- Paulinho da Viola (Foto: Divulgação/ Instagram/ @paulinhodaviola)

Paulinho da Viola e o disco que o consolidou como um gênio musical

Lançado há mais de 50 anos, 'Paulinho da Viola' sucedeu os sucessos de 1970, mesclando a tradição e modernidade de um grande sambista

Pedro Só Publicado em 03/02/2023, às 19h30 - Atualizado em 08/02/2023, às 11h10

O texto do jornalista Arley Pereira na contracapa de Foi Um Rio Que Passou Em Minha Vida previu certo: “Todos dizem ser este 1970 o Ano Paulinho da Viola”. Em 1969, já havia rolado algo assim com Jorge Ben, convertido em fenômeno de unanimidade inteligente em todo o país. A música popular do Brasil daquela época era assim, consagrava um gênio após o outro.

Em 1971, atendendo a uma certa “paulinhodaviolamania”, o sambista teve de lançar dois LPs. O primeiro, mandado às lojas em abril, tem apenas 31 minutos. É verdade que não repetiu o sucesso monstruoso de Foi Um Rio…, mas ajudou a consolidar Paulinho como um artista genial a partir de uma rota estética em música e em texto, equilibrando-se entre tradição e modernidade. Não por acaso, ele gravou “Filosofia do Samba”, partido-alto de seu mestre e parceiro Candeia, que dialetiza: “Pra cantar samba não preciso de razão / pois a razão está sempre com os dois lados”.

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Repleta de reflexões incomuns, a trinca de faixas iniciais do LP Paulinho da Viola é de tirar o fôlego. “Num Samba Curto”, com lindo riff orquestrado, surge como um antimanifesto dos sambas filosóficos que se seguirão ao longo do disco, caprichando na metalinguagem para vaticinar: “Ninguém pode explicar a vida num samba curto”.

Pressentimento” (que não é a composição homônima e preciosa de Elton Medeiros e Hermínio Bello de Carvalho), também com orquestração de Lindolfo Gaya entrando no final, é um dos sambas mais lindos e tristes já escritos: “Nosso amor não dura nada / mas há de dar um poema / que transformarei num samba quando a gente se deixar”. Uma consolação que explica a arte — e quase explica a vida.

Capa do disco Paulinho da Viola (Foto: Divulgação)

 

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Depois vem “Para Ver As Meninas”, o samba metafísico por definição, exalando discreta perfeição em melodia sinuosa, relação harmonia e letra e arranjo duplamente ousado. A caixa de fósforos virtuosa de Elton Medeiros sublinha tensões narrativas do texto e do violão até que, do nada, surge um inusitado cravo.

Afeito a possibilidade infinitas, o Paulinho de 1971 arrisca-se ainda em “Vinhos Finos... Cristais”, linda valsa sobre um amor doente, apoiada na poesia também metalinguística de Capinam: “Apenas um jogo de palavras / entre tudo e nada / entre os dentes podres da canção”.

O lado intérprete, que Paulinho abraçou um tanto incrédulo, rende cada vez mais reconhecimento e ganha contornos de expressão autoral a partir das escolhas singulares, pinçadas a dedo. Com a gravação do samba-canção “Coração” (de Alberto Ribeiro, gravada por Sílvio Caldas, em 1938), Paulinho se coloca na linhagem de Orlando Silva e dos maiorais do canto brasileiro.

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Aliás, “Abre a Janela” (de Arlindo Marques Jr. e Roberto Roberti), sucesso na voz de Orlando no carnaval de 1938, é citada na introdução de “Lapa Em Três Tempos”, samba-enredo de Ary do Cavaco e Rubens que a Portela tinha apresentado na avenida naquele 1971. Aqui, Paulinho a recria, à vontade, em meio a um coro típico da Velha Guarda.

Em meio a tantas possibilidades, ele ainda abre um caminho que se provaria fundamental em sua carreira, tirando da sacola o lindo choro “Abraçando Chico Soares”, homenagem a um de seus bruxos fundamentais, o violonista Canhoto da Paraíba. A verdadeira essência de Paulinho da Viola como músico aflora em disco bem ali.

Rolling Stone Brasil Especial 80 Anos de Música

 

Paulinho da Viola (1971) é um dos discos resenhados no Especial 80 Anos de Música, uma edição exclusiva da Rolling Stone Brasil dedicada à Geração 1942, que reúne nomes essenciais da MPB, como Gilberto Gil, Milton Nascimento, Caetano Veloso e o próprio Paulinho da Viola. Já nas bancas físicas e digitais, o especial ainda traz um panorama global dos artistas nascidos neste período. Clique aqui para saber mais. Ouça o disco completo abaixo:

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