Nova fase da banda Bastille, Give Me The Future propõe expor a relação conflituosa entre homem e tecnologia sem perder tom animado de disco pop
Beatriz Bim (sob supervisão de Yolanda Reis) Publicado em 20/02/2022, às 10h00
Ao introduzir o clássico tema de filme de ficção científica, a banda Bastille dispõe, com maestria, um espelho à frente da sociedade moderna: o futuro chegou. Esta é a proposta do novo disco do grupo britânico, Give Me The Future. Lançado em 4 de fevereiro de 2022, as canções abordam a relação conturbada entre homem e tecnologia.
Com seções de cordas, solos de pianos e sem abandonar o divertido e dançante disco pop, Give Me The Future sustenta a metalinguagem que propõe: para flertar com um futuro presente, a banda lidou com os impasses tecnológicos da pandemia, enquanto escrevia um diário de sobrevivência de tempos nada remotos.
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Conhecida pelo hit de 2013 “Pompeii,” Bastille não é a mesma formada há 10 anos. A nova fase do grupo sustenta-se com a singela - e ousada - iniciativa de se reinventar. Com novas parcerias musicais, mensagens e composição, o vocalista Dan Smith conversou com a Rolling Stone Brasil para contar, com empolgação e orgulho, sobre o quarto disco da banda.
Com 13 canções, Give Me The Future difere de todas as produções do Bastille até o momento. “Como um capítulo autossuficiente,” a banda decidiu elaborar “um disco de ficção científica, que refletisse o gênero no som” e na letra, mas sem abandonar a identidade formada após anos de trabalho.
“Queríamos explorar vários temas sobre o futuro e falar sobre as complexidades da sociedade e da cultura que vivemos no momento. [O disco] é muito sobre escapismo e tentar sair da própria cabeça por um tempo, além de abordar o nosso relacionamento com a tecnologia e como ela afetou praticamente todas as áreas de nossas vidas de maneiras diferentes,” compartilhou Smith.
Apesar do tema denso e complicado, Bastille não abandonou o traço divertido da banda. A combinação acertada foi intencional - e inteligente: “Queríamos nos divertir com essas ideias e explorar alguns tópicos grandes e complexos, mas também criar um disco pop estranho que distrai quem escuta. É uma jornada bastante bizarra, ouvir o álbum do começo ao fim. É surpreendente e desafiador.”
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O tema inédito na história da banda não foi a única iniciativa que difere do estilo proposto pelo Bastille até o momento. Pela primeira vez, o grupo colaborou com diversos artistas, produtores e músicos. A situação “fantástica” também propôs algo inédito aos artistas: lidar com a “clássica experiência de gravar um disco na pandemia.”
“Havia músicas que escrevíamos pelo Zoom, canções compostas na sala. Às vezes os músicos entravam [e colaboravam], e em outros momentos precisavam enviar as partes deles por e-mail,” ressaltou Smith. Apesar do desafio, o vocalista não se arrepende da iniciativa: “Estou muito feliz porque nos permitiu trabalhar com pessoas na América, na Suécia, na Escócia. Experimentamos novos cenários de uma forma emocionante e fresca.”
Entre as diversas colaborações com a banda, destacam-se o cantar e rapper Riz Ahmed, em “Promises,” e o músico BIM, na composição “Future Holds.” Para Smith, as músicas com o envolvimento dos artistas são incríveis devido ao “lindo poema” escrito por Ahmed para o disco e a “incrível voz” de BIM na canção da qual participa.
Apesar da inspiração em livros e filmes de ficção científica ser clara - e reiterada pela banda em diversos momentos - o disco não se baseou exclusivamente nessas obras. Entre os músicos que influenciaram Bastille a compor Give Me The Future, Smith ressalta: “Phil Collins, Paul Simon, produções de Quincy Jones, The Weeknd e Daft Punk.”
