- Edição 82 Rolling Stone Brasil

A origem do mito Bruce Lee: das ruas do ópio às luzes de Hollywood

Há 40 anos, morria o maior lutador do cinema e nascia o mito: Bruce Lee não precisava de efeitos especiais para cativar plateias. No Sul da China, investigamos a origem dele e desvendamos seu grande mestre: Yip Man

Edgardo Martolio Publicado em 20/07/2021, às 18h31 - Atualizado em 27/11/2021, às 10h30

Na década de 1970, quando os blockbusters ainda estavam longe de Hollywood, um homem que sabia voar extasiava os espectadores com efeitos especiais naturais. Puro marketing visual que Bruce Lee sabiamente criou. A verdadeira luta que ele aprendeu foi outra, oposta a toda essa acrobacia que encantava os olhos. Pois o kung fu prega a economia de movimentos – nada de piruetas ou extravagâncias. O lutador pode se defender durante horas e, quando ataca, machuca para valer. Mas esse comedimento não é impactante para um filme de ação: mais se parece com uma dança do que com uma briga.

O que Bruce Lee fez foi coreografar cinematograficamente a precisão dos golpes. A indústria do cinema fez o resto. A técnica que ele criou e levou para as telas – a jeet kune do – foi uma pirotecnia da sétima arte. Mas ele foi um lutador de vários estilos – e de todas as artes –, como nenhum outro. Bruce Lee foi o melhor. E, mesmo não sendo exatamente um grande ator, conquistou plateias de todo o planeta. Morreu no auge da fama, com apenas 32 anos, em 20 de julho de 1973.

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AFP PHOTO

De origem chinesa, Bruce Lee chegou ao mundo em 27 de novembro de 1940, ano do dragão no calendário chinês - e era chamado de Siu-Lung, que significa "Pequeno Dragão." Nasceu em São Francisco (Califórnia), quando os pais viajavam em turnê com um circo oriental. Mas, morou na China durante a complicada adolescência, em Foshan e na vizinha Hong Kong, cidades-chave na formação dele. Foi nesta última que seu grande mestre, Yip Man, o ensinou o wing chin (ou kung fu), a arte marcial que o tornaria vencedor naquelas ruas violentas e, mais tarde, no cinema mundial.

Quando criança, Bruce Lee participou de alguns filmes nos Estados Unidos, acompanhando o pai artista. Adolescente, aprendeu a lutar com maestria. Adulto, uniu ambas as paixões e se transformou em uma estrela que batia recordes de bilheteria a cada filme: cinco, incluindo um póstumo. Mas, se houve um lugar fundamental na vida dele, foi Foshan. E a pessoa decisiva nessa história foi o mestre Yip Man.

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Foshan é uma cidade tranquila na agitada periferia sudoeste da gigante Guangzhou, província de Guangdong, no sul da China. De qualquer estação de metrô do centro até a de Zumiao não se gasta mais do que meia hora. É interessante pensar que esse trecho de 20 quilômetros foi percorrido muitas vezes pelo maior astro que o Oriente já teve. O trem atravessa diferentes bairros que mostram como a China mistura dois mundos tão opostos: o do frenesi moderno e o da paciência milenar.

Mais de meio século antes de Bruce Lee viver em Foshan, nasceu Yip Man. E a vida logo lhe mostrou a face mais impiedosa, fazendo dele um durão ao estilo chinês. Basta dizer que sobreviveu à ocupação japonesa, na Segunda Guerra, supostamente lutando sozinho contra 22 caratecas japoneses. Essa lenda é lembrada pelos locais e serve para entender o quanto Yip Man a se defender. Sim, a se defender, pois esse é o fundamento básico de todas as artes marciais orientais. E, claro, também do wing chun que ele cultuou e fez conhecido em todo o mundo graças ao melhor aluno que teve, Bruce Lee.

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Depois de migrar para Hong Kong, onde se transformaria no melhor Sifu (mestre) de sua disciplina, Yip Man voltou para Foshan. Para entender Bruce Lee, é preciso conhecer Yip Man e, para dimensionar o mestre, é necessário entrar na alma de Foshane de sua hsitória de mais de 5 mil anos. Para os ocidentais, Bruce Lee é um oriental que dava golpes arqueando-se como um bambu ou um chinês de muito sucesso no cinema. Mas, antes da fama, havia outro Bruce Lee.

