No segundo dia de sua décima edição, Best of Blues and Rock premiou os fãs da expressão mais emocionante da música
Por Pablo Miyazawa, especial para a Rolling Stone Brasil Publicado em 04/06/2023, às 15h00
Comemorando sua décima edição em 2023, o Best of Blues and Rock levantou o ecletismo como sua bandeira não-oficial durante os três dias de evento.
Se na sexta-feira o rock se impôs, no sábado (3) foi a vez de o festival honrar o blues de seu nome – o que não quer dizer que o rock não tenha dado as caras. O longo dia começou com o hardcore energético do Dead Fish, seguindo para o blues modernizado de Artur Menezes e do The Nu Blues Band, passando pelo instrumental épico de Steve Vai até encerrar com a emocionante entrega da lenda viva Buddy Guy.
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A banda capixaba Dead Fish abriu os trabalhos do segundo dia de Best of Blues and Rock destoando esteticamente do restante do elenco, mas não pareceu intimidada por isso.
Com camiseta de futebol do time turco Beşiktaş e boné do Movimento dos Sem Terra, o vocalista Rodrigo Lima comandou uma apresentação vigorosa que percorreu os 30 anos de carreira do grupo, premiando uma parcela do público que foi ao festival só para vê-lo.
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Apresentando músicas de seus principais álbuns, como “Queda Livre”, “A Urgência” e “Bem-Vindo ao Clube”, de Zero e Um (2004), “Proprietários do Terceiro Mundo”, de Afasia (2001) e “Autonomia”, de Contra Todos (2009), o Dead Fish serviu como uma trilha sonora estimulante a quem chegava ao ensolarado gramado do Auditório Ibirapuera.
Assim como no show do Malvada na sexta-feira, o Dead Fish também enfrentou problemas técnicos com o retorno, o que rendeu reclamações do vocalista ao microfone. De qualquer modo, o quarteto se mostrou como uma aposta acertada do festival para preencher a cota do rock no segundo dia do evento.
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O guitarrista cearense Artur Menezes é mais um que retornou ao palco do Best of Blues and Rock – ele também tocou na edição 2017. Dessa vez, o músico de 37 anos entrou acompanhado de uma formação experiente, reunida dias antes do show, com o baterista Cuca Teixeira e o baixista Fernando Rosa – este, uma sensação com seus clipes performáticos nas redes sociais.
Com a típica competência na guitarra reconhecida internacionalmente, Menezes percorreu a história do blues, adicionando seu tempero pessoal a interpretações de clássicos e faixas de seus álbuns Keep Pushing (2018) e Fading Away (2020), entre elas o recente single “She Cold“.
Ao final, um fato curioso: pensando ainda ter tempo disponível, Menezes começou a tocar mais uma música, mas foi obrigado a interromper a apresentação na metade para não estourar o tempo no palco.
Às 17h10, o palco foi ocupado pelos integrantes do The Nu-Blu Band, sexteto comandado por Carlise Guy, ninguém menos do que a filha de Buddy Guy. Direto ao ponto, emendando uma música na outra, o competente grupo esbanjou coesão e virtuosismo com uma sonoridade impecável que encantou os presentes.
“Vocês amam o Buddy Guy? Eu também”, brincou Carlise, desfilando sorridente de vestido estampado, enquanto o restante do The Nu-Blu Band se mantinha comportadamente alinhado ao fundo.
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O solo é um ingrediente essencial do blues, e a plateia correspondeu aos gritos a cada execução, ou quando o guitarrista Mark Maddox utilizou-se da extensão do palco para tocar próximo à fila do gargarejo. Houve espaço ainda para a backing vocal Kenyatta Gaines brilhar sozinha em duas faixas.
No repertório não só do blues, mas também do soul, country e R&B, a banda fez interpretações empolgantes de “Mustang Sally” (Mack Rice) e "Tennessee Whiskey” (David Allan Coe), encerrando com “Get Up (I Feel Like Being) Sex Machine”, de James Brown, que fez a multidão animada dançar junto.
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A entrada triunfal de Steve Vai às 18h40 prometia o show mais pesado do dia 2 do Best of Blues and Rock, pelo menos no que diz respeito ao volume das guitarras. Destoando da sonoridade light do show anterior, a apresentação quase que inteiramente instrumental trouxe luz à virtuose criativa de Vai, um dos músicos mais celebrados dos últimos 40 anos.