Além de apoiar nos estilos desses artistas, o grupo também fundamentou o disco em gêneros como “k-pop, músicas dos anos 1980, trilhas sonoras de filmes, momentos da história do jazz e ritmos brasileiros.” Diversas fontes foram consultadas para construírem uma “grande jornada musical, na qual não se sabe o próximo passo e as canções são como uma surpresa atrás da outra.”
Apesar do disco convidar o público a embarcar em uma jornada sobre os perigos da tecnologia, Give Me The Future fala também sobre esperança e humanidade. Preocupando-se em tocar o último acorde de maneira positiva, as canções não são um manifesto para uma sociedade perdida: “O disco é construído com essa inquietude com o futuro, e então termina com uma música como se alguém ao lado falasse: ‘Pare de se preocupar com o futuro.’”
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“A tecnologia pode ser realmente incrível e unificadora, mas também pode ser muito complicada e sombria,” continuou Smith. Apesar das complicações do mundo moderno, a canção final “Future Holds” funciona como um conselho: “Ficamos ansiosos e estressados sobre o futuro, se será bom ou ruim, mas é importante lembrar de aproveitar o que temos no momento. Esqueço disso o tempo todo, então a música é como um lembrete para mim.”
De uma sociedade escrava das tecnologias ao questionamento sobre possíveis versões do futuro, as conexões entre Give me the Future e os tempos pandêmicos são diversas. No entanto, a ideia para o disco surgiu antes do aumento de casos de covid-19 alastrar o mundo. Para Smith, presenciar essa profetização nada intencional foi como ver “um filme maluco se tornar realidade.”
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“Somos constantemente confrontados com o que pode ser o futuro. Nos noticiários, vemos como as mudanças climáticas afetam as comunidades em todo o mundo, e sempre pensamos como será daqui para frente. Então, com a pandemia, a vida mudou totalmente. Nenhum de nós sonhava que passaríamos grandes períodos presos em casa, vivendo atrás de telas,” comentou Smith.
O contexto serviu como um catalisador para as ideias da banda, auxiliando-os a comporem as canções e construírem a obra: “Esse cenário ajudou muito com o disco, porque toda a nossa relação com a tecnologia se tornou ainda mais extrema com a pandemia, e isso realmente alimentou as ideias para as músicas. [O cenário mundial] nos fez empurrar [Give Me The Future] para uma direção muito mais distópica.”
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Única canção melancólica de Give Me The Future, “No Bad Days” é uma composição “bem pessoal” para Smith. Lançada em 19 de outubro de 2021, o refrão “Não haverá dias ruins” sustenta os principais temas da música: perda, amor e tecnologia.
Além de expor o lado vulnerável dele na canção, “No Bad Days” também motivou Smith a propor algo inédito na história do Bastille: o videoclipe da música foi o primeiro projeto do vocalista como diretor. Com The Trash Factory também no comando, a obra faz referência aos clássicos filmes de ficção científica Metrópolis (1927), Ex-Machina: Instinto Artificial (2014) e Matrix (1999).
O clipe acompanha a história íntima de Smith ao tentar utilizar a tecnologia para ressuscitar um familiar perdido. Apesar da estreia na direção, o desejo do vocalista de viver a experiência não é de hoje: “Sempre quis dirigir, mas estávamos tão ocupados, realizando várias turnês, e queria fazê-lo corretamente. Então, devido à pausa motivada pela pandemia, tive a ideia de como o vídeo deveria ser, e parecia um bom momento para tentar.”
A vivência reconectou o compositor com uma das paixões dele há anos: “Sempre fui um grande fã de cinema! Quando era adolescente, criança, me preocupava muito mais com filmes do que com a música,” destacou. O fascínio pela sétima arte levou Smith a adorar o resultado do projeto: “Foi incrível e aprendi muito. [O videoclipe] adiciona outra dimensão à música, a história dela e a narrativa do disco.”