Foshan é uma cidade reconhecida como um ninho das artes marciais. O Templo Ancestral da família Chen era o lugar dos sacrifícios aos antepassados e também de estudos. Desde 1949, o local é um museu, mas já foi onde Yip Man ensinou sua arte. O templo - dedicado a Beidi, deus que tinha poder sobre as águas de Guangdong - foi construído em 1894 com dinheiro doado pelo clã Chen. Trata-se de um complexo de 3.500m² que já foi incendiado e reconstruído. Comnecido como Palácio Oriental da Arte, é uma relíquia, patrimônio cultural de Foshan. E é tudo o que sobrou do grande mestre Yip Man, além de seu legado.

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Éramos três ocidentais saindo da estação de metrô de Foshan sem saber se tínhamos de ir à direita ou à esquerda, até que três taximotociclistas nos levaram até nosso destino. No parque do templo-museu, diversos detalhes chamam a atenção. Mas nada atrai mais o olhar do que praticantes de kung fu, muitos deles com espadas e totalmente alheios aos turistas. Alunos e professores seguem o legado de Yip Man e a coreografia se integra com naturalidade ao parque.

Alguém disse que Bruce Lee era uma mistura do dançarino Rudolf Nureyev e do campeão norte-americano de boxe Cassius Clay. O russo tinha movimentos que pareciam pouco humanos de tão graciosos. E os golpes de Clay não eram deste mundo. Nos filmes, Lee voava com plasticidade de borboleta, capaz de derrubar três gigantes com um único movimento. Todas as artes marciais podem ser usadas com violência em caso de necessidade, mas não tês essa finalidade. Flutuar, trabalhar o corpo para uma viagem interior, explorar nossos lados desconhecidos, melhorar a sensibilidade, achar a si mesmo e percorrer a alma são fundamentos, maiores do que a autodefesa. Elevar-se. Nunca cair, como explicava Yip Man ao dedicado pupilo.

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Antes de ser ator, Bruce Lee era um atleta muito disciplinado, obsessivo com força e elasticidade: anotava diariamente os resultados dos treinos (de 8 horas diárias, 56 horas semanais, 224 mensais) para compará-los e melhorar constantemente. Realizava exercícios de calistenia e corria 16 km por dia. Fazia abdominais e escolhia um único golpe diário para aperfeiçoamento de técnica. Vejo pessoas de 70 anos praticando com a própria sombra, fazendo movimentos de kung fu, mas não vejo ninguém voando como Bruce Lee. Claro, aqui ninguém está filmando.

Não por acaso, Foshan é famosa pelas cerâmicas artesanais: a cidade surgiu, ao norte do rio Pérola, a partir da descoberta de três estátuas de Buda durante a dinastia Tang (618-907 d.C.). Mas essa terra cantonesa já foi o porto mais importante da China nos tempos áureos e tumultuados. Continua sendo um grande porto, mas sem as gangues que mudaram a vida dos chineses por 200 anos. Gangues ainda influenciadas por comportamentos herdados do início do século 19, quando a China vendia chá, porcelana e seda para o Ocidente, especialmente para os ingleses. A Inglaterra, com uma balança comercial desequilibrada, evitou falir vendendo ópio aos chineses.

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Primeiro, os súditos da rainha infiltraram o ópio proveniente da Índia, durante anos, até criar o vício na população chinesa: 1 grama de ópio é o suficiente para provocar dependência química nos usuários. Uma vez que a China importava 4.500 pacotes de 15 quilos da droga por ano, quantidade que quadruplicou até 1835 e chegou a 450 toneladas em 1839. Ou seja, 1 grama para cada um dos 5450 milhões de habitantes que a China tinha na época.

O governo chinês, para defender a economia e a saúde popular, proibiu o consumo de ópio em 1839, perseguindo vendedores e prendendo traficantes. A Inglaterra, insatisfeita com a medida chinesa, declarou guerra à China duas vezes. São as chamadas Guerras do Ópio - uma entre 1839 e 1842 e outra, um pouco mais longa, de 1856 a 1860. As consequências delas pertencem à história que nos leva a Bruce Lee.

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A China dos bairros perigosos que os filmes mostraram era resultado da antiga realidade de Cantão. Em Guangzhou e arredores - como Foshan - o consumo e a venda de droga criaram máfias que tomaram as cidades, dominaram bairros e aterrorizaram ruas - as mesmas por onde transitou Bruce Lee. Foshan era isso: uma paz chinesa e celestial de um lado da calçada; e o inferno importado pelos ingleses do outro.

