Com direção musical de Pedro Baby, CD e DVD ao vivo Baby Sucessos – A Menina Ainda Dança foi gravado no Rio de Janeiro
Luciana Rabassallo Publicado em 29/05/2015, às 16h51 - Atualizado às 19h54
Caminhar com Baby pelas ruas do Itaim Bibi, bairro em que está instalada a redação da Rolling Stone Brasil , é uma grande aventura. Faminta, após enfrentar uma tarde intensa de entrevista e gravações, a cantora procura desesperadamente por uma porção de castanhas-do-pará nas prateleiras de uma pequena padaria. Quando encontra o petisco, vai logo rasgando o saco e dizendo: “Isso aqui faz um bem danado”.
Em questão de minutos, a cantora atravessa a rua e encomenda uma porção de falafel com babaganoush em um restaurante árabe. “Tenho algumas restrições alimentares. Eu não como farinha”, explica, antes de acrescentar: “Não gosto de ficar muito tempo sem comer. Isso não faz bem para a saúde”. Com os cabelos tingidos de roxo e ostentando uma echarpe e um chapéu – ambos de pelúcia cor-de-rosa -, Baby logo atraiu atenção do dono do estabelecimento.
“Você é a Baby Consuelo?”, indaga o homem de cabelos brancos. “Sou eu sim, meu amor”, responde a risonha artista. Enquanto aguardávamos o preparo da especiaria, a cantora conversou com o fã sobre a mudança do nome artístico: “Eu já fui Baby Consuelo, sou também a Baby do Brasil. É praticamente a mesma coisa”. “Você sabia que esses restaurantes de comidas típicas internacionais são gerenciados por pessoas vindas do nordeste. Eu sou baiano. Nosso tempero é muito melhor”, afirma o homem.
A essa altura já estamos na calçada. Entre acenos dos pedestres e cumprimentos vindos dos carros – todos devidamente correspondidos, Baby concorda: “A Bahia é mesmo maravilhosa. Bem que você poderia vender acarajé”. Enquanto caminhamos pela rua, a artista me conta que não vê problema nenhum em ser reconhecida e abordada pelos fãs: “Eu gosto de gente. Adoro conversar. Fico feliz em ver o carinho que as pessoas ainda nutrem por mim”.
Após uma temporada dedicada à música gospel, Baby voltou aos palcos por intermédio de uma proposta irrecusável do filho, o guitarrista Pedro Baby. “Quando ele [Pedro] me fez o convite, precisei conversar com Deus. Fui aos Estados Unidos, fiz um grande jejum e esperei uma resposta”, conta. O "show abençoado", que está na estrada há dois anos, foi registrado no CD e DVD ao vivo Baby Sucessos – A Menina Ainda Dança, que chegou às lojas em abril.
Enquanto dedilha uma guitarra e fala a respeito do amor pelo instrumento, a artista explica que o projeto surgiu por conta do público: “Comecei a notar que a plateia rejuvenesceu. Eu fiquei 15 anos afastada dos palcos e, quando voltei, encontrei uma geração ávida por me ouvir. Durante os shows eu vejo famílias inteiras. Geralmente são três gerações, dos avôs aos netos. Isso é extremamente gratificante”.
Gravado em 31 de janeiro de 2014 no Rio de Janeiro, o registro traz os maiores clássicos da carreira de Baby do Brasil. Com direção musical de Pedro Baby, o DVD é uma viagem através da trajetória da cantora, passeando tanto pelos grandes hits lançados ao lado dos Novos Baianos quanto pelas canções da carreira solo – quando assinava como Baby Consuelo. A escolha do repertório, como ela faz questão de frisar, foi feita por Pedro: “Ele fez uma lista incrível de músicas. Eram faixas que ele gostaria de me ver cantar. Acho que isso se estende também aos mais novos, que ainda não tiveram a oportunidade de me ver interpreta-las ao vivo.
Conexão com a nova geração
A presença de jovens em shows de nomes consagrados da música brasileira - como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Gal Costa -, é visto pela cantora como o amadurecimento e resgate da cena na qual ela e os colegas fomentaram nas décadas de 1960 e 1970. “Apesar de nós termos vivido coisas incríveis e com muita alegria, eram tempos duros. Havia a repressão da ditadura. Acredito que estávamos à frente do nosso tempo. As músicas que produzimos naquela época eram de difícil compreensão para a maioria das pessoas. Poucos conseguiam sacar o que estávamos fazendo. Nem mesmo os críticos musicais entendiam. Atualmente os jovens têm plena consciência do que significam as letras e, apesar de não terem vivido isso, sabem o quanto a repressão é prejudicial.”