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Apesar do contentamento do compositor com o projeto, Smith reconhece a dificuldade do cargo: “É um grande trabalho ser um diretor, bastante complicado e muito difícil. Há muito para observar, o que não funciona, o que dá errado. Havia uma equipe de quarenta profissionais e sinto muita sorte por ter tantas pessoas incríveis trabalhando no projeto.”
“Foram duas semanas muito ocupadas e estressantes. Mas quando acabamos, amei o vídeo. Então, estou muito feliz por fazer isso, mas, da próxima vez, quero ter certeza de que tenho um pouco mais de tempo livre para poder me concentrar muito mais,” brincou o vocalista.
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Assista ao clipe de "No Bad Days":
Ao alertar sobre as diferentes formas nas quais o futuro e a tecnologia podem ser, Give Me The Future também flerta com algumas questões importantes dos dias presentes. “Não há uma grande mensagem de julgamento. Estávamos apenas tentando levantar o espelho para a sociedade do momento e meio que tirar sarro de como tudo é bizarro,” explicou Smith.
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Para ele, uma das maneiras fundamentais de evitar um final distópico é ter a iniciativa de mudança. O vocalista glorifica as personalidades que compactuam com esse pensamento: “Pessoas que dedicam boa parte do tempo e energia delas tentando influenciar a sociedade para melhor, pessoas como Greta [Thunberg] e tantos cientistas, inventores e líderes, isso é realmente inspirador.”
Para mudar as situações, você precisa imaginar um futuro melhor e depois tentar torná-lo realidade. Essa é uma ideia que me interessa muito. Diversos escritores de ficção científica imaginam um futuro que querem evitar ou que querem manifestar, e isso faz parte de ser alguém que motiva mudanças. ”
O vocalista destaca como “imaginação, impulso e confiança” são essenciais para construir um futuro melhor. “Olhar para o mundo através dos noticiários pode parecer muito sombrio e desesperançoso. Então, aqueles capazes de ver tudo isso e pensar positivamente, são [seres humanos] incríveis. Tenho muito respeito por essas pessoas,” concluiu Smith.
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Uma das atrações do Rock in Rio 2022, Bastille retorna aos solos brasileiros para se apresentar mais uma vez nos palcos do festival em 10 de setembro de 2022. Após dois anos impedidos de tocarem em outros lugares, a banda está animada com a oportunidade: “Estamos muito ansiosos para voltar ao Brasil! Há muito tempo queríamos voltar. Tivemos uma experiência tão incrível [quando nos apresentamos no país em 2016],” comentou Smith.
O vocalista elogiou a animação das plateias brasileiras nos shows e explicou a emoção, como músicos, de sentir o carinho do público: “A energia, o volume [dos festivais brasileiros], é brilhante. Como uma banda, ter essa experiência é alucinante.”
“Estamos muito animados para tocar no Rock in Rio! Mal posso esperar para voltar à cidade e conhecê-la melhor, tocar no show, ouvir algumas músicas. Não viajo em dois anos, então será surreal pegar um avião novamente e estar em outros lugares. Contanto que seja seguro para todos, estamos empolgados em voltar a participar de festivais,” compartilhou o compositor.
Smith reiterou a relação de retornar aos eventos proibidos durante a pandemia com os temas de Give Me The Future: “Boa parte do disco é sobre as vidas que vivemos online e em nossas cabeças versus o mundo real, a vida física. Os festivais são os meus lugares favoritos de estar. Sou um grande fã de música e adoro ir nesse eventos, quando tenho tempo livre.”
“Estar em um show, dançar e aproveitar com indivíduos desconhecidos, que estão lá porque amam o mesmo que você, é uma sensação incrível. A internet pode unir as pessoas, é uma ótima comunidade, mas há uma sensação especial em estar em um festival, quando a banda que você ama toca uma música conhecida e você gritar [a letra da canção] com eles enquanto todos pulam. Isso é muito divertido,” concluiu Smith.
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