O rapper marajoara Bart Mc já sofreu ameaças de morte por denunciar corrupção do governo da região, mas continua a exercer direito de crítica nas músicas
Camilla Millan Publicado em 19/09/2021, às 16h00
No estado do Pará, mais precisamente na Ilha do Marajó, há um rapper que transforma indignação em versos afiados. Bart MC, de 25 anos, usa o rap como ferramenta de denúncia contra a corrupção e programas governamentais prejudiciais à comunidade local — e, inclusive, sofreu ameaças de morte pelo trabalho.
Interessado em música desde adolescente, Bart MC teve vontade de fazer carreira como guitarrista — instrumento que chamou a atenção desde o início. No entanto, ao se mudar para Belém em 2014, passou a frequentar as batalhas de MC e percebeu a potência das líricas, voltando-se musicalmente para o rap.
De volta ao Marajó em 2017, indignou-se com a forma que o governo lidava com a população ribeirinha e as comunidades tradicionais da ilha. Para chamar a atenção dos governantes e moradores locais, fez música:
“Pensei que poderia usar o rap para chamar atenção para nossa região, porque ela é esquecida em todos os sentidos: na cultura, em relação a investimento... O Marajó é um poço de cultura muito intenso que é pouco valorizado do modo político. Então resolvi começar a usar o meu rap para testar, buscar condições melhores para o meu município de São Sebastião da Boa Vista e começou a dar muito certo,” explicou Bart MC em entrevista à Rolling Stone Brasil.
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No Marajó, Bart foi responsável pelo projeto “Facção da Ilha”, que juntou jovens da região interessados no rap. Com a falta de investimento, o movimento precisou ser finalizado, mas as músicas solo mantiveram o músico [o artista/compositor pois músicas e m´usico] no objetivo de contestar por meio do próprio som.
O MC quer ser um professor de história, e vê na arte uma importante ferramenta de denúncia. As músicas “Vamos Mudar” Parte 1 e 2 refletem esse entendimento do rapper, com letras que denunciam a situação sanitária e econômica da região:
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“A arte tem acessibilidade de tocar qualquer pessoa, da mais nova a mais velha. Quando você envolve arte em questão de crítica, questão sentimental como o próprio ódio, a tristeza, o amor, você tem a facilidade de chegar nas pessoas. Quando se trata de rap e crítica ela rompe todas as fronteiras porque o público começa a compartilhar (...) A população que não tem voz se exercita nesses protestos,” afirmou.
Lançada em agosto de 2021, “Abrace o Marajó, Mas Não Amam o Marajó” representa o trabalho que o rapper faz para a comunidade local. Em parceria com a ONG Observatório do Marajó, lançou a faixa acompanhada de clipe que critica o projeto “Abrace o Marajó”, iniciado em 2019 pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do governo de Jair Bolsonaro (sem partido), comandado por Damares Alves.
“Quando tive acesso às informações sobre o Abrace o Marajó eu fiquei bastante impactado porque é um projeto bem m**da. Eles querem entregar nossa terra a um bando de burguês, desmatar, criar gado e vender para o exterior. Querem criar portos para financiar mercadorias. Ou seja, se um dia formos úteis para esse projeto vai ser para bater traça de cimento e cuidar de gado,” disse.
Segundo o rapper, o projeto dos portos não leva em consideração as reais necessidades da população marajoara — e mesmo diante de tantas inovações e construções na região, não irá especializar a comunidade para trabalhar.
“Se nós formos úteis pra ele [o projeto], vai ser só na hora da construção, depois vamos ser descartados. Aí na hora de caçar não vai ter caça, porque a área foi desmatada. Na hora de pescar, não vai ter peixe. Então eu não vejo nada de positivo nesse projeto, foi por isso que me interessei em me juntar com eles [ONG Observatório do Marajó] e consolidar essa ideia através da música,” explicou.
A visibilidade das músicas de Bart são importantes não só para dar luz aos problemas da comunidade, mas para a segurança pessoal do rapper, que foi ameaçado de morte por um político da região.
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Sem nomear o político, Bart explicou à Rolling Stone Brasil que, após fazer uma música sobre a corrupção do governo local, um homem se encontrou com ele para ameaçar e obrigar o rapper a parar de lançar músicas com as denúncias.
Preocupado com a sua segurança, o MC achou melhor se afastar da região por alguns meses, voltando para Belém: “As ameaças foram bem diretas. A pessoa que foi contratada, digamos assim, chegou e falou. Tive acesso a essa informação diretamente. Tive que passar um tempo em Belém.”
Conforme relata o rapper, ao voltar ao Marajó, lançou músicas sem a característica de protesto, como estratégia: “Fiz uma sequência de três músicas românticas para amenizar essa situação, para eles pelo menos imaginarem que eu tinha desistido de protestar. As coisas foram amenizadas, e cheguei até a cantar em alguns eventos desse antigo governo.”
As ameaças não pararam o músico, porém. Bart MC segue com planos profissionais e vê na arte, mais do que nunca, um importante meio de incomodar os que estão no poder e dar visibilidade a importantes temáticas.
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Para um futuro não tão distante, espera uma nova atitude do governo diante da comunidade marajoara, pautada principalmente pelo diálogo com a população local. Com suas músicas, continua a lutar por isso.
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