O próprio estilo característico do cineasta de contar histórias privou A Ascensão Skywalker de elementos vitais a um longa de Star Wars
Vinicius Santos Publicado em 11/05/2020, às 07h00
Sim, Star Wars: A Ascensão Skywalker (2019) foi um fracasso. Por mais opinativa que essa frase possa parecer e qualquer fã que tenha gostado do filme tem todo direito de continuar gostando, o que deveria ser a conclusão épica de uma das maiores sagas cinematográficas teve a pior bilheteria da nova trilogia.
Com US$ 1,074 bilhão ao redor do mundo, A Ascensão Skywalker não chegou nem perto de superar os US$ 1,321 bilhão de Os Últimos Jedi (2017), muito menos os estrondosos US$ 2 bilhões de O Despertar da Força (2015). Além disso, a média do filme na plataforma IMDb, que agrega notas de inúmeros sites, é 6,7, ligeiramente maior que o 6,5 do indiscutível pior longa da franquia, o infame A Ameaça Fantasma (1999).
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Alguma coisa com certeza deu errado e, infelizmente, o principal responsável disso foi o estilo, com todos os clichês usados à absoluta exaustão, do diretor J. J. Abrams. Antes de conclusões precipitadas, não estamos dizendo que Abrams não é um bom cineasta, pelo contrário, ele tem excelentes capacidades. É muito hábil com atores, conseguindo tirar o melhor deles nas cenas divertidas, além de contar histórias em ritmo frenético e bem-humorado.
O estilo altamente característico de Abrams, entretanto, não era o que a conclusão de Star Wars precisava. A linguagem cinematográfica do cineasta abre mão de elementos que dão coerência e impacto dramático a um filme em prol da diversão e, mesmo a diversão sendo algo necessário à franquia de George Lucas, apenas isso não sustenta a experiência.
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A pergunta óbvia (e justificada) que surge após uma afirmação dessas é: Por que? Por isso que vamos, passo a passo, listar os clichês aplicados pelo diretor e de que maneiras eles falharam em entregar um desfecho a altura dos 40 anos de aventuras da família Skywalker.
Sempre é bom avisar que, a partir deste ponto, haverão vários spoilers de A Ascensão Skywalker, assim como muitos trechos do filme e de outros trabalhos de J.J. Abrams.
J.J. Abrams trabalha no auge quando o foco do filme é levar a trama adiante e apresentar informações novas sobre o problema que os heróis devem superar. É uma ótima habilidade para se ter quando a tarefa é tornar exploração espacial e batalhas de naves em cenas interessantes. É o caso dessa conversa durante um teste em Star Trek (2009):
A câmera viaja de forma dinâmica entre os atores, as falas são bem escritas e a performance irreverente de Chris Pine como Kirk transforma um contexto bem monótono em uma sequência empolgante, finalizada muito bem com a primeira aparição de Spock (Zachary Quinto) no filme.
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Porém, por melhor que esse estilo seja, ele entrega apenas roteiro. A mensagem passada no trecho é: "Kirk trapaceou no teste do Kobayashi Maru! E agora Spock vai investigar como isso aconteceu." É sim um elemento necessário e saudável a um filme divertido. Mas isento de emoção.
Star Wars difere de Star Trek nesse sentido. Nas histórias da Enterprise o foco é em como os personagens vão resolver os problemas de forma inteligente e inovadora. Já quando Luke e os rebeldes atacam a Estrela da Morte em Uma Nova Esperança (1977), não há nenhum plano mirabolante, apenas o herói usando da Força e determinação conquistadas ao longo da jornada para vencer.
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Por isso, J.J. Abrams já mostra uma das primeiras incompatibilidades com Star Wars. O estilo dele não colabora com a necessidade da franquia de mergulhar nas emoções dos personagens, isso tudo é deixado de lado. Faltam cenas nas quais os heróis mostram os conflitos internos e triunfam sobre eles.
Veja agora essa icônica conversa entre Luke, Han Solo e Obi-Wan a bordo da Millenium Falcon:
O filme sabiamente deixa um pouco o perigo de lado para mergulhar nas motivações dos heróis. Han fala de como acha a Força ridícula e os Jedi ultrapassados, enquanto Obi-Wan ensina ao protagonista que o poder irá guiá-lo, se ele aceitar. Não há plano de ataque contra o Império, nem vidas em jogo, apenas pessoas com opiniões diferentes explorando os próprios sentimentos.
