Mu540 brinca com misturas e traz a pista para o EP 4x4

Um dos maiores nomes na cena eletrônica do Brasil atualmente, o DJMu540 lançou nesta semana o EP 4x4 (2024). Cerca de um ano e meio após o lançamento de Um Quebrada Inteligente (2023), em parceria com Kyan, o artista traz ao público uma mistura de funk e house que ganha uma camada a mais com as parcerias com Garimpos, MC Laranjinha, Cave, MC Gw, Bia Soull e Mih.

Em conversa com a Rolling Stone Brasil algumas horas antes do lançamento do EP, Mu540 se mostrou tranquilo com a chegada de um novo projeto às plataformas. "Não fico nervoso, não. Já lancei uma pá de músicas desde o SoundCloud," relembra. "Hoje eu tô bem confortável e meu público já sabe o que esperar de mim." Se a conexão com os fãs tira o peso da preocupação, da parte do músico há o desejo de levar boa música e diversão para quem o ouve - na pista ou no fone.

Mu540 — nome artístico de Murilo Oliveira Santos — no entanto, ficou nervoso ao lançar a faixa "DZ7," que serviu como uma prévia do que seria o EP. "Fiquei ansioso porque esse foi meu primeiro funk com house. O primeiro, primeiro, primero, primeiro que eu fiz desse jeito."

Eu estava tendo uma conversa com o Mochakk, ele estava me falando sobre a dinâmica do house e falou para eu estudar o começo do house, fui estudar. E ele falou como eu ia me divertir fazendo. 

A faixa nasceu dessa conversa com o amigo e colega de profissão — na ocasião, o músico e criador de conteúdo Lucas Vinicius, conhecido como Inutilismo também estava presente. "De resto, os outros sons, eu fui querendo fazer funk com house, mas quis trazer outras ideias do house: UK Garage, 2-step [garage], uma coisa bem de Londres também. E esse da 'DZ7' foi o primeiro que eu quis fazer com uma cara mais Ibiza, uma cara mais da Europa quente.  Quando eu vi que o pessoal aceitou bem, já tem gente sabendo cantar, eu fiquei besta! Fiquei feliz e isso me deu mais calmaria com o resto o EP."

Música é ciência exata

A mistura de funk e house pode parecer inusitada a princípio e Mu540 explica como fazer o resultado soar sempre tão natural: "matemática, mano! Sempre." Ele conta que é preciso saber onde um beat não está para que outro possa ser encaixado. 

"É soma," conta. "Você faz uma soma e tira o que não vai ser tão relevante. Você tem que estudar e saber julgar essas coisas para que o ouvinte ouça como algo natural." Dessa maneira o artista j´´a se aventurou por misturas como o house e o funk, funk e drill, funk e trap. "O funk é uma linguagem muito adaptável, sabe?" E o DJ sabe fazer misturas como ninguém.

Mu540 é um estudioso declarado. Atualmente ele estuda senoides e cossenoides a partir de um material da pesquisadora Sueli da Silva Rossi. "Essa mulher é absurda, tô aprendendo muito com ela a relação de música e física."

Questionado sobre como esse estudo agrega sua arte, o DJ responde: "Quando você ouvir 'DZ7,' passa para a próxima música, você vai sentir saudade do que você estava ouvindo meu. Ouve músicas minhas e ouve a de qualquer outra pessoa, a minha vai estar mais alta." Apesar da limitação de volume das plataformas, o artista usa a ciência para elevar o nível de suas faixas.

Encontro de amigos

4x4 vem sendo trabalhado há cerca de uma ano. Mu540 revela que fez várias músicas e escolheu as melhores. Algumas não vão sair, ficarão reservadas para os sets. "O processo criativo também consiste nisso, em trazer o público para esse mistério. Brincar comigo, mesmo. É como se fosse uma conversa."

Eu gosto de trazer o mistério, o corte seco e a quebra de expectativas, para depois vir um negócio muito legal. Gosto de ser bem interativo com as pessoas, no álbum e fora dele. Minha pessoa é desse pique.

 O artista ainda fala sobre como é feita a montagem de seus sets. "Com muito carinho! Eu penso nas pessoas que vão no rolê, na roupa que elas vão, quanto dinheiro elas vão levar, quanto elas economizaram para ir para o rolê." O artista sabe que se tornar reconhecido faz com que assistir uma de suas apresentações se torna mais caro, e ele quer que fazer o dinheiro dos fãs valer.

