Música esnobada por um dos grandes nomes do sertanejo moderno Gusttavo Lima foi na contramão da temática sofrida - e, por isso, deu muito certo
Pedro Antunes Publicado em 27/05/2019, às 19h15
A história, a essa altura, você já sabe: a ideia da música "Jenifer", sucesso absoluto no carnaval de 2019 na voz de Gabriel Diniz, veio quando um grupo de amigos, reunidos, viram uma garota se aproximar deles, abraçar um dos rapazes e ir embora. "Quem é essa? É a sua namorada?", perguntaram. "Não, é do Tinder", o moço respondeu.
Junior Lobo, um dos compositores do coletivo Big Jhows, formado por Lobo, Thawan Alves, Thales Gui, Leo Sousa, Allef Rodrigues, João Palá, Fred Wilian e Junior Avelar, ficou com a ideia de incluir o aplicativo de paquera Tinder em uma canção.
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Esses coletivos são comuns na música atual. São grupos de compositores unidos para criar canções, possíveis hits, para vendê-los com exclusividade a nomões do pop de rádio. Neste caso, Junior Lobo demorou para mostrar a nova criação "Jenifer" para os outros integrantes do grupo porque ela estava na contramão do que faziam.
O sertanejo atual é fundamentado em duas características principais. As canções se movem com o ritmo de uma bachata mais suave, um ritmo latino de percussão marcada e toques de metais bem levinhos. O encontro dos ritmos, do sertanejo com a bachata, funciona bem para quem quer dançar agarradinho, sem muitos solavancos.
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Além da bachata, é preciso entender, principalmente, em qual ponto estava o termômetro da temática das músicas do sertanejo naquele 2018, quando "Jenifer" surgiu. A música vivia um movimento pós-sofrência e da pós-pegação. O que funcionava para artistas como Gusttavo Lima, que chegou a comprar os direitos de "Jenifer", mas acabou desistindo, eram canções de "dormir abraçadinhos debaixo do edredom".
Gusttavo Lima, que havia estourado com músicas que cantavam a festa, sempre em busca de um "tche-tche-rê-rê" (da música "Balada"), havia mudado sua temática, passou a chorar bicas com saudade da ex. O movimento foi seguido por outros nomões do sertanejo moderno.
Onde ele encaixaria, neste novo repertório, a moça que encontrou no Tinder?
"Jenifer", cujos direitos para gravá-la com exclusividade foram comprados por Gabriel Diniz depois de ouvir do próprio Gusttavo Lima que a canção não funcionaria para o seu repertório, é anti-sofrência, mas também não é de total pegação.
Vejamos a letra. "O nome dela é Jenifer, eu encontrei ela no Tinder / Ela não é minha namorada, mas poderia ser", diz o refrão chicletíssimo da faixa, a narrativa da música se explica antes disso. Trata-se de uma cena entre um ex-casal depois de um relacionamento dar errado.
O personagem em questão, que encontrou a tal "Jenifer do Tinder", está com o novo date quando dá de cara com a antiga namorada. Ela pede explicações sobre quem é a moça que está co ele e, assim, começa a música.
"Você não paga as minhas contas /
Já não é da sua conta o que é que eu tô fazendo aqui /
Mas mesmo assim vou te explicar", diz a ponte, o momento pré-refrão.
A música é esperta ao encontrar um fonte ainda não bebida, em escala massiva, no sertanejo atual: o momento pós-término, de início de novas descobertas amorosas. Acertam na veia do que é pop ao acrescentar o Tinder, embora o app de relacionamentos já não esteja mais tão em voga assim.
"Jenifer" não se enquadra na pegação, porque ao que a letra indica, o eu-lírico não está atrás de noites malucas regadas à cachaça e amores pueris. A tal Jenifer, afinal, poderia se tornar, eventualmente, namorada dele.
Gabriel Diniz encontrou em "Jenifer" uma forma de furar a parede dos sertanejos no sudeste para o seu forró. Ele já tinha uma carreira solidificada no meio, com um sucesso grande no Nordeste, uma história na banda Cavaleiros do Forró, e parcerias com Wesley Safadão e Jorge & Mateus.
Diferentemente dos sertanejos, contudo, GD, como era chamado, não tinha nada a perder ao apostar em "Jenifer". A música, para a carreira dele, só abriria mais uma porta.
E erao que ele queria, afinal, quando saiu do Nordeste em busca dos compositores do sertanejo, em Goiânia. Para ele, "Jenifer" seria (e foi) a sua virada. Ele encontrou nela o forronejo perfeito para aliar seus focais alongados e sofridos do arrocha ao ritmo menos frenético do sertanejo.
E assim que Gabriel Diniz "casou" com a "Jenifer": com um hit que chegou ao topo das paradas no Brasil no início de 2019 e chegou ao Carnaval consagrada como a música mais representativa da folia deste ano.
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