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Coisa que não acontece nessa cena feita, não por acaso, também na Millenium Falcon:
Finn, Poe e Chewie começam uma interação muito engraçada ao jogar de novo o tabuleiro holográfico, o amado Wookie vai fazer uma jogada e... Esquece isso, o alarme tocou, é hora de explodir Tie Fighters da Primeira Ordem. O que poderia ser um olhar interessante nas mentes dos personagens muito bem interpretados por John Boyega e Oscar Isaac é cortado abruptamente.
Novamente, é apenas informação, com quase nenhuma emoção. Falando em emoção...
É claro que os filmes de J.J. Abrams tem emoção. Há perigo, momentos heroicos e engraçados. E só. Star Wars tem muitos pontos altos, mas também tem pontos baixos importantíssimos para tornar as vitórias marcantes.
Novamente, vamos comparar cenas que, em essência, são iguais. "O herói descobre que é parente do vilão" vale para ambos os momentos:
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Arrepiou, né? Luke sofre uma enorme derrota, entra em colapso com a negação, dá um salto imprudente e escapa por um tris da morte certa. Uma cena magistral do diretor Irvin Kershner. Veja o mesmo conceito, agora nas mãos de Abrams:
A revelação acontece, Rey está no dilema entre a morte o lado sombrio da Força e... Ufa, ainda bem que os amigos dela chegaram para resgatar o filme dessa cena triste. Voltamos a programação normal de animação e ação.
Parece que o luto e a tristeza são tratados por J.J. Abrams como empecilhos na história, quando o que Star Wars precisa é usar os momentos baixos como um trampolim para construir os altos.
O exemplo claro desse aspecto é a "morte" do Chewbacca. Para captar a atenção do público, o diretor criou uma boa cena para chocar o público e revelar a conexão de Rey com o lado sombrio, mas todo esse impacto se perde segundos depois, quando o parceiro de Han Solo aparece vivo e capturado.
Outros diretores teriam alongado mais a morte falsa do Wookie, mas Abrams decidiu mostrar ao público que o personagem estava vivo antes mesmo que os próprios heróis soubessem. Afinal, se o Chewie está morto, o filme fica triste e não podemos nos divertir direito com o adorável alien Babu Frik minutos depois. E o diretor ainda tem uma carta na manga para se safar da falta de profundidade e é bater com tudo na tecla da nostalgia.
J.J. Abrams tem ciência de que o estilo dele apela fortemente para conquistar o público pelo carinho que eles têm em relação a uma história e personagens. Para tal, ele aproveita o máximo possível da nostalgia. O maior exemplo disso é essa cena de Além da Escuridão - Star Trek (2013):
Naquele momento da história, Spock e Kirk não fazem ideia de quem é Khan eles nunca o viram antes. Mas, o momento da revelação do nome tem um foco absurdo, pois o público sabe quem é o vilão. Esse é o famigerado fan service, um elemento supérfluo a narrativa original, colocado lá apenas para agradar os fãs.
Fan service não é algo muito nocivo a um filme, mas, em A Ascensão Skywalker, Abrams foi longe demais, colocando o agrado aos fãs acima de desfechos coerentes. A cena que personifica isso é a infame "Rey Skywalker":
Certo, sei que é difícil, mas vamos tentar analisar essa cena com as emoções de lado. Faz sentido Rey estar em Tatooine, na velha casa de Luke? Esse é o planeta que o personagem de Mark Hamill detestava viver no início da saga e desejava sair desesperadamente. Aquela casa é o lugar onde os tios dele foram brutalmente mortos. É um lugar apropriado para homenagear o mestre?
Sim, Tatooine é um planeta importante. Para os fãs. Vale também Leia foi raptada e escravizada por Jabba no planeta, então nenhum dos gemêos Skywalker gostaria de ter uma lápide lá. Entretanto, aquece o coração do fã ver o pôr do sol duplo de novo.
Depois disso, uma estranha pergunta qual é o sobrenome de Rey e ela diz: Skywalker. Alto lá, nós temos carinho por esse nome, mas será que a personagem de e Daisy Ridley tem? Afinal, o primeiro Skywalker foi Anakin, um Jedi que sucumbiu, matou crianças e se tornou o ícone do mau Darth Vader. Luke Skywalker, outro que deveria ser um herói, desapareceu por anos e abandonou a luta.
Se Rey quisesse adotar um nome para ela, não faria mais sentido Organa? O sobrenome usado por Leia, um dos maiores símbolos de justiça e luta pela democracia, com quem a heroína treinou durante um ano e sempre foi bem tratada faria muito mais sentido com a história. Mas, não tem o valor para os fãs que um Skywalker tem.
Agora, meses depois do resultado muito abaixo do esperado e fãs ainda polarizados entre amar e odiar o filme, pode-se dizer que não deu certo dessa vez para J.J. Abrams.
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