Sucessor de Movimento Rápido dos Olhos (2022), Portal tem letras intimistas e uma sonoridade muito madura, construída ao longo da carreira de Rashid
Felipe Grutter (@felipegrutter) Publicado em 27/08/2024, às 07h00
Ao longo de uma carreira de quase 20 anos, Michel Dias Costa, mais conhecido como Rashid, apresentou diversas facetas artísticas, seja no rap, batalha de rimas, R&B, entre outros. Agora, com Portal, lançado em 8 de agosto de 2024 nas plataformas de streaming de música, o cantor nos apresenta um lado mais intimista e reflexivo, do Rashid papai.
Em 2022, Rashid e a esposa, Dani Rodrigues, tornaram-se pais de Cairo, homenageado na segunda faixa do novo álbum do rapper, em uma música com batidas mais puxadas para o Lo-fi, com uma letra que relembra o processo de paternidade, do primeiro teste de gravidez a ultrassons e nascimento. Virar pai mudou toda perspectiva dele, tanto na vida pessoal quanto profissional.
“A paternidade coloca a gente para olhar as coisas sobre uma nova perspectiva, [como] tempo, dinheiro, trabalho, família.” afirmou o artista durante entrevista à Rolling Stone Brasil. Como o cantor explicou, “o tornar-se pai é bem diferente do tornar-se mãe, que é uma coisa física.”
O pai fica esperando essa chave, esse ‘cléc.’ É uma coisa que vai acontecendo e uma hora você percebe que olha para tudo de forma diferente.
Agora pai do Cairo, Rashid passa mais tempo em casa, com a família, e precisou ajustar toda dinâmica da rotina, seja das músicas que tocam no ambiente, filmes e séries assistidas, etc. Então, o lado artístico dele absorve essa nova fase, com novos olhares “sobre as coisas e sobre obviamente a minha arte, música e profissão. Fui colocado para repensar tudo e estou adorando!”
Sucessor de Movimento Rápido dos Olhos (2022), Portal surgiu pouco mais de um ano antes do lançamento, em meados de 2023, e o processo criativo foi bem diferente dos trabalhos anteriores. Neste, ele trabalhou com menos produtores e a criatividade teve base nas emoções.
Ao invés de pensar em uma letra e mandar para um produtor em outro canto da cidade ou até mesmo do país, Rashid buscava por conta própria a sonoridade, por meio de loops de piano ou acordes de violão, por exemplo, que sugerisse a emoção que buscava.
“Eu mandava para os produtores esse andamento e aquele loop que mais servia como um norte do arranjo, do lance da harmonia, não necessariamente para nós seguirmos,” relembrou. “Muitas músicas começaram com um piano que loopei e terminaram sem ter uma nota de piano na música atual.”
Para o artista, Portal foi criado a partir daquilo que ele sentia primordialmente, para então passar adiante na cadeia de uma produção de um álbum de rap. “Isso foi fez muito bem para o projeto, porque levou para lugares diferentes.”
A gente não começou com algo pré-determinado, começamos com um terreno vazio. E construímos a partir dali.
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Diferente de Movimento Rápido dos Olhos, que possui uma narrativa complexa com uma jornada época e influenciada pela literatura, Portal vem com um lado que comove a partir da identificação com as letras. Não apenas para quem é ou se tornará pai, mas os assuntos debatidos trazem uma grande reflexão sobre quais passos seguiremos, amores, dinheiro, espiritualidade, frustrações e a beleza da vida.
“Conforme o disco foi nascendo, comecei a perceber que a coisa estava tão entrando no particular, focada no indivíduo e falando de tantos detalhes da minha própria vida que, na verdade, parecia que eu estava falando de todo mundo,” afirmou. ”São coisas pelas quais todo mundo passa, ou a maioria das pessoas passa."
Comecei a perceber que eu tratava de portais pelos quais todos nós vamos atravessar em algum momento, querendo ou não. E não necessariamente só a paternidade.
Já nos últimos discos de estúdio, Rashid começou a tratar da sonoridade de outra forma, com gêneros que se fundiram ao rap na discografia dele, como R&B, pop, soul, entre outros. Uma das principais motivações para isso acontecer é trazer contribuição para a cultura, seja do hip hop ou brasileira.
“São essas coisas que inspiram, motivam e fazem com que eu quisesse atravessar esse portal rumo a uma musicalidade que falasse mais sobre a totalidade do meu eu,” disse. “Não sou só o MC que quer fazer umas punchlines, tá ligado? Não sou apenas cara que fez umas músicas romântica que tocaram no rádio também.”
Uma das forças de Portal são as ilustríssimas colaborações que aparecem ao longo das nove faixas. Cada artista traz a própria característica para tornar cada música única. Melly canta em “Levante,” Lenine aparece em “Depois do Depois,” Lagum participa de “Sem Norte” e Péricles emociona em “Um Tom de Azul.”
Claro, Rashid ficou mais do que satisfeito e feliz com esse quarteto mágico, responsável por trazer um aprendizado ao entender como outras pessoas fazem arte e lidam com um processo criativo, “ainda mais a gente do rap, que aprendeu tudo sozinho, dando cabeçada na parede.”
Como o cantor explicou à Rolling Stone Brasil, a equipe dele buscou fazer gravações presenciais com cada participação na tracklist, com exceção de Lenine, que mandou as linhas de voz e instrumentais à distância. “Observar as pessoas trabalhando é uma coisa que gosto muito,” comentou. “Fomos o Péricles e vou falar o quê? É um mestrado observar ele trabalhando, a forma como ele grava e toda energia dele na música.”
É um cara muito respeitoso, um coração gigante, muito generoso, muito sangue bom, provavelmente top três pessoas mais sangue bom que conheci na vida! Com toda aquela bagagem, toda essa carreira que ele tem e um cara extremamente humilde. E aí quando ele abre a boca você cai para trás. Começou a abrir voz todo mundo chorando, os caras do rap com olho cheio de água.
Sobre Melly, descrita como artista super novinha e aposta da música brasileira, surpreendeu ao criar versos na hora, enquanto o rapper passava a ideia que ele queria para “Levante.” “A sessão de estúdio com ela foi simplesmente absurda, porque é um talento que está chegando e está transbordando. Ela lançou o primeiro disco dela [intitulado Amaríssima], então o impulso e arte estão simplesmente saindo pelas orelhas e olhos.”
Com Lagum, Rashid também se surpreendeu com Pedro Calais, vocalista da banda, sugerindo um refrão totalmente diferente do proposto originalmente: “Ele engrandeceu a música ainda.” Infelizmente, com Lenine, ele não conseguiu acompanhar o processo de gravação, mas se mostrou muito grato por ter a oportunidade de produzir e escrever algo “que uma lenda dessa cantasse.”
E aí eu concordo são grandes forças do portal. Sempre tende a ser assim, porque agregam, porque descansam às vezes o ouvido da pessoa, do artista principal, que está ali cantando [há] mil anos, mas especialmente quando a gente sente que houve uma sinergia ali.
Não apenas com uma sonoridade nova, este novo portal na carreira de Rashid pode levá-lo a novos patamares. O disco ainda pode agradar outros públicos na música, além daqueles que acompanham o cantor desde as batalhas de rima.
Eu acredito que esse disco tem um potencial para ir bem além do rap, porque tem muito do rap do Rashid lá, mas com muitas outras coisas que a instrumentação faz, que as próprias participações fazem, mas que o Rashid por si só também fez, justamente nessa busca de me aproximar das minhas referências, da busca por fazer uma música que é brasileira de fato. De uma forma genuína e autêntica.
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