Entre um gole de água ["sem gelo, para não comprometer a minha voz"] e uma foto agarrada com uma guitarra, Baby conta que está impressionada com a quantidade de festas temáticas de música brasileira que pipocaram no Rio de Janeiro. “A alegria dos jovens me contaminou. É incrível vê-los dançando grandes sucessos da Tropicália, todos com os rostos pintados e roupas coloridas”, conta, antes de questionar: “Aqui em São Paulo isso também acontece?”.
Novos Baianos
A curiosidade da artista acaba mudando o foco da conversa. Ao ouvir que uma das edições de maior sucesso da festa Pilantragi, na capital paulista, foi dedicada aos sons dos Novos Baianos, ela não consegue conter o entusiasmo. De imediato, ela responde a indagação seguinte: “A possibilidade de uma reunião dos Novos Baianos, pelo menos para mim, nunca foi descartada. O que nos falta é um projeto bem elaborado, que apaixone a todos em um sentindo técnico. No lado musical seria facílimo. Temos muitos anos de convivência. Quando nos encontramos e tocamos juntos tudo vem à tona. Seria difícil dizer não”.
Com 40 anos de estrada, Bernadete Dinorah de Carvalho Cidade, também autointitulada “popstora”, explica que guarda com muito carinho tudo o que viveu ao lado dos companheiros dos Novos Baianos. Evangélica convicta ["mas, nunca careta!"] há mais de duas décadas, Baby começou sua trajetória artística aos 14 anos, quando participou de um festival de música em Niterói, cidade na qual nasceu.
Proveniente de uma família de classe média alta, ela saiu de casa três anos após a primeira experiência artística, rumo a Salvador, levando na bagagem o sonho de “ser reconhecida”. Na Bahia, Baby conheceu o compositor Paulinho Boca de Cantor, o músico Moraes Moreira, o baixista Dadi, o guitarrista Pepeu Gomes e o poeta Luiz Galvão. À época, formaram uma das bandas mais reverenciadas da história da música brasileira: Novos Baianos. Após o lançamento do primeiro álbum, É Ferro na Boneca (1970), a trupe mudou-se para um sítio alugado no subúrbio do Rio, onde foi concebido o clássico Acabou Chorare (1972) – eleito em 2007 pela Rolling Stone como "o maior registro da música brasileira de todos os tempos" - e concretizado o romance entre Baby e Pepeu.
O casal trouxe ao mundo seis filhos: Sarah Sheeva, Zabelê, Nãna Shara, Pedro Baby, Krishna Baby e Kriptus Rá. No auge do regime militar, a família e sua banda vivam de forma quase anárquica, alimentando polêmicas e os sonhos dos adolescentes reprimidos pelo sistema. “Eu não me arrependo de nada. Continuo sendo a mesma pessoa hoje. Tenho uma família linda. Inclusive, um dos meus filhos vai se casar em breve. A única coisa diferente em mim é a relação que estabeleci com Deus e a forma como eu encaro o mundo”.
As novas divas da música
Para Baby, o atual momento político que o Brasil atravessa, caracterizado por uma iminente recessão, por manifestações que varrem as ruas das principais capitais do país e pela intolerância que toma conta na internet, é um campo fértil para a criação artística. "Os jovens sabem que não terão de enfrentar a polícia e a repressão por defenderem aquilo que acreditam. O cenário de instabilidade, contudo, é ótimo para fazer florescer novos talentos e desafiar os que já fazem música."
Ao citar as cantoras de destaque no Brasil, a artista fala com carinho de Céu, Márcia Castro e Blubell, mas tece grandes elogios ao conteúdo produzido por Tulipa Ruiz. "Ela é admirável. Fizemos muitas coisas juntas em 2014. Eu admiro muito as letras que ela compõe e a questão de ter uma banda em família. Isso é algo com o que me identifico. Eu vejo na Tulipa uma ousadia, que é muito parecida com a minha. Ela tem esse ingrediente."
Ainda sobre política
As posições políticas adotadas pela presidente Dilma Rousseff não agradam a artista: "Quando ela foi eleita pela primeira vez, houve um entusiamo por ser a primeira mulher a comandar o Brasil. Posteriormente, as atitudes acabaram nos desagradando. Por isso, na minha opinião, a Marina Silvia seria a melhor opção. Ela é incrível. Uma pessoa que saiu da pobreza extrema e aprendeu a ler e a escrever. Infelizmente, não foi dessa vez", finaliza.
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