"Eu tenho o maior cuidado. Vejo o Instagram da festa, chego uma horas antes, leio a pista. Vejo se a fila tá grande, se os seguranças estão bem e a partir disso a gente vai fazer o set," explica Mu540. "É mais sobre o ambiente e as pessoas que fazem esse ambiente do que eu chegar com o set pronto e as pessoas terem que engolir o que eu vou tocar."

Tem viradas que eu sei que são pontuais, que eu não posso deixar de fazer. Porém, tem coisas que eu tenho que chegar lá e educar o povo. Eu ainda sou um DJ, mano. é meu trabalho. 

No EP Mu540 traz colaborações com Garimpos, MC Laranjinha, Cave, MC Gw, Bia Soull e Mih e para selecionar esses nomes houve um critério inicial: "Todo mundo tem que gostar de mim e eu tenho que gostar deles também. Tem, pelo menos, que ter tirado um rolêzinho juntos." Ser amigo dos colaboradores é um diferencial para o DJ.

Todas as pessoas que o artista trouxe no projeto estão sempre com ele e é desses encontros que saem os trabalhos. "Em todos esses processos, a pessoa me chamou para fazer um som e eu falei: 'Então você faz uma música para mim também,'" revela. "Tudo nessa base de troca."

Mu540 também revela que ainda há colaborações dos sonhos, como o DJ R7, a venezuelana Arca e a islandesa Björk. "Eu e Björk ia ser bagunça," brinca sobre a artista, que já foi flagrada tocando funk em alguns de seus sets. "Björk é malandra, parça. Björk tá com nós, ela é drake."

Visuais em outro nível 

Uma das faixas do EP, "06:40 AM" ganhou um clipe dirigido por Nico Mascarenhas, mais conhecido como Boy Princess. "A gente fez questão de chamar o mano da Oakley, o André Mello," disse o DJ sobre o colecionador de itens da marca. "O maior acervo que eu conheço e todas as peças que estavam lá, na cara dos favelados, eram originais, porque tem que ver que somos valorosos também, que temos a estética de clubber."

Esse clipe mostra que a quebrada também quer estar no rolê e ter acessos. "Os quebradas querem dar rolê, dançar, ser feliz, consumir. Nós gostamos de riqueza, e o clipe mostra isso. Enquadramentos f**a, semiótica, mostra a gente dançando com roupas bonitas e mostra a gente curtindo música eletrônica."

A importância de se ver na tela como protagonista ao lado de Laranjiha e Cave também foi importante para o artista. "Todo mundo que contribuiu vai estar para sempre na minha vida, é obra de arte!", diz Mu540 que ainda conta que o clipe foi aprovado por seus sócios.

Representando o Brasil

Presença cada vez mais frequente em eventos e festivais internacionais, Mu540 sente uma responsabilidade de levar a música eletrônica brasileira para o exterior. "Eu vejo isso num eixo XYZ, é um bagulho cúbico, tá ligado? Porque você tem que prestar atenção no som que vai tocar, como, quando e para quem vai tocar esse som."

Quando falamos em tocar para pessoas de outros países, ele entende que nem sempre essas pessoas têm noção do que é de fato o funk feito no Brasil. "Não sei como eles entendem o funk lá, então eu tenho que comunicar o funk como ele tem que ser comunicado," explica o artista, que faz questão de ser didático e explicar sempre que possível que há uma história e um número incontável de artistas por trás do movimento.

Ídolo e referência

Mu540 tem fãs de diversas idades e origens, para ele a melhor maneira de se comunicar com todas essas pessoas é através do carinho que tem pela música. "Eu tento tirar palavras que eu não gosto, até acordes, coisas que dão gatilhos," explica o artista, que ainda declara que um sorriso vale mais que um verso. 

Apesar disso, ele ainda não se acostumou completamente com o status de ídolo. "A gente é de quebrada, não somos ensinados a ter autoestima desde cedo, então estou aprendendo. E é bem diícil. Você não sabe ser um ídolo, ninguém te falou. Eu não sei ser um ídolo, sei ser DJ, só."

Por outro, o artista que cita KL Jay, Iasmin Turbininha, Badsista e Evehive como suas referências já consegue lidar melhor com esse título. "Referência é mais suave, é menos impactante, porque eu tenho referências também," explica.

Ídolo ou referência, Mu540 mostra com 4x4 que não se conforma com o lugar comum. Como ele mesmo define, o projeto é "forte, sólido, incomparável e inéndito. Está aí, é nosso!" Nos vemos nas pistas.