Ivan Lins - Divulgação

Atração do Rock in Rio, Ivan Lins fala sobre carreira, direitos autorais, parcerias e polêmicas envolvendo seu nome

Neste domingo, 15, o músico se apresenta no palco Sunset, dedicado aos encontros sonoros, ao lado de George Benson

Antônio do Amaral Rocha Publicado em 13/09/2013, às 14h36 - Atualizado às 14h43

Durante o Fest Bossa & Jazz Pipa 2013, a Rolling Stone Brasil conversou com Ivan Lins. Ele se apresenta no Rock in Rio neste domingo, 15, ao lado de George Benson, no palco Sunset, dedicado aos encontros sonoros. Abaixo, o músico fala sobre seus shows, os muitos anos de carreira, direitos autorais, parcerias e polêmicas envolvendo seu nome.

Porque a ausência de notícias sobre as suas atividades?

Eu sou uma pessoa muito recatada. Eu procuro viver exclusivamente da minha música. Eu, exatamente neste momento, estou trocando de assessoria de imprensa. Eu vivo exclusivamente da minha música e não sou muito de alardear as coisas que estou fazendo. Eu não sei se é porque no começo da minha carreira eu passei por momentos de constrangimento, quando no programa Som Livre Exportação, em 1971, ia haver uma eleição dentro do programa para escolherem o maior destaque e o maior destaque iria fazer um show solo no Olympia de Paris, uma temporada de presente. E como eu era um dos líderes do programa, a TV Globo acabou me causando um constrangimento de eu anunciar a minha própria vitória para uma plateia enorme e eu levei uma vaia absurda e acabei não tendo o show no Olympia. Não aconteceu por causa da vaia, mas por outros motivos e ali foi uma jogada de marketing da emissora. Depois desse constrangimento eu jurei nunca mais... Eu falava muito que talvez eu fosse ganhar, e muita gente me dizia “Olha Ivan, não fica falando, pode ser que você acabe não ganhando”. Acabei ganhando, mas foi tão constrangedor, eu ganhei, mas não levei, então eu resolvi parar com esse negócio de falar das minhas coisas, fiquei meio traumatizado. Essa foi a primeira pancada que eu tomei. Eu comecei a tirar o time de campo. Hoje eu sou um cara assim: se as pessoas não chegarem para mim e perguntarem, eu não falo. Não vou para a imprensa, não mando recado pra jornal, não digo pra ninguém o que estou fazendo, eu vou e faço. Recebo prêmios lá fora e ninguém sabe que eu recebi. Eu sou um ermitão mesmo, eu vivo da minha música.

Você atualmente mora no Brasil ou no exterior?

Muita gente pensa que eu moro lá fora, mas moro no Brasil, morei em Los Angeles só nove meses, em 1992. A lenda é que eu ainda estou lá, ou que estou morando na Europa. Tudo é lenda, mas, na verdade, isso acontece por culpa minha, porque eu sou um pouco fechado.

Mas você tem focado a sua carreira no mercado internacional?

Eu tenho uma carreira internacional, mas eu não falo dela, aliás eu falo muito pouco dela.

E essa carreira é diferente da carreira que você desenvolve aqui no Brasil?

Ela é diferente, mas ela não me rende o que me rende a minha carreira aqui. Eu sobrevivo do Brasil.

Mas o prestígio lá fora é grande?

Tenho muito prestígio, mas ainda assim o meu prestígio lá não me dá condições de viver só com aquilo. Eu tenho muito nome, sou hiper conhecido pela classe musical, não há músico internacional que não me conheça, inclusive alunos de conservatórios. Eu dou clínicas em conservatórios e escolas de músicas, sempre lotadas. Nos meus shows lá fora, mais de 50% da plateia é formada de músicos. Apesar de tudo isso, eu ainda não tenho condições de sobreviver lá fora. Quero dizer, até teria, morando fora a proximidade ajuda muito, especialmente na Europa, mas eu sou nascido na muda da Tijuca, eu sou enraizado, eu tenho raízes no Brasil e é muito difícil me tirarem daqui, eu tenho adoração por este país, apesar da indignação por esses políticos.

