Encontros especialmente na década de 1960 fazem com que participação de Paul McCartney em novo álbum dos Stones não seja caso isolado
Igor Miranda (@igormirandasite) Publicado em 23/02/2023, às 15h04
A culpa é nossa. Seres humanos adoram histórias de rivalidade - inclusive as inventadas. É por isso que se acreditou, por tanto tempo, que Beatles e Rolling Stones mantinham uma rixa durante a década de 1960, período em que ambas as bandas estouraram.
Mais uma evidência de que não há animosidade entre as partes envolvidas no boato foi apresentada na última quarta-feira (22), com a confirmação de que Paul McCartney participará do novo álbum dos Stones. Ainda sem título ou data para sair, o disco deve ser disponibilizado ainda em 2023. A revista Variety apurou que o baterista Ringo Starr também gravou uma colaboração, mas um porta-voz do grupo disse não ter informação nesse sentido.
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A tal rivalidade pode, talvez, ter existido apenas nas paradas de sucesso. Beatles e Rolling Stones competiram por cada centímetro de espaço assim que se tornaram as maiores bandas do mundo na década de 1960. Uma disputa saudável.
Mas desde que os grupos foram iniciados, suas histórias se cruzam com colaborações e demonstrações de respeito. Ok, vez ou outra rola uma alfinetada - como Paul McCartney definindo recentemente os Stones como uma “banda cover de blues” -, mas geralmente a relação é amigável. Confira abaixo alguns momentos de destaque dessa trajetória cruzada.
Rolling Stones foram criados na cidade de Londres em 1962, dois anos após a fundação dos Beatles. Em maio do ano seguinte, assinaram com o empresário Andrew Loog Oldham, indicado pelo próprio Fab Four de Liverpool. Disponibilizaram no mês posterior seu primeiro single: “Come On”, um cover de Chuck Berry que atingiu o 21º lugar da parada britânica e serviu para oferecer exposição ao então iniciante grupo.
Não demorou até que o segundo compacto da carreira dos Rolling Stones fosse divulgado: “I Wanna Be Your Man”, uma composição de… John Lennon e Paul McCartney. A faixa, que chegou ao 13º lugar do ranking nacional, foi oferecida de presente ao grupo colega. Beatles também gravaram uma versão própria da canção, incluída no álbum With the Beatles. Tanto o disco do Fab Four quanto o single dos Stones chegaram ao mercado em novembro de 1963.
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Embora tenha sido figurinha carimbada nos repertórios dos primeiros shows do grupo de Mick Jagger (voz) e Keith Richards (guitarra) entre 1963 e 1964, “I Wanna Be Your Man” perdeu espaço nos repertórios conforme o desenvolvimento da carreira. Afinal de contas, não demorou até que eles passassem a compor suas próprias canções. Em 2012, a faixa foi resgatada em três ocasiões especiais - algo que ocorreu novamente em 2022, na primeira apresentação dos Stones em Liverpool desde 1971.
Com o passar dos anos, Beatles e Rolling Stones dominaram as paradas do Reino Unido e de vários outros países. Tornaram-se fenômenos mundiais. Estavam tão cientes dos potenciais uns dos outros que chegavam a combinar as datas de lançamento de seus álbuns, para que não se atrapalhassem ou dessem início a uma competição pública nos rankings de sucesso.
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Em 1966, as histórias de ambos voltaram a se cruzar em estúdio com uma participação de Brian Jones, guitarrista dos Stones, na música “Yellow Submarine”, lançada pelos Beatles no álbum Revolver e como “lado A duplo” do single que também continha “Eleanor Rigby”. O músico falecido em 1969 - que voltaria a colaborar com o Fab Four no futuro - colaborou batucando copos no ritmo da canção.
Com um título simbólico, a música “We Love You”, lançada pelos Rolling Stones como single em agosto de 1967, traz backing vocals de ninguém menos que Paul McCartney e John Lennon. Mas calma: o “nós te amamos” que estampa a canção não é direcionado à dupla Beatle.
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A composição de Mick Jagger e Keith Richards era uma forma de retribuir o apoio dos fãs após ambos terem sido detidos sob alegação de posse de drogas, em fevereiro daquele ano. Aliás, o apelo popular foi fundamental para a pena de seis meses e um ano atribuídas a Jagger e Richards, respectivamente, não fossem aplicadas. A sentença do cantor, pego com metanfetamina, foi atenuada; já a do guitarrista, que havia sido acusado de fornecer sua casa para o cantor e outras pessoas consumissem drogas, foi anulada.
Em 1968, os Rolling Stones abraçaram a ideia do cineasta Michael Lindsay-Hogg em promover um “circo do rock and roll” e gravar para lançamento posterior. Nasceu assim o filme musical Rock and Roll Circus, registrado ao vivo nos dias 11 e 12 de dezembro e com uma série de participações.
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É claro que pelo menos algum integrante dos Beatles estariam envolvidos, mas não só eles: bandas como Jethro Tull (à época com Tony Iommi - futuramente do Black Sabbath - na guitarra) e The Who colaboraram, assim como músicos do calibre de Eric Clapton (à época no Cream), Mitch Mitchell (Jimi Hendrix Experience), Taj Mahal e Marianne Faithfull. Do Fab Four, veio John Lennon, que também trouxe a então noiva Yoko Ono.
Lennon, Yoko, Clapton e Mitchell compuseram um supergrupo batizado de The Dirty Mac, tendo também Keith Richards no baixo. Juntos, tocaram a música “Yer Blues”, dos Beatles, e fizeram um improviso batizado de “Whole Lotta Yoko”.
Disponibilizada como parte do último single dos Beatles em escala mundial, em março de 1970, “You Know My Name (Look Up the Number)” traz uma participação póstuma de Brian Jones, que morreu afogado em julho do ano anterior. As gravações rolaram ainda em 1967 e trouxeram o integrante dos Rolling Stones tocando saxofone.
A faixa não chegou a entrar em nenhum dos álbuns de estúdio do Fab Four de Liverpool. Ocupou apenas o lado B do compacto de “Let it Be”. Mal Evans, road manager e assistente pessoal dos músicos, também participou com efeitos sonoros ao gravar-se cavando cascalhos com uma pá. Totalmente segundo a vibe experimental da obra.
As histórias de integrantes dos Beatles e Rolling Stones se cruzaram de outras formas, mais tímidas, em situações que não foram mencionadas acima. Uma delas se deu em 1973, quando Mick Jagger gravou “Too Many Cooks (Spoil the Soup)”, criação do time de compositores Holland–Dozier–Holland, sob produção de John Lennon. A faixa permaneceu inédita por 34 anos, até ser disponibilizada na coletânea solo The Very Best of Mick Jagger. Lendas como Harry Nilsson, Jack Bruce, Al Kooper, Jesse Ed Davis e Jim Keltner participaram da sessão.
De volta a 1967, os Beatles lançaram a música “Baby, You’re a Rich Man” como lado B do single “All You Need is Love” (cuja versão ao vivo trouxe Jagger entre os cantores de apoio). Há quem diga que “Baby…” também traga backing vocals de Mick, visto que o nome do Rolling Stone aparece em uma caixa da fita das sessões. Porém, ele não foi creditado oficialmente pela colaboração.
As trajetórias se encontraram até mesmo em capas de álbuns. Em Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967), uma das várias personagens na arte frontal do disco (mais especificamente à direita) está com a camiseta “welcome the Rolling Stones”. Para retribuir a homenagem, Stones inseriram em Their Satanic Majestic Request (também 1967) imagens dos quatro integrantes dos Beatles, quase como um Easter egg de tão discreto.
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