Auge comercial do grupo americano, representado no álbum Tragic Kingdom, está diretamente ligado com desilusão amorosa
Igor Miranda (@igormirandasite) Publicado em 30/07/2024, às 09h40
Não é todo artista que estoura logo de cara. Na verdade, a maior parte deles leva algum tempo até conquistar a popularidade devida. É o caso do No Doubt: os dois primeiros álbuns da banda americana tiveram repercussão modestas, enquanto o terceiro, Tragic Kingdom (1995), foi o responsável por deixá-la conhecida em todo o planeta.
É neste disco que estão alguns dos grandes sucessos lançados pelo grupo, a exemplo dos singles “Just a Girl” e “Don’t Speak” [ouça abaixo]. Chegou ao topo da parada dos Estados Unidos e ajudou, junto de outros artistas, a renovar o interesse da indústria musical no ska.
O sucesso, porém, veio a duras penas. Não apenas pelo trabalho duro de todos os envolvidos, como também pela inspiração artística: se não fosse o término da vocalista Gwen Stefani com o baixista Tony Kanal, Tragic Kingdom não teria sido lançado da forma como o mundo o conheceu.
Os dois começaram a namorar ainda adolescentes, em 1987. Pouco tempo depois, passaram a tocar juntos no No Doubt. O namoro era mantido em segredo, apesar dos primeiros fãs já notarem uma química especial entre os dois. O relacionamento acabou em 1994, por iniciativa de Kanal, mas os dois continuaram como colegas de banda.
Com a saída do tecladista Eric Stefani, irmão de Gwen, do No Doubt, a vocalista assumiu o controle das composições. O término com Tony, então, se tornou prato cheio de inspiração para a artista. Como consequência, diversas músicas de Tragic Kingdom, como “Happy Now?” e “End It Like This” abordam temas comuns ao término de um relacionamento. Nada como uma decepção amorosa para inspirar uma boa canção, não é mesmo?
Em entrevista de 1996 à Spin (via Louder), Gwen Stefani revelou como o término afetou sua vida naquele momento. A artista confessou que, por algum tempo, viveu em negação com a verdade.
Estava em negação. Eu podia ter perdido o título de namorada, mas na minha visão, ainda estávamos juntos. Por um ano, ele (Kanal) não precisava vir para minha casa quando pedia. Ele não precisava fazer nada, mas quando tinha vontade, eu estava lá. Foi horrível.”
Em outra entrevista, ao The Guardian (via Hello Magazine), a vocalista revelou ter encontrado nas composições do álbum uma inspiração para dizer algo. Ela afirmou:
Após Tony ter terminado comigo, eu percebi que tinha algo para dizer. Quando comecei a compor as canções, pensava: ‘sou um ser humano real. Eu posso fazer algo’.”
Após Gwen Stefani fazer essa revelação, não demorou muito para Tony Kanal passar a ser visto como “vilão” por muitos fãs. Diversos fãs e até veículos de imprensa passaram a imaginar que o baixista causou algum mal à ex.
O guitarrista Tom Dumont conta que, no início, Kanal não se incomodou com as canções. No entanto, isso foi mudando com o passar do tempo.
Ele pensava tipo: ‘por alguma razão, não me incomoda que essas músicas sejam sobre mim’. Talvez ele até gostasse. Mas depois, acho que o incomodou um pouco. Um cara escreveu um artigo sobre nós dizendo: ‘Por que a Gwen está tão triste? O que Tony fez para ela para que escrevesse essas canções?’.”
À época, Tony Kanal descreveu a experiência como algo “surreal”. Entretanto, buscou agir de forma mais profissional possível.
É surreal. Imagine estar no palco enquanto toca essas músicas. Estou abrindo minha vida pessoal para todas essas pessoas. Mas eu não posso ficar amarrado a elas. Tenho de separar eu mesmo da música e seus versos.”
No final das contas, uma pessoa que demonstrou ter empatia com a situação de Tony Kanal foi a própria Gwen Stefani. Ela se colocou no lugar do ex-namorado e imaginou como toda essa situação foi complicada para ele.
“Deve ter sido difícil para ele ter visto as pessoas escrevendo: ‘como você pôde ter deixado a Gwen? Ela é tão incrível’.”
Por mais que a situação tenha gerado um incômodo em Tony Kanal, o tempo aparentou ter curado essa ferida. Afinal, ele continuou como membro recorrente do No Doubt — mesmo com as idas e voltas do grupo — ao lado da própria Gwen Stefani.
Colaborou: Augusto Ikeda.
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