Tropa de Elite está em cartaz em SP e no Rio desde esta sexta, 5
Por André Rodrigues Publicado em 08/10/2007, às 17h16 - Atualizado em 10/12/2007, às 15h48
Uma citação do psicólogo social norte-americano Stanley Milgram - sobre como o comportamento do indivíduo é determinado pelas circunstâncias - invade a tela. É a senha para que finalmente Tropa de Elite - o filme mais esperado do ano no Brasil - comece a ser exibido nos cinemas de São Paulo e Rio de Janeiro a partir desta sexta-feira (5). No resto do país, entrará em cartaz apenas no dia 12 de outubro (atingindo cerca de 250 cópias em todo o circuito).
Para além das polêmicas que envolveram o longa-metragem dirigido por José Padilha (Ônibus 174), Tropa de Elite é um esmerado exemplar de gênero - o de filme policial. Lá está o incorruptível e carismático capitão Nascimento (Wagner Moura), do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) do Rio de Janeiro. Antes que perca mulher, filho, e o que resta de sua sanidade, pretende formar um discípulo para assim cair fora de uma roda-viva de violência e atrocidades.
Casualmente, surgem dois fortes concorrentes ao posto. André Matias (André Ramiro) representa a inteligência. Estudante de direito, negro, luta contra preconceitos (internos e externos) para se destacar como policial militar nas ruas cariocas. Neto (Caio Junqueira) é só coração, uma espécie de pitboy com nobres sentimentos. Encarregado de gerenciar uma oficina da PM, faz de tudo para consertar carburadores e denunciar a corrupção que corrói cada engrenagem do sistema.
Durante uma visita do papa, em 1997, esses três destinos irão se cruzar, promovendo novos laços de amizade - além de deixar vários corpos estendidos no chão das favelas fluminenses.
"Parece gringo"
Tropa de Elite talvez se torne um marco por abrir as portas do cinema para o filme policial contemporâneo brasileiro. Da mesma maneira que Cidade de Deus, dirigido por Fernando Meirelles, inaugurou uma nova abordagem da miséria nacional e reafirmou de vez o jargão "cidade partida" (popularizado pelo escritor e jornalista Zuenir Ventura), Tropa... instaura com inteligência e capacidade técnica uma abordagem dramática e cinematográfica da violência policial tupiniquim.
Não à toa, quem assistiu às cópias piratas insiste em afirmar que o filme "é sensacional porque parece gringo". Desde o início, o espectador se sente confortável, em terreno conhecido, tão repisado por Hollywood. Na telona, parece impossível não imaginar que o capitão Nascimento é finalmente a versão brasuca de alguns heróis norte-americanos recentes, como Jack Bauer (que tortura por nobres causas em 24 Horas); William Costigan (atormentado pelo sistema em Os Infiltrados); e até mesmo Martin Riggs (o cínico policial de Mel Gibson que atira como se estivesse num campo de paintball em Máquina Mortífera).
Há méritos de sobra para transformar Tropa de Elite num blockbuster (quem sabe o maior do cinema nacional recente). Uma trilha-sonora - Titãs, REM, Tihuana, O Rappa - empolgante, cenas de ação bem conduzidas (câmera de Lula Carvalho e edição de Daniel Rezende) e uma grande estrela: Wagner Moura, em atuação já clássica.
Fórmula de sucesso
Mas vale a pena prestar atenção na trinca que assina o roteiro - baseado no livro Elite da Tropa. Talvez aí esteja o segredo do sucesso, numa equação de estilos e audácia.
Há José Padilha, o diretor - quase formado em física e exímio observador dos espaços - de 39 anos, que diz fazer cinema como ciência, interessado em mostrar fenômenos da natureza humana; depois, Rodrigo Pimentel, que já atuou como PM e foi do Bope durante seis anos, um sujeito que "viveu aquilo que escreve", capaz de dar autenticidade a gírias e frases policiais; e Bráulio Mantovani (Cidade de Deus), o mais notório contador de histórias do audiovisual brasileiro, potente organizador de tramas, flashbacks e personagens. Eis uma fórmula que vem agradando milhares de pessoas e o produtor Harvey Weinstein (ex-Miramax) - fundamental para levar o resultado para patamares hollywoodianos.
O que de fato espanta é só agora o cinema nacional da chamada "retomada" realizar com tanta eficiência um filme policial em um país tão... policial. Certamente, outros "Tropa Qualquer Coisa" irão aparecer - inclusive na TV, com as emissoras brigando para descobrir quem ganhará alto com esse novo filão.
Fato: sem dar bola para articulistas que tacharam o filme de fascista ou para citações de Stanley Milgram ou do filósofo Michel Foucault - também lembrado no filme -, os camelôs já saíram na frente, vendendo supostas continuações e utilizando muito bem as brechas do sistema para faturar alguns reais.
Nunca na história recente deste país um filme com pinta de Hollywood revelou tanto sobre as circunstâncias que determinam o comportamento de certos indivíduos no Brasil.
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