Redação
Publicado em 12/12/2008, às 15h15 - Atualizado às 15h23Adriana Calcanhotto
Cobogó
Adriana Calcanhotto relata uma viagem de sensações em narrativa irônica e emergencial
A cantora Adriana Calcanhotto documentou seus delírios na turnê portuguesa na qual sofreu uma overdose de medicamentos (prescritos pela medicina lusa). Com os caracteres da capa recortados de embalagens de remédios, a compositora envolve o leitor em suas aventuras pelo mundo da insônia, dos sonhos e do (auto)humor. Os relatos se agravam em efeitos colaterais – destaque para os hilários trechos em que a protagonista enrola a língua – e a narrativa busca respostas para dúvidas existenciais enquanto promove a desconstrução pública de uma artista em sua vida privada. Extremamente pessoal, com reprodução de alguns e-mails e telefonemas trocados durante essa vivência, Saga Lusa parece um antídoto às dores do corpo e da mente. Calcanhotto e suas referências imprimem uma história simples, quase mínima, permeada por ironia e descompromisso – sem cair na armadilha blogueira dos textos "minha vida, minha obra". São impressões de quem esteve prestes a abrir portas da percepção e permaneceu entre a verdade e a ilusão. Parece ter sido escrito em um tempo (sur)real. Libertário. Cômico.
Como definiria Saga Lusa?
É o relato de uma viagem.
Por que decidiu transformar essas sensações causadas pelo efeito dos medicamentos em um livro?
Escrevi para sobreviver, precisava me manter no presente. E, com isso, relativizei o problema, ri de mim mesma.
Muito se diz que o artista resolve algumas questões através de sua obra. Saga Lusa é o tratamento de seus pesares?
É também, mas não só. Qualquer trabalho que faça terá um pouco disso, na gênese e na feitura.
Essa saga também pode ser vista como sua invasão de privacidade consciente?
O livro abre uma escotilha, conta um episódio apenas, mas não "é" a minha vida, que é muito mais eletrizante.
Desta vez, você encontrou o local perfeito para aflorar (ainda mais) sua verve cômica?
Realmente, o público que leu Saga Lusa diz que me superei [risos].
Essa experiência faz um recorte de sua trajetória. Existe espaço para uma futura autobiografia?
Acho difícil. Daria trabalho lembrar o passado, não sou muito dada a recordações. Depois, deve ser chatíssimo ficar maneirando, não se pode citar o nome das pessoas. Morreria soterrada em processos se fosse contar tudo [risos]. Eu me identifico mais com essa ambição de tentar capturar o presente na escrita e pela escrita. O motor do meu livro é justamente esse desejo, o de tentar morder o próprio rabo.
Ademir Correa