”Crucrecorroró”, para citar você mesmo?

É, cruz credo que coisa horrorosa, mas eu não consigo largar o Brasil. Já tentei várias vezes e não deu.

Você vive e sobrevive do Brasil, e aqui a música, de maneira geral, está passando por problemas que envolvem o Ecad. Como você se posiciona com relação a isso?

Em primeiro lugar, eu sou de uma geração que teve muita exposição através da mídia aberta, nos anos setenta e nos anos oitenta. Eu ainda hoje tenho um nome muito forte no Brasil, consigo trabalhar e sobreviver fazendo espetáculos, não vendo mais CD, não toco mais em rádio e não apareço na televisão, mas consigo pagar as minhas contas todas com shows. Eu sou um privilegiado porque sou de uma geração antiga, evidentemente. Para a geração que ainda quer fazer música de qualidade e que veio depois dos anos oitenta a situação é diferente.

E quanto ao Ecad?

Em relação ao direito autoral houve uma queda muito grande na arrecadação, principalmente para a música de qualidade, porque a execução dela diminuiu bastante nos grandes veículos, televisões e rádios também. E ainda mais com toda essa problemática do Ecad que não é um órgão transparente, é um órgão sob suspeita, sob a intervenção de uma CPI, com vários processos contra os seus integrantes. Hoje a classe, a parte mais influente intelectualmente conseguiu aprovar uma lei para uma modificação na forma que o Ecad terá que se comportar a partir de agora e isso envolve também as sociedades arrecadadoras.

E essas mudanças são positivas?

As modificações são muito boas [para a classe].

Mas tem uma parcela da classe musical que é contra.

Os artistas que são contrários a ela são basicamente os ligados às sociedades arrecadadoras e artistas que não sabem nada de direito autoral, que são levados na conversa.

Mas tem gente do primeiro time da música brasileira que também não concorda com as mudanças.

Gente de primeiro time que é levado na conversa porque não entende de direito autoral.

Especialmente os letristas...

Não entendem de direito autoral ou então trabalham em sociedades arrecadadoras, fazem parte das diretorias, têm vários deles. As sociedades formam o Ecad. O Ecad é formado por nove sociedades arrecadadoras. O Brasil é o único país no mundo que tem nove sociedades, por brigas internas, igual à esquerda brasileira.

Você chegou a criar uma associação nos anos oitenta, a Sombras.

A Sombras não era um sociedade, era uma associação de combate ao estado vigente e nós, através da luta da Sombras, conseguimos modificar a arrecadação do direito autoral no Brasil. Criou-se o CNDA, o Conselho Nacional de Direito Autoral, um órgão normativo que criou o Ecad.

Hoje há uma massificação, através da TV, da música de consumo e a considerada boa música deixou de ser veiculada.

Isso tem a ver com o novo consumidor, as classes C, D e E.

Mas quando a sua música foi exposta à classe C ela foi bem aceita em outros tempos.

Foi sim totalmente absorvida.

Porque hoje é diferente? Por que mudaram as correlações sociais?

Não é só isso, é que hoje 90% das rádios estão nas mãos de políticos, que usam as rádios para se elegerem. E quem elege esses políticos são essas classes sociais. Não é a elite, a elite corresponde a 10% dos votos.

Mudando o viés da conversa, quem é o guitarrista oficial de sua banda hoje?

Eu trabalho com três guitarristas, quando um não pode, entra outro. São três exímios guitarristas. O titular chama-se Leonardo Amuedo, que eu considero o melhor atuando no Brasil, mas é só uma opinião pessoal. Claro, que têm outros maravilhosos como Ricardo Silveira que eu adoro, mas não toca comigo. Os outro que tocam comigo são o João Castilho ou o João Gaspar, excelentes.

O Brasil têm muitos bons guitarristas.

