Nara Leão
Paulo Cavalcanti Publicado em 13/03/2013, às 14h36 - Atualizado às 14h41
Caixa reúne eclética produção da cantora na década de 60, provando que ela foi muito além da bossa
O maior clichê sobre Nara Leão é que ela foi a “musa da bossa nova”. Isso é verdade, mas é reducionismo. Foi no apartamento de Nara em Copacabana, onde se reuniam jovens talentos como Roberto Menescal e Carlos Lyra, que logo iriam formatar musicalmente o estilo. Nara namorava Ronaldo Bôscoli, jornalista, letrista e o mais perto que a bossa teve de um ideólogo. Mesmo com toda a atividade musical que a cercava, Nara não era levada a sério em suas intenções artísticas –a voz pequena era considerada “amadora” até para os padrões da bossa. Apesar do importante papel como “curadora” e incentivadora, poucos acreditavam que a garota pudesse realmente cantar e trazer algo efetivo para a música que estava sendo criada.
Por isso, levou o que pareceu uma eternidade até que ela entrasse em estúdio. Em 1963, gravou algumas faixas avulsas, mas sua carreira fonográfica deslanchou de verdade no ano seguinte. Nara já era outra pessoa. O aspecto lúdico da música que em parte surgiu em seu apartamento já não despertava grande interesse na cantora iniciante. Nara foi uma das primeiras a olhar para o samba do morro e seus autores, até então desconhecidos da grande massa. Nara, o álbum de estreia, lançado pela gravadora Elenco em 1964, tinha canções de Cartola, Elton Medeiros, Zé Ketty e Nelson Cavaquinho. Ela dava voz a um Brasil esquecido, distante da zona sul chique onde surgiu a bossa nova. No álbum também cantava várias do amigo Carlos Lyra, outro que viu a mudança dos tempos: Lyra trouxe a Nara um viés político mais à esquerda. Opinião de Nara veio no mesmo ano e também tinha samba de raiz, presente em criações de Zé Ketty, embora a artista também cantasse composições esteticamente mais modernas de bossa-novistas como Edu Lobo, Vinicius de Moraes e Baden Powell. Já O Canto Livre de Nara (1965) enveredava por um lado regional, incluindo “Suíte dos Pescadores” e “Corisco”.
Em Nara Pede Passagem (1966), ela abria espaço para o trabalho de dois novos compositores: Sidney Miller e Chico Buarque. Nesse ano, Nara participou do II Festival da Música Popular Brasileira, exibido pela TV Record. A cantora ficou em primeiro lugar com “A Banda”, de Chico Buarque – mas a posição foi dividida com “Disparada”, interpretada por Jair Rodrigues. O compacto com a canção vendeu absurdamente e a faixa ainda foi incluída no LP Manhã de Liberdade (1966). A alegre e nostálgica canção de sucesso obscureceu o resto do disco, que tinha material mais circunspecto e sombrio como “Funeral de um Lavrador” e “Menina de Hiroshima”. Vento de Maio (1967) foi puxado por outra composição de Chico Buarque: “Com Açúcar, com Afeto”. No disco, Nara novamente privilegiou a dupla Chico/Sidney Miller. Nara (1967) foi uma surpresa: a cantora passeava por tempos mais amenos, resgatando clássicos de décadas passadas, como “Tic-Tac do Meu Coração” e “Camisa Amarela”.
No ano de 1968, Nara já demonstrava afinidade com os tropicalistas. O álbum daquele ano, chamado apenas Nara, aponta para esse lado. Com arranjos e regências de Rogério Duprat, incluiu a marcante “Lindoneia”, que ela pediu especialmente para Caetano Veloso. Ela encerrou a década com Coisas do Mundo (1969), mais uma demonstração de ecletismo, com Nara se aventurando por canções como “Atrás do Trio Elétrico”, “Pisa na Fulô” e até fazendo uma versão para uma canção do compositor belga Jacques Brel. Samba, Festivais e Tropicália também tem três álbuns em que Nara aparece com outros artistas: o show 5 na Bossa, gravado no Teatro Paramount (SP) com Edu Lobo e o Tamba Trio, e o registro das peças Liberdade, Liberdade e Opinião. O pacote também abriga um CD duplo com raridades e faixas perdidas em compactos e coletâneas. Sim, Nara foi a musa da bossa, mas muito mais do que isso. A inteligência musical que a voz frágil projetava sobrevive ao tempo.
Fonte: Universal
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