Com a Revolução Chinesa, 100 anos atrás, o governo comunista começou a combater a cultura de Cantão, do sul, incluindo a dos mestres das artes marciais. Muitos foram executados, outros enfrentaram o exército antes de serem mortos e alguns fugiram ou se esconderam. Narram-se histórias de mais de mil soldados invadindo templos para aniquilar os mestres. Yip Man fugiu para Hong King. E foi aí que Bruce Lee apareceu na vida dele.

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Aos 13, Bruce Lee sofreu uma brutal surra de uma gangue na saída do La Salle College, humilhação que o levou a procurar Yip Man. Relata-se que não foi aceito no primeiro dia por causa da atitude arrogante. Humilde, se reapresentou e começou como seu discípulo. Logo mostrou ser o melhor, apesar de só treinar inicialmente com o colega Wong Shun Leung, porque os demais se recusavam a dividir aulas com um "meio americano." Nessa época, Lee não apenas aprendeu kung fu (dizem que em três dias já sabia lutar), mas também praticou boxe, jiu-jítsu, shotokan, savate, esgrima, judô, tae kwon do, wrestling, hapkido, aikido e rai chi chuan. E, assim, como lutou todos os estilos, dançava todos os ritmos: em 1958, venceu um concurso do caribenho chá-chá-chá. Fazia com o corpo o que desejava.

O jovem Bruce havia aprendido disciplina no La Salle College de Hong Kong, onde agora observo rapazes de 13 ou 14 anos no pátio, ensaiando marchas, aprendendo a desfilar e a se comportar. A sensação é de que não estou em uma escola, mas em uma academia militar. O menino da Califórnia estudava lá não só por causa da rigidez disciplinar, e sim porque aquela era uma das poucas escolas secundárias da áreas que usava o inglês. Foi onde Bruce descobriu a filosofia, área na qual se graduou quando voltou aos Estados Unidos.

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A uma hora de carro, em Jun'an, ergue-se o Bruce Lee Paradise, um parque gigantesco cercado por mais de 20 colinas verdes, lagos, garças e... decadência. O que já foi um centro de diversões, passeios turísticos e grandes eventos, hoje continua aberto ao público, mas quase não é visitado nem mantido. As salas do Museu Bruce Lee são melhor convervadas; ali estão armas, livros, cartazes, roupas e outras recordações que permitem ingressar no mundo do ídolo. Surpreende a estátua de bronze de Lee, com 18,8 m de altura, criada pelo escultor Cao Chongen. A casa da família, mal conservada, não reflete a dimensão do astro.

Pergunto o motivo desse esquecimento a Li Him, um visitante do parque vindo de Xangai. "Bruce Lee filmava no exterior," explica, "e não era visto e conhecido no país, devidos às restrições às importações culturais ocidentais durante a Revolução da China." Um ancião a seu lado agrega que "só Mao o via e conhecia: li que ele pediu uma cópia do filme A Fúria do Dragão para assistir privadamente em Pequim; mas nós, chineses, o amamos." Um testemunho que coincide com o de Donnie Yen, protagonista de O Grande Mestre 2 (2010). "Bruce Lee já é nosso, ele é como Confúcio... faz parte da cultura que vamos abraçar." É uma verdade, pelo menos na região de Cantão. Hoje, 40 anos após sua morte, todos conhecem Bruce Lee, que aos poucos vai se unindo ao mestre Yip Man no topo do hall da fama das artes marciais.

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De todo modo, no calçadão de Tsim Sha Tsui - versão asiática da Calçada da Fama de Hollywood -, que homenageia astros como Jackie Chan e Je Li, a figura mais procurada pelos 10 milhões de visitantes anuais ainda é a da estátua dourada de Bruce Lee. Ali, o mito continua vivo, brilhante e bem lembrado.


A não muito conhecida história de Yip Man, o mestre de Bruce Lee

Foto: AFP PHOTO

Bruce Lee é fruto de várias concordâncias. Esteve quando e onde tinha de estar, no momento certo e no tempo correto. Uma dessas felizes coincidências foi ter aprendido a lutar com Yip Man. O mestre, aos 13 anos, segundo a lenda, foi aceito como o último aluno de Chan Wah-Shun, outro mito nas artes da defesa pessoal, e Ng Chung-Sok. Quando chegou ao ápice, passou décadas ensinando quase tudo o que sabia para Bruce Lee.

