A banda paulistana lança Você Não Sabe de Nada, disco de estreia, e quer te ensinar uma lição: "você não precisa que o mundo dê certo para ser feliz"
Yolanda Reis | @_ysreis Publicado em 04/04/2021, às 08h00
Carnaval, Grandes Amores, Coisas de Cinema. Todas as angústias dos 20 e poucos anos, aquela fase quando percebemos que não sabemos de tudo, como firmemente acreditávamos na adolescência. Aliás, é mais provável afirmar: Você Não Sabe de Nada. Disso canta O Grilo no disco de estreia.
A banda paulistana - formada por Felipe Martins (guitarra), Gabriel Cavallari (baixo), Lucas Teixeira (batera) e Pedro Martins (vocal, não é parente do Felipe!) - lançou na sexta, 26, o primeiro disco pelo selo Rockambole. Você Não Sabe de Nada tem 13 faixas (uma é bônus) e reforça a ideia pregada pel’O Grilo há uns anos, agora: uma fusão do roquenrol com as tantas brasilidades musicais regionais.
Se faixas anteriores - como “Sambinha” (2017) - não deixavam claro, Você Não Sabe de Nada veio para explanar: O Grilo bebe de uma vasta fonte inspiracional. Tem de tudo: rock setentista em “Meu Amor"; forróck em “Guitarrada”; um samba à Raul Seixas em “Contramão”, até um vocal orquestrado em “VNSDN”.
Em algumas conversas com a Rolling Stone Brasil, Fepa, Cavallari, Teixeira e Pedro falaram sobre O Grilo: do começo da banda, a construção da identidade, a montagem (suada) do disco. Confira:
O Grilo teve dois começos. O primeiro, oficial, foi quando a banda se formou. Depois, mais um, quando se reformou em 2019.
Sobre o começo oficial, os meninos são evasivos. Uma ou outra palavra vazia de referência a tempos que soam como muitas eras passadas. A empolgação do passado veio só na hora de contar da onde vem o nome do Grilo. Para isso, também duas alternativas: a primeira brinca com “estar grilado, e também a questão do grilo cantar,” explicou Pedro. A segunda tem mais cara do acaso, responsável por gerar tantos nomes de banda. Precisavam fazer um show, mas não tinham nome. Alguém conhecia outra pessoa que, caso tivesse uma banda (embora não tocasse nada), chamaria O Grilo. “Colocamos esse provisoriamente. Então, ficou até hoje.”
O segundo começo, ou o recomeço, foi quando Fepa entrou. Sem muitos detalhes, Teixeira relembra os tempos de cinco integrantes d’O Grilo, a saída de dois, e a procura por um guitarrista. Conhecia Felipe da faculdade de produção musical na Belas Artes, fizeram um projeto juntos. Daí, veio o convite:
“Para gente,” comentou Teixeira, “não fazia sentido chamar alguém e delimitar, direcionar essa pessoa. Queríamos trazer alguém para agregar presença em ¼ da banda. Era uma característica nossa, e queríamos manter.” A diversidade vinda de Manaus para São Paulo também ajudou: “Ele era de um lugar super diferente do nosso, com referências criativas muito diferentes. Queríamos essas influências e todo o mundo dele dentro do Grilo.”
Fepa chegou em polvorosa. Foi poucos dias antes d’o Grilo apresentar no Lollapalooza, em São Paulo, e a agenda da banda explodir. Era show atrás de show, e mal tinham tempo de conversar. O guitarrista descreveu o período como “quase distante”: “A gente chegava, tocava. Tudo meio estranho”. E, aliás, tocou estranho, mesmo. No turbilhão de shows, as músicas, compostas para duas linhas de guitarra, eram aprendidas e testadas nos palcos. Fepa admite: muitos dos shows daquela época não foram bons" - mas foram “essenciais para entendermos como, tipo, ‘não dá certo desse jeito. Vamos criar uma terceira versão pra guitarra! Não tive tempo de entender e aprender.’”
Assim, “na marra”, durante 2019, Fepa entendeu O Grilo, e O Grilo entendeu Fepa, e tudo foi remexendo e encaixando. Naquele ano, resolveram profissionalizar de vez e ir dançando conforme compunham. O lado criativo, naqueles dias, ficou um pouco de lado para poderem entender as técnicas. Cavallari partiu da guitarra para o baixo, e recordou como em poucas semanas viram o processo musical ficar sério e bem delimitado. A primeira junção de tudo - novos integrantes, novas composições, novas técnicas - foi na gravação de “Terreiro.” “Foi uma música muito simbólica para mostrar esse entendimento para gente,” apontou Cavallari. “Foi o início, mas mostrou como estávamos nos conhecendo.”
O conhecimento pleno veio na sequência natural: a montagem do disco de estreia, Você Não Sabe De Nada. O início das gravações, quase um ano depois da nova formação, foi a primeira chance dos quatro meninos, de fato, se conhecerem.
