Clemens Rehbein e Philipp Dausch aproveitaram período de isolamento para experimentar ideias e se aproximar do público com mixtapes
Dimitrius Vlahos (@dimitriusvlahos) Publicado em 03/07/2023, às 09h00
Deixando os filtros de lado, a banda alemã Milky Chance aproveitou os anos de isolamento para experimentar e lançar projetos mais livres, dando vazão à criatividade represada durante as extensas turnês. Nesse contexto, Clemens Rehbein e Philipp Dausch lançaram duas mixtapes: Trip Tape (2021) e Trip Tape II (2022).
“Olhamos para o começo da pandemia como um novo capítulo para nós. Muito mudou, não estávamos mais fazendo turnês. Repensamos algumas coisas, mudamos as estruturas, porque queríamos estar mais dentro do projeto que iniciamos 10 anos atrás. Isso influenciou nosso trabalho, e as Trip Tapes foram os primeiros resultados,” o percussionista e baixista Dausch explicou em entrevista à Rolling Stone Brasil.
O desejo de compartilhar a evolução da banda com os fãs rapidamente também fez com que a ideia de lançar um álbum fosse deixada de lado naquele momento. No entanto, Living In a Haze, disco lançado em 9 junho, aproveitou parte das composições e ideias que surgiram durante a produção menos pretensiosa dos projetos anteriores. “As Trip Tapes vieram, e o processo continuou. Estávamos compondo e produzindo constantemente. Chegamos a um ponto em que o álbum estava pronto,” o músico completou.
Living In a Haze não deixou de lado a busca por sons experimentais. Um dos exemplos disso são as colaborações com Fatoumata Diawara, em “Flicker in the Dark,” e Charlotte Cardin, em “History of Yesterday.” De acordo com Rehbein, vocalista e guitarrista, o contato com as artistas veio de forma inusitada, mas “deu uma nova cor” às músicas: “Falamos com as duas pelo Instagram, de alguma forma isso funcionou.(...) Com Fatoumata, fizemos tudo remotamente, mas isso também funciona hoje em dia. A voz dela cantando em sua língua materna soa muito especial. Ela também é uma instrumentista incrível e uma pessoa doce.”
Clemens ressaltou que os shows e composições são o principal foco do Milky Chance, mas a banda não está alheia às questões ambientais que envolvem as turnês. As emissões de carbono nos deslocamentos, descarte de lixo e uso de plástico são alguns dos pontos de preocupação dos artistas.
O debate ganhou força nos últimos anos, e grandes artistas como Coldplay promoveram shows com alternativas sustentáveis. No entanto, antes mesmo da pandemia, o Milky Chance já fazia esforços nessa direção. Atualmente, o grupo segue promovendo parcerias com ONGs: “Nossa principal atividade é encontrar com líderes de ONGs e mostrar o trabalho deles durante as turnês. Além disso e das coisas pequenas, como reduzir o uso de plástico e nos certificar sobre o fornecimento de material e venda dos produtos licenciados; tentamos usar nossa plataforma para amplificar o trabalho de outras pessoas, para discutir.”
“Por exemplo, fizemos uma parceria com uma ONG chamada Wilderness International para a proteção das florestas nativas. Coletamos parte do valor dos ingressos de cada show da turnê para doação. É uma luta contínua,” completou o vocalista.
Sadnecessary (2013) foi o disco responsável por lançar a carreira do Milky Chance. O hit “Stolen Dance” levou a banda a rádios, festivais e turnês pelo mundo. Após 10 anos, Clemens e Philipp não parecem cansados de tocar as faixas do álbum. Diferente de artistas que rejeitam os próprios trabalhos ao atingirem níveis altos de popularidade, eles demonstraram gratidão e apego às próprias composições.
“Tocamos várias músicas do primeiro álbum, ‘Stolen Dance’ não é a única. Acho que não faz sentido rejeitar nosso trabalho. (...) Por que rejeitar um trabalho que chamou tanta atenção e abriu várias portas para você?”, Rehbein argumentou.
A única passagem do Milky Chance pelo Brasil continua na memória dos integrantes. Eles se apresentaram no palco principal do Lollapalooza 2018, e ficaram impressionados com a quantidade de pessoas no Autódromo de Interlagos. “A multidão era insana no Lollapalooza,” Rehbein descreveu.
O duo até arrumou um tempinho para participar da Mamba Negra, uma das festas mais importantes da cena paulistana, em uma noite “muito divertida. Foi uma boa festa. Nos divertimos muito no Brasil.”
A próxima vinda ao país não está confirmada, mas pode acontecer em 2024, conforme Dausch explicou: “Adoraríamos voltar, porque curtimos muito a última vez. No momento, estamos focados na turnê da América do Norte. No próximo ano tentaremos transformar nossas vontades em realidade [risos].”
Confira a entrevista completa com Clemens Rehbein e Philipp Dausch, do Milky Chance:
Rolling Stone Brasil: Em Living In a Haze, há algumas músicas nas quais vocês trabalham desde as duas mixtapes lançadas após o início da pandemia. Conte um pouco sobre o processo do disco e as diferenças entre ele e as Trip Tapes I e II.
Philipp Dausch: Olhamos para o começo da pandemia como um novo capítulo para nós. Muito mudou, não estávamos mais fazendo turnês. Repensamos algumas coisas, mudamos as estruturas, porque queríamos estar mais dentro do projeto que iniciamos 10 anos atrás. Isso influenciou nosso trabalho, e as Trip Tapes foram os primeiros resultados. Sentimos que havia uma evolução em nós, em nossa música. Queríamos compartilhar isso com os fãs sem que eles precisassem esperar três anos, ou o tempo que precisaríamos para terminar um álbum. Não sentimos que era um disco completo. As Trip Tapes vieram, e o processo continuou. Estávamos compondo e produzindo constantemente. Chegamos a um ponto em que o álbum estava pronto.