Temos excelentes guitarristas. Trabalhei com Mário Manga, maravilhoso, com Fernando Caneca, outro grande que trabalhou comigo muitos anos. Aliás, ouvi há pouco uma gravação de um show que eu fiz em São Francisco, que eles querem lançar agora lá nos Estados Unidos, onde o Caneca toca, é um negócio assustador. Eu não ouvia isso desde 1994. Então, eu tive sorte de trabalhar com grandes, lembro-me do Heitor TP, radicado na Califórnia que hoje trabalha em trilhas pra cinema. Sempre tive grandes guitarristas trabalhando comigo. Luiz Brasil foi outro deles.

Que tipo de música você ouve?

Eu ouço de tudo. Escuto muito jazz, escuto muito os pianistas, principalmente Keith Jarrett, Herbie Hancock, que são os meus favoritos. Dos guitarristas, eu gosto realmente é de John Scofield e Pat Metheny. Gosto também dos primeiros discos do George Benson. Para mim, tirando essa parte comercial, considero-o um dos maiores guitarristas do mundo.

Estar na estrada faz você conhecer e topar com muita gente.

É, mas é muita coisa, é muita informação e não dá para acompanhar tudo. Em São Paulo tem um grupo de que eu gosto muito que é o 5 a Seco, são muito bons violonistas e guitarristas que fazem um trabalho de alto nível - e são garotos ainda, atraem um público jovem. O 5 a Seco para mim é uma luz no fim do túnel.

Fale sobre sua participação em festivais de música pelo Brasil.

Festivais como este aqui de Pipa [Fest Bossa & Jazz Pipa 2013], e não só esse, vários festivais pelo Brasi,l são espetaculares e é uma coisa que me deixa extremamente esperançoso e feliz. Este festival, que faz parte de uma série de eventos que são feitos no Brasil, é um evento muito democrático, libertário, aberto, criativo e muito esperançoso.

Há pouco li uma resenha tipicamente de direita que fazia uma crítica aos artistas que se enriqueceram fazendo música de protesto. O artigo idiotizado ainda dizia que a música “O Amor É o Meu País” era uma música que fazia apologia do país sob a ditadura. Você sofreu com esse tipo de leitura na época?

Na época eu sofri um patrulhamento. Teve um jornalista do Pasquim que teve que me pedir desculpas publicamente. Aconteceu que essa música foi classificada no 5º Festival Internacional da Canção da Rede Globo, em 1970. As trinta classificadas foram anunciadas em maio, pouco antes de o Brasil ser campeão mundial. Junto às classificadas vinha um comentário escrito por um jornalista conhecido. Sobre “O Amor É o Meu País”, o comentário dizia: “música de altíssimo nível, letra lírica e inspirada”. Veio a Copa do Mundo e o Brasil foi tricampeão e daí vieram os slogans da ditadura: “Ninguém segura este país”, “Brasil, um país que vai pra frente”, “Ame-o ou deixe-o” etc. Os militares assumiram a palavra país e se apossaram dos nossos símbolos, bandeira, hino. Daí veio o festival em outubro do mesmo ano, para o meu azar. E apareceu no festival a música “O Amor É o Meu País”. Os patrulheiros vieram todos pra cima de mim, inclusive o tal jornalista que escreveu elogiando a música antes. Essa música não tinha nada a ver com política, era uma balada. E eu vim tomando cacete e ficava calado. A Elis Regina escreveu duas páginas em uma publicação da época, no jornal nanico do Tarso de Castro, me defendendo. O Aldir Blanc também saiu em minha defesa, dando porrada em todo mundo. Mesmo o Pasquim ainda tentou me pegar em uma entrevista e aí um dos entrevistadores, o que havia elogiado e depois criticado, estava lá. Eu fiz ele se retratar e exigi que ele botasse isso no O Globo e no Jornal do Brasil.

Esse episódio te atrapalha ainda hoje?

Não, não me atrapalha. Hoje eu morro de rir, mas na época eu não gostei. Qualquer patrulhagem marcava você para o resto da vida. Tem uma coisa que me deixou magoado sim, foi com a Leila Diniz que morreu logo depois. Ela disse em uma entrevista que tinha horror de quem fazia músicas tipo Dom e Ravel e Ivan Lins. Fiquei numa tristeza, eu adorava ela, mas ela viajou na maionese. Acertou em Dom e Ravel e errou em mim. Essa foi a única dor que ficou porque não deu tempo de ela consertar.

