Um dos maiores ícones do rock nacional, Raul Seixas lançou hits como 'Maluco Beleza, 'Eu Nasci Há 10 Mil Anos Atrás' e muitos outros
Cláudia Boëchat Publicado em 28/06/2022, às 07h00
Nesta terça, 28 de junho, Raul Seixas faria 77 anos. Ele nasceu na Bahia, em Salvador. Era fã de Elvis Presley. “Eu ouvia os discos de Elvis Presley até estragar os sulcos. O rock era como uma chave que abriria minhas portas que viviam fechadas. Usava camisa vermelha, gola virada para cima. As mães não deixavam as filhinhas chegarem perto de mim porque eu era torto como o James Dean,” contou certa vez.
"Olhava de lado, com jeito de durão. Cada vez que eu cumprimentava uma pessoa dava três giros em torno do próprio corpo. Eu era o próprio rock. Eu era Elvis quando andava e penteava o topete. Era alvo de risos, gracinhas, claro," continuou. Eu tinha assumido uma maneira de vestir, falar e agir que ninguém conhecia. Claro que eu não tinha consciência da mudança social que o rock implicava. Eu achava que os jovens iam dominar o mundo."
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Hoje tão admirado, viveu maldito. A começar na escola. “Repeti cinco vezes a 2ª série do ginásio. Nunca aprendi nada na escola. Minto. Aprendi a odiá-la”, afirmou. Mas, quando decidiu entrar numa faculdade, estudou rapidinho e passou num dos primeiros lugares para o curso de Direito. Não levou a carreira adiante. A música já o tinha laçado. Pra se virar, chegou a dar aulas de inglês e de violão. A vida não foi fácil para ele. Praticamente travou uma árdua batalha para gravar cada disco.
Primeiro, criou o grupo Relâmpagos do Rock. Depois foi o The Panthers. Em 1964 fez a sua primeira gravação especial: um compacto com “Nanny” e “Coração Partido”. “Nanny” entrou no álbum O Baú do Raul (1992). Com o The Panthers fazia shows de abertura nas apresentações do pessoal da Jovem Guarda, especialmente nas de Jerry Adriani.
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Hoje parece meio esquisito, mas foi Jerry Adriani quem o arrastou para o Rio de Janeiro e conseguiu que ele gravasse o primeiro LP, Raulzito e os Os Panteras. O cara andava meio desanimado e ganhou fôlego com o disco. Por pouco tempo. O álbum foi mal. Ignorado pelo público e pela crítica, Raul voltou para Salvador.
Na Bahia acabou conhecendo um diretor da gravadora CBS que o convidou para trabalhar com ele, no Rio. Raul aceitou e virou produtor de discos. Porém, acabou aprontando. Quando o tal diretor se ausentou, em viagem ao exterior, Raul resolveu gravar um disco, o LP Sociedade da Grã-Ordem Kavernista – apresenta – Sessão das 10, no qual, além dele, participavam Sérgio Sampaio, Miriam Batucada e Edy Star. Claro que o diretor da gravadora ficou furioso, demitiu Raul e fez o disco “desaparecer” do mercado.
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Decidiu então ser popular. Passou a usar brilhantina no cabelo e casaco de couro. Incentivado por Sérgio Sampaio, inscreveu-se no Festival Internacional da Canção de 1972. As músicas eram “Eu Sou Eu, Nicuri É o Diabo”, interpretada por Lena Rios e Os Lobos, e “Let me Sing, Let me Sing”, por Raul. Fez sucesso e ganhou contrato com a Philips. Voltou a ser produtor. Tempos depois, gravou “Ouro de Tolo” em um compacto e, aí sim, estourou.
Foi em nesse ano, 1972, que Raul conheceu Paulo Coelho. Sabe como? Viu uma matéria sobre discos voadores publicada na revista A Pomba, assinada por Augusto Figueiredo. Gostou e resolveu conhecer o autor do artigo. Era Paulo. Começou uma forte amizade e muitas histórias.
Em 1973, Raul lança o seu primeiro álbum solo: Krig-Há, Bandolo!. Dizem que isso era o grito do Tarzan e que significa “cuidado, aí vem o inimigo”. Sei não... Bem, depois que Raul se juntou a Paulo Coelho veio a “era Crowley” com o disco Sociedade Alternativa.
Ambos eram seguidores do famoso bruxo Aleister Crowley, o mago inglês que, além de ser cultuado por inúmeros roqueiros internacionais, se relacionava com pessoas como Fernando Pessoa. Crowley é polêmico até hoje por sua doutrina e suas loucuras.
