Sob o comando de Noam Murro e roteiro de Zack Snyder, filme não se justifica e falha ao pouco explorar a profundidade dos personagens
Pedro Antunes Publicado em 07/03/2014, às 10h13 - Atualizado em 16/03/2014, às 13h56
Se talvez Frank Miller tivesse conseguido terminar de escrever a HQ na qual 300: A Ascensão do Império seria baseada, talvez a continuação da batalha entre gregos e persas escapasse do limbo das sequências cinematográficas injustificadas. Em vez disso, aqueles que se dispuserem a ir ao cinema, a partir desta sexta-feira, 7, assistirão a um filme que se perde entre litros de sangue computadorizado e testosterona aos montes.
Rodrigo Santoro dá humanidade ao vilão Xerxes em 300: A Ascensão do Império.
O novo longa se passa antes, durante e depois da famosa Batalha de Termópilas, na qual o corajoso Rei Leônidas (Gerard Butler) e seus 299 soldados marcharam em direção aos milhares do exército de Xerxes, o Deus-rei persa vivido por Rodrigo Santoro. Cronologicamente confuso, o longa sequer justifica a escolha do seu subtítulo, A Ascensão do Império. Afinal, que ascensão e de qual império estamos falando aqui?
Em 2008, quando Miller ainda tentava criar a continuação da adorada HQ 300, o novo filme se chamaria Xerxes e colocaria o personagem de Santoro no centro da ação, mostrando como ele deixaria de ser um príncipe persa em busca de vingança. Isso até aparece na telona, mas não passa dos os primeiros 20 minutos de filme - os melhores, diga-se de passagem. No restante da ação, o grandalhão Xerxes é deixado de lado, um bom personagem desperdiçado após a decisão de que ele não mais seria o protagonista desta continuação.
Os holofotes, repentinamente, são colocados sobre Temístocles (Sullivan Stapleton) e Artemísia (Eva Green). O primeiro é um guerreiro ateniense - sim, depois de um filme sobre a garra dos espartanos, os produtores decidiram centralizar o longa nos “burocratas” atenienses, como eram chamados por Butler e companhia em 2006. Temístocles é o responsável por evitar uma primeira invasão persa comandada pelo Rei Dario, pai de Xerxes. Foi também do arco dele que saiu a flecha que atravessou o coração do líder persa e deu início à busca por vingança de Xerxes – e não se atenha a esse detalhe, logo o roteiro parece esquecer que esta havia sido a justificativa para a guerra.
Na outra ponta, como principal antagonista do novo 300, está Artemísia, uma grega que é capturada por outros gregos, transformada em escrava sexual e depois abandonada. Ela é, então, acolhida, treinada e militarizada pelos persas. Artemísia busca a própria vingança - desta vez contra todo o povo grego. Se no início ela aparenta ser uma espécie de feiticeira, sussurrando palavras ao ouvido de Xerxes, em pouco tempo a personagem revela também ser um comandante qualificadíssimo para comandar uma frota de navios persas.
Na falta de um herói carismático - Stapleton está longe de ser um novo Butler -, Artemísia assume o papel de destaque. Quando menos percebemos, já estamos torcendo para que ela derrote logo os gregos e dê um bofete no rosto de Xerxes para que ele comece a falar direito, sem aquela voz soturna.
O derramamento de sangue que vem a seguir se mostra um tanto injustificado, já que ninguém parece saber ao certo porque está empunhando a espada. Partimos então para uma sucessão de corpos mutilados, explosões, gritos de guerra e sermões modorrentos de Temístocles sobre honra, capazes de dar saudade das broncas da professora de geografia do primário.
Brasileiros em Hollywood: artistas que, como Santoro, investem na carreira fora do país.
O diretor Noam Murro segue os passos de Zack Snyder, que caiu fora do projeto e assina apenas como produtor e como um dos responsáveis por um roteiro bastante preguiçoso. Seguir Snyder é o maior erro e também maior acerto do novo diretor. Murro comanda as câmeras com reverência ao trabalho do antecessor, desacelerando o tempo para dar mais impacto às cenas de ação, como no filme anterior, no qual havia a sensação de realmente se estar acompanhando uma história em quadrinhos em movimento.
É preciso admitir a boa qualidade e quantidade de pancadaria, que pode fazer valer o ingresso para quem realmente quer assistir às cenas grandiosas e sangue esparramado. Ainda assim, e por causa disso, falta novidade ao longa.
A nova produção parece não ter entendido que o sucesso do filme, de 2006, se deu por algo muito maior do que músculos e bravos soldados. Havia ali um discurso coerente, o sacrifício de 300 homens para conseguir dar tempo à Grécia para se reerguer, um laço de companheirismo entre os personagens capaz de dar profundidade, cérebro e coração aos guerreiros.
O novo 300 traz mais um embate entre Davi (gregos) e Golias (persas) - ainda que, desta vez, ele se passe no mar –, mas banaliza a ação pela ação, sem qualquer justificativa que valha. O pequeno (ou gigantesco) detalhe que diferencia as duas produções é, no fundo, a existência de uma boa história a ser contada.
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