Em entrevista à Rolling Stone Brasil, Chameleo falou sobre a criação de Alta Tensão, segundo disco da carreira, e das dificuldades de ser artista independente
Felipe Grutter (@felipegrutter)
Publicado em 24/11/2023, às 18h00Desde a infância, o cantor Leonardo Fabbri, mais conhecido como Chameleo, sempre escutou como é uma pessoa “ligada no 220,” e usou disso para a realização do segundo disco de estúdio da carreira, intitulado Alta Tensão (sem previsão de lançamento até o momento), que também teve inspiração na ansiedade dele.
Com carreira que data desde 2014, o artista independente começou mesmo a focar em lançamentos a partir de 2018, com aumento do volume de músicas em 2020. Com um álbum de estúdio até o momento, intitulado ECDISE (2021), ele conta com mais de 100 mil ouvintes mensais no Spotify e colaborou com nomes como Number Teddie, Carol Biazin, Pabllo Vittar, Johnny Hooker, Alice Caymmi, entre outros.
A paixão de Chameleo pela música começou ainda na infância, por um acaso maluco do destino. Por volta dos sete anos, ele começou a fazer aulas de teatro por ter muito interesse em atuação. Foi em uma peça que ele precisou aprender a tocar guitarra, e neste momento ele já sabia o que queria ser quando crescesse - e deu certo.
Como explicou em entrevista à Rolling Stone Brasil, o cantor começou a estudar violão após esse primeiro contato com guitarra, então partiu para desenvolver composição e canto. Quando chegou na vida adulta, no começo dos 20 anos, Leonardo Fabbri se matriculou no curso de produção sonora na UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles), e completou a graduação.
Mesmo em um curso interessante em uma faculdade de destaque nos Estados Unidos, Chameleo ainda tinha um pensamento imaturo. “Minha cabeça estava em outro lugar enquanto eu fazia a faculdade,” relembrou. “Foram dois anos muito intensos morando fora, tendo que se virar em outro país. Isso inclui trabalhar, pagar as contas lá, porque não tem como se manter com o real [nos EUA].”
Ele descreveu esse período como um grande aprendizado, seja de maneira acadêmica ou pessoal. No curso, por exemplo, Leo teve aulas com produtores renomados, e um deles chegou a trabalhar com Pink Floyd. Não apenas a fazer música, as aulas de produção sonora na UCLA também mostram os bastidores da indústria musical, com lições sobre marketing, empreendimento, royalties, etc.
Vale destacar como tudo isso que o artista aprendeu no exterior é bastante útil para ele atualmente, principalmente por ser um artista independente e não ter investimento de uma gravadora ou label grande porte.
Sou o meu próprio empresário, meu próprio manager, meu próprio financeiro, meu próprio tudo! Então, com certeza eu tiro muito dessa experiência lá de trás.
Mesmo com origens no teatro, Chameleo preferiu seguir carreira na música, mas não pretende largar a atuação, algo que consegue incluir com mais detalhe e profundidade nos videoclipes, por exemplo. Ele ainda deixou claro como não fecha portas e, caso surja um projeto interessante que converse com o que ele vive no momento, não hesitaria em aceitar.
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A trajetória de Chameleo na mudança de Curitiba para São Paulo é bastante emocionante. Algum tempo após voltar para a capital paranaense após terminar o curso na UCLA, Leonardo foi diagnosticado com um câncer, e passou por um período intenso de transformação.
“Transformei-me em quem sou hoje, na minha versão 2.0,” afirmou. “Mesmo com estudo de música e ela sempre presente na minha vida desde criança, eu tinha uma insegurança, autojulgamento… essas coisas que me puxavam um pouco para trás, impediam-me de colocar, apresentar e enxergar como artista.”
Curado do câncer, Leo tomou uma decisão definitiva: mudar-se para São Paulo e seguir na carreira artística. Cerca de um mês após a migração, ele já estava na metrópole e, desde então, não parou um momento - e carrega essa mentalidade até hoje.
Para Chameleo, o principal obstáculo que um artista independente pode enfrentar é investimento. Mesmo sem muita grana para circular na carreira, ele conta com ajuda de dois amigos fiéis, mas também agradece por pessoas que conheceu quando “trabalhava por trás das câmeras” na indústria. Além disso, ele citou dificuldade em atingir espaços, como em playlists editoriais nas plataformas digitais de música.