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Fato é que Raul e Paulo entraram nessa onda e até criaram um manifesto chamado “A Fundação de Krig-há”. A tal Sociedade Alternativa ganhou sede, documentos, etc. Tudo conforme pregava Aleister Crowley: “Faze o que tu queres, há de ser tudo da lei”. O disco fez sucesso.
A ditadura militar começa a se irritar com essas “maluquices” de Raul e ele vai passar um tempo nos Estados Unidos. Deixa gravado Gita, que é lançado e estoura. De volta ao Brasil, grava um clipe e é convidado pela Globo para fazer toda a trilha sonora da novela O Rebu.
Para Raul, a vida ia bem. Se envolvia cada vez mais no mundo do esoterismo e de seitas secretas. Resolve interpretar a obra de Crowley e gravar Novo Aeon. Fracasso. De novo.
Raul não desiste e grava Há 10 Mil Anos Atrás. Sucesso. Paulo Coelho pula fora dessa onda. Acaba a parceria. “Apresentei as drogas a Raul, as sociedades secretas e essas coisas todas. Será que fiz bem? Raul entrou de cabeça nisso tudo. Em dado momento, eu disse: ‘Chega, parei’. Mas Raul continuou, uma escolha absolutamente consciente, e ninguém pode julgá-lo por isso”, declarou Coelho à Rolling Stone Brasil.
A seguir, vem o LP O Dia em que a Terra Parou, em 1977, e é detonado pela crítica. Contudo, algumas músicas fazem muito sucesso - “Maluco Beleza”, “Sapato 36” e a faixa-título. Não o suficiente para lotar shows de Raul. Gravou, então, Mata Virgem. Também não foi visto como espetacular.
Raul fica doente. Pancreatite é coisa séria e ele vai se cuidar numa fazenda no interior da Bahia. De lá vai para São Paulo. Depois de Jerry Adriani, é a vez de Jair Rodrigues dar uma força a Raul. É lançado Por Quem os Sinos Dobram, em parceria com Oscar Rasmussen e, voltando à CBS, lança Abre-te, Sésamo, em 1980. Também não foram sucesso reverberante. A gravadora cisma que Raul tinha de gravar um disco sobre Lady Diana. O cara se recusa e... sai fora. De novo.
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Doente e se cuidando pouco, sua situação vai se agravando. Entra em depressão. Então, a convite de João Lara Mesquita, diretor do Estúdio Eldorado, grava, em 1983, o álbum Raul Seixas. Na Som Livre, grava Metrô Linha 743. Com dois discos na praça, brinca que se deu mal porque acabou fazendo concorrência consigo mesmo. Mas ele não está bem. Sua saúde está cada vez mais abalada. Raul sai de cena algumas vezes, indo para a Bahia se recuperar.
Em 1985, seu fã-clube oficial faz algo inédito: produz e distribui o disco Let me Sing my Rock and Roll. Depois de batalhar muito, Raul consegue outra gravadora interessada em seu trabalho, a Copacabana. Grava Uah-Bap-Lu-Bap-Lah-Béin-Bum! e o sucesso o abraça de novo. Só que o cara não estava bem. Foi ficando quieto e entediado.
Marcelo Nova, vocalista da banda Camisa de Vênus, aparece para reanimá-lo. Ele volta a fazer shows com o amigo e o resultado é o disco A Panela do Diabo, que só foi lançado dois dias antes da morte de Raul. Antes disso, em 1988, lança A Pedra do Gênesis, que falava da controvertida Sociedade Alternativa e, mais uma vez, nada de sucesso.
Raul Seixas morreu em 21 de agosto de 1989 em casa, sozinho, como Amy Winehouse e muitos outros. A empregada o encontrou ao chegar à casa dele de manhã. A causa da morte foi a tal pancreatite.
“Raul Seixas é mais atual que nunca. Vemos, nesse caso, a tragédia como força que consolida a carreira de alguém. Ele não precisaria ter morrido da maneira que morreu, mas repito que foi sua escolha. A tragédia consagra - infelizmente. Assistimos ao Jim Morrison no passado, e assistimos ao Michael Jackson agora. A imprensa fez tudo para destruir Michael Jackson e, quando ele morreu, a comoção popular foi gigantesca”, analisou Paulo Coelho, em artigo escrito para a Rolling Stone Brasil. Raul viveu sua lenda.
*Texto adaptado do original "Raul Seixas nascia 'há 67 anos atrás'", de Cláudia Boëchat, publicado em 28/06/2012
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