- Ilustração:Pedro Henrique Ferreira

Marcelo D2

Redação Publicado em 08/09/2010, às 07h09 - Atualizado às 07h10

Marcelo D2

Marcelo D2 Canta Bezerra da Silva

EMI

“Nunca tinha feito um disco cantando”, disse Marcelo D2 na Rolling Stone 47. O assunto era este disco, Marcelo D2 Canta Bezerra da Silva, que sai cinco anos após a morte do cantor pernambucano. A sugestão foi dada ao cara sagaz e cascudo direto do Andaraí no velório do sambista. De fato, D2 sabe que nunca teve o canto como a figura principal da sua trajetória, mas sim as confusões que causou o sucesso do Planet Hemp e as misturas musicais da sua carreira solo. Das experiências sonoras usadas no Planet, D2 chegou à sintética mistura de samba com rap – diga-se de passagem que ele não foi o primeiro e muito menos é o único, como alguns podem achar, mas foi o que se deu melhor comercialmente. Daí para o puro samba faltou a deixa: homenagear o ídolo, amigo e mentor. Neste trabalho, sai a figura do DJ, desligam-se os ampler e as pickups. Entra um grupo de samba de primeira e a produção de Leandro Sapucahy, que também dá uma força nos pandeiros, cuícas, ganzás e a fins. Não espere inovações, versões e andamentos diferentes ou mesmo surpresas em relação às músicas originais. Assim como alguém faz uma setlist no iPod para atacar de DJ na noite, D2 pegou toda a obra de Bezerra da Silva e separou as músicas por afinidade. Se houve um critério, além do gosto pessoal, foi a tentativa de distanciamento do tema “drogas”, já desgastado em seus discos – “Cocada Boa”, por exemplo, ficou de fora. E a capa já diz o que é o novo trabalho: uma sátira ao Eu Não Sou Santo, de 1990, em que D2 ocupa o lugar de Bezerra da Silva, crucificado ao pé de um morro. Em vez das armas empunhadas por Bezerra, dois microfones. E o disco é isso mesmo: todas as características do som do Bezerra, só que com a voz de Marcelo D2. A intenção de se livrar das drogas cai por água abaixo em pelo menos duas faixas: “Partideiro sem Nó na Garganta”, que, pela letra, poderia muito bem já ter pintado em algum disco do D2 (“Eles dizem até que eu fumo maconha/Que ando com a venta entupida de pó/O que vem de baixo não me atinge”) e “A Semente”, um dos maiores clássicos do Bezerra, que conta a história de uma árvore diferente que cresce em seu terreno depois que o vizinho se livrou de algumas sementes pelo muro. Depois ainda temos “Malandragem Dá um Tempo”, que, depois de tão regravada e alterada, volta praticamente para o seu habitat e forma natural. “Eu S ou Favela” mostra a face menos descontraída do sambista e defende a favela com unhas e dentes, dizendo que é “um problema social” e cheia de gente “trabalhadeira”. “Ninguém neste Brasil cantou a favela como ele”, comenta D2, ao final da faixa. Aliás, o rapper “conversa” com o ouvinte no início e no final de algumas faixas, meio que para reforçar a sua presença e mostrar que não está tentando imitar o homenageado. O tom é de respeito e admiração. Sapucahy, além da produção, também dá uma força nos vocais de algumas faixas, como em “A Necessidade”, em que ele canta com a mesma empolgação do protagonista. Outra coisa que não poderia faltar em c overs de Bezerra d a Silva é o coro: três potentes vozes femininas fazem as famosas respostas, características do samba do morro. Neth Bonfim, Carla Pietro e Keilla Santos assumem a responsabilidade e participam de quase todas as faixas. Todas essas características acabam tornando este CD uma boa trilha sonora para aquela feijoada com pagode ou o tradicional churrasco do fim de s emana. Aqui encontramos samba, pura e simplesmente.

Marcos Lauro

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