Bonde do Rolê
José Flávio Júnior Publicado em 10/08/2012, às 13h34 - Atualizado às 13h39
Liquidificador sonoro do trio junta letras sacanas, batidas espertas e até Caetano Veloso
Quando lançou “Baby Doll de Nylon”, em seu disco Ah, Robertinho do Mundo (1983), Robertinho de Recife não poderia prever o que aconteceria com a música na época, quanto mais no milênio seguinte. A faixa teve boa execução nas rádios na época, mas foi atropelada pelo álbum Metal Mania, em que o guitarrista abandonava sua faceta suingante para abraçar o rock pesado. Desde meados dos anos 00, o tema matador que enaltece um baby-doll de náilon e uma misteriosa mulata voltou a frequentar festas de música brasileira, foi regravado pela cearense Karine Alexandrino, ganhou versão de Zeca Baleiro e vinha abrindo os shows da banda Do Amor. Mas quem deve torná-lo mundialmente famoso é o Bonde do Rolê. Rebatizado de “Baby Don’t Deny It”, é um dos acertos de Tropical/Bacanal, o segundo álbum do trio curitibano. Caetano Veloso, seu coautor, aparece na releitura cantando a única estrofe. O refrão ganhou versos em inglês que passam por cima do sentido original e ampliam seu apelo universal.
“Baby Don’t Deny It” não é uma mistura de funk carioca com guitarras agressivas. Ficou no passado a equação que era a marca de With Lasers e cativou os gringos em 2007, quando faixas da estreia do Bonde foram parar em videogames, propagandas e seriados, entre outros pequenos feitos – Isaac Brock, o vocalista da banda norte-americana Modest Mouse chegou a apontar o CD como o melhor lançamento daquele ano. A trupe segue interessada em misturar ritmos, em fazer música para as pistas mais insanas e em falar baixarias. Só que agora, com limites alargados. E, ainda, com uma nova vocalista: Laura Taylor herdou o posto de Marina Vello por meio de um concurso bastante suspeito organizado pela MTV daqui.
Entre 2008 e 2011, Pedro D’eyrot e DJ Gorky, as mentes doentias que controlam o Bonde, escreveram e reescreveram o material de Tropical/ Bacanal. No cenário frívolo habitado pelo grupo, um período tão longo de ausência costuma ser fatal. Mas, antes que o álbum chegasse às lojas, alguns de seus singles já geravam barulho. Em especial “Kilo” e “Bang”, ambos com um inusitado clima western. O primeiro ganhou videoclipe estrelado por Diplo, o produtor executivo do disco. O segundo, que preserva o DNA funkeiro dos primórdios em suas batidas, foi adotado por rádios espertas, muito por causa da participação de Kool AD, MC do cômico Das Racist. Mais próximas de “Baby Don’t Deny It” são “Dança Molengo” e “Pucko”, que flertam com a lambada e a música caribenha e ajudam a justificar o nome do disco. Se bem que, no caldeirão do Bonde, é sempre difícil dizer quando termina uma influência e começa outra, o que é do Pará e o que vem da África via juju music.
“Picolé” entra fácil para o rol de composições do Bonde capazes de corar um cidadão, já que aborda uma prática sexual sem rodeios. O forró todo errado “Kanye” ganha em constrangimento por falar abertamente do desejo carnal de um dos integrantes pelo rapper norte-americano. Já “Banana Woman” mais sugere do que explicita a relação de uma mulher com a fruta tropical. A constatação é que as provocações dos curitibanos ainda produzem faísca em 2012. E eles talvez estejam até melhores, com o arsenal de truques ampliado. Ainda não foi dessa vez que o Bonde descarrilou.
Fonte: Deck
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