RS: Vocês aproveitaram as Trip Tapes para lançar alguns covers divertidos, como “Lost In Yesterday,” do Tame Impala, e “Tainted Love,” do Soft Cell. Como chegaram a essa tracklist combinando composições próprias e versões? As bandas escolhidas são influências no som do Milky Chance?
Clemens Rehbein: Sempre gostamos de fazer covers. Antes das Trip Tapes, só havíamos feito para o canal do YouTube, de forma acústica. Foi a primeira vez que gravamos e lançamos e foi divertido. Tem muita música boa por aí. Quando você trabalha em uma faixa que já está escrita, dá para colocar toda a energia criativa na interpretação, produção… uma nova roupagem. Foi muito divertido!
RS: Falando novamente sobre Living In a Haze, o disco conta com duas participações especiais: a voz única de Fatoumata Diawara em “Flicker in the Dark” e a colaboração de Charlotte Cardin em “History of Yesterday.” Como foi trabalhar com elas?
CR: Falamos com as duas pelo Instagram, de alguma forma isso funcionou. Encontramos Charlotte em Berlim. Escrevemos a música juntos no estúdio, tivemos dois dias para isso. Ela é uma vocalista excelente e um ser humano muito doce. O trabalho fluiu bem, foi a energia certa.
Com Fatoumata também foi assim, mas, infelizmente, não nos encontramos pessoalmente. Fizemos remotamente, mas isso também funciona hoje em dia. Como você disse, a voz dela cantando em sua língua materna soa muito especial e deu uma nova cor à música. Ela também é uma instrumentista incrível e uma pessoa doce. Recebemos muitas mensagens de áudio amáveis dela. Espero encontrar ela pessoalmente um dia, mas estamos muito felizes com o resultado do trabalho por enquanto.
RS: Quem sabe uma performance ao vivo.
CR: Seria insano!
RS: Agora que estão em turnê, como vocês se sentem tocando as músicas dos últimos projetos - escritas em um espaço de intimidade maior - para o público dos shows e festivais?
CR: É empolgante! Sempre é empolgante ver a reação das pessoas às músicas novas. Nosso setlist é uma mistura de tudo o que fizemos. A quantidade aumentou, então está ficando mais difícil escolher. Mas os fãs estão pegando as músicas, e é legal ver que ainda acompanham o que fazemos [risos]. Isso traz confiança e nos deixa felizes.
RS: Antes da pandemia, vocês mencionaram a preocupação com o meio ambiente e sustentabilidade. Agora, vemos todas as bandas grandes falando sobre o assunto, não que vocês não sejam uma banda grande…
PD: [Risos] Tudo bem, é a realidade.
RS: Bem, eu estava pensando no Coldplay com as bicicletas na pista para gerar energia durante os shows. Em uma escala menor, fizeram algum progresso? Como estão lidando com a pegada de carbono?
CR: Nossa principal atividade é encontrar com líderes de ONGs e mostrar o trabalho deles durante as turnês. Além disso e das coisas pequenas, como reduzir o uso de plástico e nos certificar sobre o fornecimento de material e venda dos produtos licenciados; tentamos usar nossa plataforma para amplificar o trabalho de outras pessoas, para discutir. Por exemplo, fizemos uma parceria com uma ONG chamada Wilderness International para a proteção das florestas nativas. Coletamos parte do valor dos ingressos de cada show da turnê para doação. É uma luta contínua.
Manter o diálogo, falar sobre o assunto é importante. Mas, em primeiro lugar, somos músicos, somos uma banda, então nosso trabalho está mais nessa área. Não somos tão ativistas - isso está lá, mas não é o principal foco.
RS: Sadnecessary está completando 10 anos em 2023. Como vocês se sentem ao refletir sobre esse álbum após a última década? Estão planejando algo para comemorar?
PD: Nós lançamos versões acústicas do álbum inteiro, que serviu para vivermos uma nova experiência com ele, em uma fase diferente. Foi incrível. Essa era nossa ideia como celebração, um pequeno presente ao álbum e aos fãs pelo aniversário de 10 anos
RS: Ainda sobre Sadnecessary, como vocês se sentem sobre o hit “Stolen Dance”? Ainda gostam de tocar essa ao vivo?
CR: Nós gostamos. Tocamos várias músicas do primeiro álbum, “Stolen Dance” não é a única. Acho que não faz sentido rejeitar nosso trabalho. Essas são as músicas que fizemos até o momento, e ainda estamos fazendo músicas novas. É claro que, nos shows, há uma mistura entre as canções novas e as dos álbuns antigos. Gostamos disso. Os fãs, o público, as plateias também gostam. Por que rejeitar um trabalho que chamou tanta atenção e abriu várias portas para você?
RS: O último show do Milky Chance no Brasil foi em 2018, quando vocês se apresentaram no Lollapalooza e aproveitaram para curtir uma festa, a Mamba Negra, certo?
CR: [Risos] Sim! Aquilo foi muito divertido. Foi uma boa festa. Nos divertimos muito no Brasil. A multidão era insana no Lollapalooza. Era em uma pista de corrida em São Paulo, né? Do camarim dava pra ver tudo. Foi maluco ver tanta gente, principalmente na saída, todos indo na mesma direção;
RS: Vocês têm planos para voltar?
PD: Nada específico. Mas temos vontade! Adoraríamos voltar, porque curtimos muito a última vez. No momento, estamos focados na turnê da América do Norte. No próximo ano tentaremos transformar nossas vontades em realidade [risos].
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