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A biografia oficial diz que em 1908, quando tinha 15 anos, Yip Man mudou-se para Hong Kong com a ajuda de um parente. De acordo com os dois filhos, ele mudou de vida após presenciar um policial batendo em uma mulher estrangeira. A história diz que o policial tentou atacá-lo quando interveio em defesa da mulher, e que Yip Man usou suas técnicas. A cena teria sido vista por um homem mais velho, que perguntou qual arte marcial era aquela. O velho pediu a Yip Man que lhe mostrasse as primeiras duas formas – Sil Lim Tao e Chun Kiu. Ele gostou do que viu. E então desafiou Yip Man a enfrentá-lo. O homem de mais de 50 anos venceu, e Yip Man percebeu que tinha muito a aprender. Foi convidado para treinar Chi Sau (uma forma que envolve o ataque controlando a defesa). E então descobriu que aquele homem era companheiro de seu mestre, Leung Bik, filho de outro mestre seu, Leung Jan, para quem tinha prometido que jamais ensinaria os golpes, por temer que fossem usados para o mal. Treinou e, com 24 anos, Yip Man voltou a Foshan com as habilidades de wing chun tremendamente aprimoradas.

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Conhecido por ser uma pessoa modesta e sempre alegre, Yip Man passou a ser admirado pelo jeito simples, prova de que o verdadeiro wing chun amadureceu o seu modo de pensar. Esse era outro motivo pelo qual era querido na cidade: Foshan era um centro de artes marciais, e ele era um mestre sem igual. Tanta admiração fez com que recebesse o cargo de chefe de polícia da cidade, que aceitou com entusiasmo. Na corporação, ensinou a arte para vários subordinados, e também a amigos e parentes deles.

Mas os japoneses invadiram a China e Yip Man, buscando tranquilidade, voltou para a casa em que morou, na aldeia Kwok Fu. O ano era 1937. Sua fama chegou aos ouvidos dos japoneses, que, achando serem racialmente invencíveis, o testavam. Lutavam com ele e perdiam. Queriam que Yip Man lhes ensinasse a técnica, mas ele se negou e acabou com todos os bens confiscados pelo exército imperial japonês. Por sorte não foi executado. Sua mansão foi transformada em quartel-general. Teve de viver em extrema pobreza e, como só sabia artes marciais, viu-se obrigado a quebrar a promessa que fez para Leung Bik e começou a ensinar wing chun para chineses que buscavam defesa contra o exército japonês. A esposa adoeceu nesse período e morreu, deixando Yip Man sozinho para cuidar dos quatro filhos.

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Ele só retornou a Foshan depois da guerra, novamente como policial. No final de 1949, depois que o Partido Comunista venceu a guerra civil chinesa e tomou a cidade, sendo ainda um oficial Kuomingtang (do Partido Nacionalista Chinês, o que hoje governa a dissidente Taiwan), ele decidiu fugir sem a família para Hong Kong, que na época era colônia britânica.

Com poucos recursos, abriu uma escola de artes marciais. As vitórias dos alunos ajudaram a reforçar a reputação de Yip Man. Em 1967, ele e alguns dos alunos fundaram a Kong Ving Tsun Athletic Association Hong, que prosperou. A frase mais conhecida dele é uma espécie de homenagem não declarada a Bruce Lee: “É difícil para o aluno escolher um bom professor, mas é ainda mais difícil para um professor pegar um bom aluno”. Em 1972, Yip Man morreu de câncer na garganta por causa do fumo. Mas, nas três décadas de sua carreira, ele estabeleceu um sistema de treinamento para o wing chun que se espalhou pelo mundo, graças à fama do principal pupilo.

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A lenda de Yip Man passou a ser mais amplamente conhecida a partir de 2008, quando foi lançado o elogiado O Grande Mestre, protagonizado por Donnie Yen, dirigido por Wilson Yip e com cenas de luta coreografadas pelo ator e especialista em cenas de ação Sammo Hung (que trabalhou com Bruce Lee em Operação Dragão). O filho mais velho de Yip Man, Ip Chun, aparece no longa, além de ser o principal consultor do roteiro. Em 2010, foi lançada a segunda parte, que retrata o início do contato de Yip Man com Bruce Lee. O sucesso do filme ajudou a alavancar uma mania que gerou inúmeros longas sobre o mestre. Mais recentemente, o diretor de arte Wong Kar-wai (de Amor à Flor da Pele) elaborou uma visão mais particular sobre o mito em The Grandmaster, ainda sem previsão de estreia no Brasil. Nele, o galã Tony Leung interpreta Yip Man.


