens sorridentes e excêntricos coletivamente conhecidos como Os Mutantes viraram história muito rápido. A banda, depois da fase gloriosa durante a segunda metade dos anos 60, se transmutou em uma besta que se levava muito a sério na seara do prog rock. Os Mutantes finalmente implodiram, mas se recusaram a descansar em paz. A descoberta da banda por gringos novidadeiros e descolados nos anos 90 não foi uma grande surpresa. Mesmo de forma capenga e insuficiente, o retorno à cena da marca Os Mutantes em 2006, com um Sergio Dias entusiasmado e dando as cartas e um Arnaldo Baptista presente apenas de corpo, matou a curiosidade daqueles que nem eram nascidos no apogeu da banda.
A história poderia terminar aí, com um revival pouco convincente, mas que agradou a marinheiros de primeira viagem. Sergio Dias sabia o que queria. Os Mutantes saíram do status de banda cult e conseguiram amealhar um público fiel nos Estados Unidos e na Europa. É para eles que o guitarrista pretende falar agora. Ele, que mora fora do país há um bom tempo, já deixou claro que o Brasil não é prioridade. Alguns podem encarar como traição, mas o mutante-chefe é pragmático. Em 2009, ele e seus novos e jovens recrutas lançaram Haih or Amortecedor. Foi o primeiro álbum de estúdio (sem contar lançamentos contendo material de arquivo) com o nome Os Mutantes desde Tudo Foi Feito Pelo Sol (1974). O álbum foi editado primeiro no mercado externo e ganhou um discreto lançamento nacional. Agora, Dias e os novos Mutantes vêm com Fool Metal Jacket, ainda sem previsão de lançamento oficial no Brasil. O nome é ambíguo e provocativo – uma referência ao título original Nascido para Matar, filme de Stanley Kubrick. Quase todo cantado em inglês, o álbum é um vago libelo sobre guerra, injustiça, mudanças e liberdade, temas caros a velhos hippies dos anos 60. Se Haih or Amortecedor parecia um mero pastiche de sons tropicalistas, Fool Metal Jacket é mais convincente, embora não fuja da cartilha do folk-rock e da psicodelia. É tudo melódico, bem tocado e cantado e produzido com esmero.
O disco abre com “The Dream Is Gone”, canção melancólica de melodia persuasiva. Em “Fool Metal Jacket”, a faixa-título, Sergio Dias encarna o soldado moribundo, com direito a vocais sofridos e distorcidos. Bia Mendes se encarrega do vocal na etérea “Eu Descobri”, única faixa cantada totalmente em português, com melodia hipnótica e um inconsequente jogo de palavras. “Ganjaman” trafega pelo território do reggae de branco, caricato e cantado com sotaque carregado, mas embelezado pelas harmonias vocais. O hard rock setentista dá as caras em “Picadilly Willie”. Já a barroca “Into the Limbo” parece ser um tributo de Dias ao irmão Arnaldo Baptista, cuja mente ainda parece vagar em algum lugar desconhecido. Para não deixar dúvida de que Os Mutantes foram os primeiros e grandes “viajantes” da música brasileira, Fool Metal Jacket fecha com “Valse LSD”, lisérgica, estonteante, que não faria feio em algum lado B do Pink Floyd da fase Syd Barrett. A questão é esta: os Mutantes deste milênio são uma paródia, ego trip de Sergio Dias ou ainda uma entidade musical vital? A escolha é de cada um. Mas, se serve de consolo, Fool Metal Jacket pode ser apreciado sem transtornos.
Fonte: Varése Sarabande