A banda de visual agressivo fez a base pesada para os timbres espaciais de Vai ecoarem à vontade. A plateia se limitava a assistir com pouca interação, já que as faixas eram tão longas que ficava difícil descobrir quando começava uma e terminava a outra. De camiseta prateada, colete com franjas e boné, o guitarrista de 62 anos foi simpático e falante nas poucas vezes que se dirigiu à multidão - já com o instrumento em ação, porém, parecia ser transportado a outra dimensão.
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Exibindo todas as técnicas possíveis (inclusive sua recente criação, o joint shifting), Vai não parece ter limites para suas habilidades. Para se provar ainda mais, só inventando, como ao tocar um instrumento de três braços chamado Hydra, formado por uma guitarra de doze cordas, uma de sete cordas e um baixo semi-fretless. O colosso precisou de dois técnicos para ser instalado no palco, que Vai utilizou para tocar “Teeth of the Hydra”, rendendo uma imagem impressionante e quase cômica. Os outros músicos ficaram no escuro, o que contribuiu para a sensação de que Vai emitiu todos os sons sozinho.
O público fez barulho ao reconhecer nos telões as cenas do filme Encruzilhada (1986), no qual Vai interpretou o guitarrista do Diabo, e ao ouvir os temas mais reconhecíveis, como “Tender Surrender” de Alien Love Secrets (2005) e “For the Love of God”, de Passion and Warfare (1990). Essa última teve uma participação especial: Dani G., técnico de som da turnê, cantou em estilo operístico a melodia inicial da canção mais famosa de Vai, como tem se tornado típico em seus shows recentes.
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A expectativa para a entrada de Buddy Guy era grande. Afinal, seria o primeiro de seus dois últimos shows oficiais no Brasil, parte da turnê Damn Right Farewell Tour, que supostamente encerra a carreira do lendário guitarrista norte-americano, um dos poucos artistas ao qual o jargão “lenda viva” se aplica perfeitamente. Aos 86 anos, o último blueseiro de sua geração impressiona e emociona por sua simples presença em cena.
Como único nome a tocar em três edições do Best of Blues and Rock (em 2013 e 2014), Guy é praticamente o símbolo do festival. Tirando lindas notas da guitarra sem esforço, combinando força e leveza na medida, ele exala a serenidade de quem já viu e tocou de tudo.
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Sua voz aveludada e confortável soava como um afago nos ouvidos dos fãs, que acompanhavam em silêncio o homem a executar sua arte. E Guy, debochado, fez o que quis: esfregou a guitarra no antebraço e na barriga, tocou o riff de “Sunshine of Your Love” usando uma baqueta e uma toalha e emulou seu contemporâneo Jimi Hendrix, tocando com os dentes em “Voodoo Child”.
Brincando como um menino, Guy tirava onda, fazendo o difícil parecer simples. “Se você não gosta de blues, então está no palco errado. Porque eu vou tocar um blues”, ele alertou a massa, só para garantir. Houve espaço para clássicos de todas as épocas no repertório, em que foram homenageados cada um de seus mestres e comparsas, como "I'm Your Hoochie Coochie Man” (Willie Dixon), “She is Nineteen Years Old” (Muddy Waters), “Boom Boom” (John Lee Hooker), “Take Me to the River“ (Al Green) e "Strange Brew” (Cream).
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“A gente tem hora pra ir pra cama”, Guy brincou, sobre a rigidez que obriga os shows no Parque Ibirapuera a terminarem pontualmente às 22 horas. “Mas, por mim, eu tocaria a noite toda para vocês.” A convite do dono da festa, os filhos Carlise e Greg Guy ocuparam o palco para o número final – notavelmente, Greg vestia uma camiseta do Brasil e usava a Fender Stratocaster Polka Dot eternizada pelo Guy-pai. Foi uma verdadeira celebração à força e resiliência do blues, com a perfeição que só uma lenda como Buddy Guy é capaz de realizar. Felizmente, para alguns, neste domingo tem mais.
O Best of Blues and Rock encerra sua décima edição neste domingo (4), com shows de Day Limns, Ira!, Goo Goo Dolls, Buddy Guy e Tom Morello. Veja como foi o primeiro dia clicando aqui.
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