A morte de Bruce Lee comoveu o mundo

Texto de Luis Maluf

Foto: AFP PHOTO/Dan Levine

Em 20 de julho de 1973, por volta das 16h, Bruce Lee e o produtor Raymond Chow foram à casa da atriz taiwanesa Betty Ting Pei, em Hong Kong. Eles queriam lhe propor um papel no próximo longa-metragem de Lee, Jogo da Morte. Às 19h30, Lee reclamou de dor de cabeça. Betty deu-lhe analgésicos que continham aspirina e relaxante muscular, e Lee foi se deitar. Por volta das 21h, o produtor ligou para perguntar por Lee, mas a atriz contou que não conseguiu acordá-lo. Minutos após chegar ao hospital, foi declarado morto, aos 32 anos. A causa oficial foi edema cerebral. O funeral, em Hong Kong, foi presenciado por 20 mil pessoas. Depois, o corpo foi levado para Seattle (Estados Unidos), onde foi enterrado no cemitério Lake View. Em 1993, Brandon Lee, filho de Bruce, foi baleado, aos 28 anos, enquanto gravava uma cena do filme O Corvo. O acidente ocorreu na cena em que o protagonista é baleado: em vez de munição de festim, havia uma bala de verdade em uma das armas. Brandon foi enterrado ao lado do pai.

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Conheça as origens do kung fu e do jeet kune do, artes marciais dominadas por Bruce Lee

Texto de Luis Maluf

Foto: Arquivo

A lenda conta que o Wing Chun foi criado por uma mulher: Ng Mui, uma dos cinco monges sobreviventes da destruição do templo Shao Lin, conhecidos como Os Cinco Antecessores. Hoje, milhões de pessoas treinam wing chun ou wushu, como é chamado em alguns lugares. A herança ruim dessa arte são as lutas de rua, que ainda acontecem para “testar estilos”, o que fere a filosofia marcial e o legado do mestre Yip Man.

O wing chun se distingue “pela economia de movimentos e utilização da estrutura óssea”. O wushu moderno foi criado por Mao Tse-tung nos anos 50, como uma contribuição para a saúde do povo. As bases dele foram os estilos do Shaolin do Norte, mais parecido com o praticado por Bruce Lee. Mao mudou bastante o esporte para transformá-lo em uma atividade mais saudável e apta para todos, não enfatizando o combate, mas o desenvolvimento atlético, capaz de demonstrar o espírito de luta (e não a luta em si). A Federação Internacional de Wushu conta com 77 membros de cinco continentes e, em 1999, foi reconhecida pelo Comitê Olímpico Internacional (COI).

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Já o jeet kune do foi uma variação criada pelo próprio Bruce Lee, em Oakland (Califórnia), em 1963. Lee lecionava na academia de luta que comandava, a Wing Chun, mas a comunidade chinesa ficou enfurecida ao saber que uma escola norte-americana ensinava técnicas milenares a não orientais. Então, enviou Wong J. Man, um professor de artes marciais, para uma luta com Lee. Com ele, um controverso ultimato: se Wong vencesse, Lee fecharia as escolas nos Estados Unidos. Foi uma luta privada com poucos espectadores – entre eles estava a esposa de Lee, Linda Emily. O que se sabe é que o desafio foi vencido por Bruce Lee em menos de três minutos. Após o episódio, Lee decidiu aprimorar os conhecimentos nas artes marciais tradicionais chinesas. O motivo: apesar de ter batido facilmente o adversário, ele acreditava que três minutos havia sido tempo demais.

Lee deixou de lado anos de estudo e prática de wing chun e saiu em busca de novas lutas, inclusive o boxe, com o objetivo de desenvolver e aperfeiçoar um estilo próprio. Ele decidiu desenvolver um novo sistema com ênfase em “praticidade, flexibilidade, rapidez e eficiência”. Começou a usar métodos diferentes, como treinamento de peso para ganhar força, corrida de resistência, alongamento para a flexibilidade, e outros que foi adaptando. Lee pretendia se livrar da abordagem oficial das artes marciais e alegava que seu estilo de luta era mais do que uma grande mistura de estilos tradicionais. Segundo ele, era o “estilo sem estilo”, que se adaptava a cada pessoa e a cada corpo.

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Este texto foi originalmente publicado como matéria de capa da edição 82 da Rolling Stone Brasil, em julho de 2013. Naquele ano, a morte do ator completava 40 anos. Lee compartilhou uma das capas duplas da revista com Johnny Depp, quem completava 50 anos. Veja mais da edição aqui.

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