“As dificuldades sempre vão existir,” notou o cantor. “Tenho a sorte e privilégio de ter amigos que me ajudam, que acreditam em mim… posso dizer que somos nada sozinhos. Meu trabalho é feito de várias cabeças pensantes: um grupo de amigos que está comigo desde a adolescência. Chameleo é nós, o pensamento de três amigos criando e fazendo como dá. De alguma forma, a gente sempre consegue.”
Realmente, são muitos os desafios, mas o artista nota como essa é uma estrutura de uma indústria gigantesca, que enfrenta muitas mudanças (e rápidas) ao mesmo tempo. “A gente pode reclamar ou não, mas ela infelizmente é dessa forma,” continuou. “Mas dá para rebolar sem perder a essência, sabe? É saber se adaptar, e meu o próprio nome traz isso: Chameleo vem de camaleão. É saber se adaptar e encaixar, mas sem perder essência.”
Justamente na pandemia de covid-19, sem conseguir se sustentar pela música, ele fazia diversos bicos nos bastidores, seja como ajudante de styling ou de direção de arte. No entanto, o cantor conseguiu focar, nesse período de isolamento social, no primeiro disco, ECDISE.
Ainda mais com as emoções triplicadas por conta do momento no qual vivíamos, eu soube tirar o melhor proveito desse período tão devassador… é saber fazer a limonada com aquilo que você tem ali.
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Quase um ano após o lançamento de ECDISE, Chameleo começou a trabalhar no que seria o segundo disco de estúdio da carreira. Assim como surgiu a paixão pela música, Alta Tensão se originou de maneira despretensiosa. O artista conheceu um produtor musical russo pela internet.
Inclusive, ele traçou alguns paralelos entre artistas russos e brasileiros: “Escuto bastante música russa porque existe uma cena underground muito forte lá, [além de] vários pontos que se conectam com o Brasil no sentido de artistas queers serem uma forma de resistência na Rússia, porque o país tem vários problemas e questões que não vem ao caso… sinto uma conexão com os artistas de lá que fazem acontecer diante de um sistema político que vai contra a nossa existência.”
Pela internet, um produtor russo entrou em contato e mandou cerca de oito beats para o brasileiro, e aquilo o inspirou bastante. Nesse som inédito, Chameleo viu a possibilidade de fazer um álbum, e colocou o gringo em link com Lucas Vaz, produtor do cantor curitibano. E assim nasceu Alta Tensão.
Até o momento, o segundo disco de estúdio de Chameleo é a versão mais atualizada e próxima de quem ele é atualmente. Além da agitação e inquietude do artista, ansiedade também é um tema bastante recorrente no álbum, mas ela é retratada de forma mais leve.
“Eu quis explorar minha ansiedade de uma forma mais debochada e leve, tanto nas letras quanto no tema das músicas,” explicou. “Diferente do ECDISE, criei as canções com base no tema, porque gosto de ter um conceito bem amarrado.”
Quis explorar essa eletricidade muito presente em mim, e também um pouco dessa bivoltagem do 220 e 127 volts, a dualidade presente em mim - acredito que em todos os ser humanos.
Sem entregar as surpresas, Alta Tensão é dividido em duas partes, uma mais elétrica, representada pelos 220 volts, e outra mais tranquila, a qual seria dos 127 volts: “Por mais que eu seja muito elétrico, ansioso e agitado, também tenho meus momentos de querer ficar sozinho, introspectivo, então o ‘tranquilo’ traz essa parte. Estou perto dos 30 anos, e sinto como caminho cada vez mais para esse lado de serenidade, tranquilidade, menos 220, mais 127.” Porém, o álbum é muito mais agitado do que tranquilo.
Além disso, em Alta Tensão, Chameleo mostra prendimento com absolutamente nada. As letras falam mais diretamente sobre a sexualidade dele. “Nesse álbum, eu me podo em nada, falo o que quero e da forma que quero, sem medo dos julgamentos,” afirmou. “Sem pensar no outro. É um álbum meu. Tanto que não tem tantos feats. Agora quero fazer algo sobre mim, falar da minha forma, sem me preocupar com o outro. É bem genuíno.”
Seja ligado nos 220V ou 127V Chameleo consegue criar um estilo de som próprio, com as próprias referências e particularidades. Mesmo independente, ele mostra maturidade o suficiente para chegar cada vez mais longe, e tomara que a era de Alta Tensão chegue aos ouvidos de mais pessoas.
ALTA TENSÃO
— CHAMELEO ⚡️ (@chameleo_) November 21, 2023
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