Fale sobre o seu último disco, Amorágio que parece ter sido pouco divulgado.

Saiu pela Som Livre, na verdade, é um produto meu licenciado para a Som Livre. Eu acabei de sair da Som Livre, depois de um contrato de dois anos e pouco. E o trabalho da gravadora foi muito discreto. Eu entrei para eles distribuírem os meus discos. Eles prometeram criar um segmento de qualidade e depois do quinto padre eu vi que não ia rolar nada. Nestes dois anos e meio eles colocaram três CDs no mercado, um deles que foi gravado na Holanda.

E quantos discos você já tem gravado, incluindo estes que não foram lançados no Brasil?

Tenho 43 discos, dois novos, um na Alemanha outro na Itália. Eu gravo muito, saio gravando porque não tenho mais o que fazer [risos]. No Brasil, o que eu vou fazer? Gravo, não vende! E daí aparece um convite tipo “quer fazer um disco em Cingapura?”. Eu digo que quero. O Amorágio é um disco de sonoridades, ele é uma homenagem a Somos Todos Iguais Nesta Noite, que foi o disco que solidificou a minha parceria com o Vítor Martins. Foi um disco que eu fiz pegando diferentes sonoridades brasileiras, e neste eu abri também o meu leque, tem xote, tem balada. Abri o meu leque porque eu sou de uma geração que mexia com todas estas influências brasileiras. É um disco mais para o Brasil, bem brasileiro, não é um disco para o mercado de fora.

E as suas parcerias são bastante marcadas. Vítor Martins, Paulo César Pinheiro, Ronaldo Monteiro de Souza e, de repente, aparece uma parceria até inusitada com o Chico Buarque.

É uma parceria recente de duas músicas, “Sou Eu” e “Renata Maria”, aquela que deu a confusão com o Chico, o caso da fotografia na praia. Todo mundo dizia que a mulher era a Renata Maria e ligavam lá em casa querendo saber se a pessoa da fotografia era a Renata Maria...

E como se deu essa parceria inusitada?

Por amizade, por contato, eu me dou muito bem com o Chico. Eu jogava futebol lá no campo dele, até me arrebentar todo. E tinha essa coisa de o Chico dizer “manda lá uma pra mim”. Mas eu nunca mandava, até porque eu trabalhava muito com o Vítor Martins. E houve um período que o Vítor parou de escrever, quando terminou a gravadora Velas e a gente ficou meio desencantado. Foi quando eu peguei o Celso Viáfora e o Paulo César Pinheiro. Daí eu encontrei o Chico e perguntei se poderia mandar uma pra ele. Mandei a “Renata Maria”, cantando e imitando a voz dele, e depois a “Sou Eu”, que é uma homenagem a “Quem Te Viu, Quem Te Vê”. Falei: “Se você não faz, eu faço”. E ele me disse: “Mas você me imitando é uma merda!” [risos]. A letra é de uma picardia bem do Chico.

Uma vez você disse que cantava num tom muito alto, estava forçando a voz, e procurou ajuda para cantar de maneira mais confortável.

Foi isso mesmo. Fui orientado pela Maria Lucia Valadão, que me foi indicada pela Fafá de Belém. A minha voz estava indo pro saco porque eu cantava tudo acima e ela me explicou que eu estava cantando fora da minha tessitura: “você é tenor e está cantando como um soprano”. Daí eu comecei a botar os tons mais abaixo e a minha voz pode aguentar mais tempo.

Mas isso não tinha a ver com a sua opção de canto próximo da soul music?

Ivan – É, mas também porque eu era muito influenciado pela voz do Milton Nascimento e da Elis Regina. Eu queria cantar lá onde eles cantavam. Foram as minhas grandes influências.

George Benson + Ivan Lins no Rock in Rio

15 de setembro, às 19h30

Palco Sunset

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