No fim da década em que produziu seus discos mais brilhantes, Caetano Veloso ofereceu canções praieiras e lindamente contemplativas
Marcelo Ferla Publicado em 14/02/2023, às 15h51 - Atualizado às 16h25
"Queria que as pessoas soubessem que eu estava vendo umas coisas lindas”, declarou Caetano Veloso ao Jornal da Tarde, sobre o motivo de aparecer de costas na capa do LP Cinema Transcendental, em foto feita em uma praia baiana. Ainda que a imagem sugira que ele estava dando as costas para um Brasil que não o compreendia na década que produziu seus discos mais brilhantes, oferecendo desbunde experimentalista e canções populares, guitarras rascantes e flautas viajandonas, poesia concreta e ternura poética, a força da contemplação se revela maior.
Em 1979, quando os ânimos estavam mais relaxados com o avanço da abertura política, a carreira de Caetano voltou a deslanchar. Em Cinema Transcendental, a sonoridade mais pop que ele e A Outra Banda da Terra estavam desenvolvendo desde que começaram a compor e gravar juntos foi solidificada e vertida numa coleção de canções praieiras e lindamente contemplativas, com forte apelo radiofônico e profusão de estilos, do afoxé ao reggae até o xote.
Caetano abre o disco saudando a “Lua de São Jorge”, que é “lua maravilha / Mãe, irmã e filha de todo esplendor”. Na curva da década de 1970 para 1980, quando se tornaria um quarentão, ele faz sua “Oração ao Tempo”, que diz ser “tão inventivo”, e proclama que “és um dos deuses mais lindos”. Em “Beleza Pura”, evoca a pureza do que é belo e invoca a negritude, dizendo que não é o dinheiro que importa, mas a elegância, a cultura, a pele escura.
“Menino do Rio”, escrita para o surfista Petit, traz ondas mais fortes de melancolia sob o sol escaldante, e arrebata quando Caetano diz que “Eu canto pra Deus proteger-te” – a música se tornou um dos grandes sucessos de 1980, e se alinha a uma tendência de canções tristonhas entre as mais tocadas no Brasil nesse período, como “Amor, Meu Grande Amor” (Angela Ro Ro), “O Bêbado e a Equilibrista” (João Bosco e Aldir Blanc), “Superhomem” (Gilberto Gil), “Admirável Gado Novo” (Zé Ramalho) e “Canção da América” (Milton Nascimento e Fernando Brant). Sempre com tons mais baixos, a nostalgia vem forte em “Trilhos Urbanos”, de “Cinema transcendental / Trilhos Urbanos / Gal cantando o Balancê / Como eu sei lembrar de você”. Na existencialista “Cajuína”, Caetano lembra de Torquato Neto e questiona: “Existirmos a que será que se destina?”. Se ele fosse responder, certamente diria que é para buscar o belo.
DESTAQUES: “Trilhos Urbanos”, “Oração ao Tempo”, “Menino do Rio”.
Cinema Transcendental (1979) é um dos discos resenhados no Especial 80 Anos de Música, uma edição exclusiva da Rolling Stone Brasil dedicada à Geração 1942, que reúne nomes essenciais da MPB, como o próprio Caetano Veloso, Milton Nascimento, Paulinho da Viola e Gilberto Gil, além de panorama global dos nascidos neste ano. O especial impresso já está nas bancas e nas bancas digitais. Clique aqui para saber mais.
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