Mas um parêntese nesse processo. Na verdade, um parêntese na história do mundo: a pandemia de coronavírus. Parte do disco, como explicou Teixeira, foi composto em meio à quarentena. Apesar de tudo, garantiu: a banda conseguiu se adaptar - e todo o trabalho musical acabou ajudando a aguentar as pontas psicologicamente. (E um parêntese dentro do parêntese: também enfrentaram o desafio de criar uma base de fãs sem poder fazer shows ou conhecer o pessoal. Dominam com maestria o uso das redes sociais.)
Como Pedro detalhou, a distância para compor deu um pouco de autonomia na criação - e acelerou um pouco o passo. Gostou de estar em casa, ter uma ideia, e gravar ali mesmo. Melhor do que esperar a semana seguinte, quando marcaram o ensaio, e mostrar só então. “É aquilo, infelizmente, precisamos aprender a fazer isso. Mas que bom que aprendemos.”
Pedro, aliás, é o poeta do grupo. A maioria das letras é dele. Também gosta muito de compor. Das músicas do disco, como explicou Teixeira, boa parte vem do vocalista. “Uns 70% vieram de jams,” disse o bateirista. Mas se retificou: “Ok, vai, uns 50%. A outra metade é [do Pedro].” O letrista prontamente acrescentou: “Mas, mesmo essas canções que trago são bem coletivas. Dou a ideia, eles fazem essa ideia ficar gigantesca” com letras e arranjos adicionais. (Também trocam figurinhas na criação, e criam faixas de instrumentos os quais não tocam).
A gravação do disco foi a época ideal para a banda se entender. Tempos para “poder se resolver,” como descreveu Fepa. “Antes de começar a tocar [com a banda completa], lavamos uma roupa, botou tudo para fora. Nos entendemos bastante.”
Quando chegou a hora, queriam sossego e segurança; alugaram um sítio no interior de Limeira, São Paulo, e passaram um tempo lá, aproveitando o estúdio de um amigo. Em meio à natureza, Cavallari descreveu a experiência como “um grande respiro” - e Fepa como “um parênteses em meio à quarentena.” A amizade, bastante evoluída no processo, garantiu um espaço no qual “já conseguíamos entender e falar. Estávamos na mesma página.”
Em épocas de streaming, nem toda banda quer um disco. Para muita gente, o lançamento de vários EPs diferentes funciona, ou até um single aqui ou ali. Mas um álbum para chamar de seu ainda é o sonho de muitos - inclusive d’O Grilo. Teixeira explicou o plano do grupo: o EP Herói do Futuro (2017) veio para apresentar a banda. Depois, aqui e ali, uma música, principalmente celebrando carnavais.
A banda não pensava tanto assim em disco, estava mais focada em shows. Eventualmente, porém, perceberam algo: faltava um contexto ali. “Sentíamos a necessidade de ter um material mais conciso da banda,” explicou o baterista. Começaram a trabalhar para reunir várias músicas dentro de uma ideia para ter uma representação bem clara do que são.
O primeiro passo para montar o disco foi olhar o que tinham. Eram, no começo, 16 faixas. Teixeira conta como colocaram tudo na mesa e começaram a procurar quais delas conversavam entre si - e se fazia sentido algo estar, ou não, dentro do disco. Escolheram, dali, 11 faixas. Mas isso mudaria em alguns dias: o baterista achou duas músicas no celular, e Hugo Silva, produtor, questionou porque não estavam inclusas. A banda refez a tracklist para incluí-las (entre essas, estava “Vou Levar,” apresentada para os fãs em lives e uma das favoritas).
A escolha final das faixas, e tanto Pedro quanto Teixeira enfatizaram isso em momentos diferentes, tem a ver sempre com a diversão. Se for legal tocá-la, provavelmente vai entrar. Se não, pode esquecer! "É o Follow de Fun," explicou o baterista, adicionando como esse é todo o intuito de trabalhar com música.
Completaram o disco com 13 faixas - e os singles "Trela," "Meu Amor" e "Contramão." Você Não Sabe de Nada saiu no dia 26 de março pelo selo Rockambole.
Antes de começar a escolha das faixas do disco, O Grilo tinha uma ideia: “uma parada muito conceitual: uma viagem musical pelo Brasil,” comentou Fepa. Mas, logo após pensarem nisso, perceberam ser mais difícil do que parecia desenvolver tudo.
Ironicamente, apresentaram exatamente isso: as músicas de Você Não Sabe de Nada acabam vagando por estilos, descobrindo significados e indo para lá e para cá para ser, no final, um trabalho bastante brasileiro.
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É um dilúvio de influência. Na entrevista, a banda tentou explicar um pouco das referências musicais - mas sem sucesso. Entre várias risadas, comentaram como cada música parece ter duas influências diretas: “Trela” tem um pouco de Red Hot Chilli Peppers, um pouco de Seu Jorge. “Meu Amor” tem Daft Punk e Ed Motta (ou Lagum, Natiruts…)
“No disco,” comentou Pedro, “cada música é de um universo. Em uma, você diz ‘Caraca, isso é influência do Pink Floyd’; na outra, pensa ‘cara, isso é Barões da Pisadinha! [...] A gente tem a mente aberta para tons. E troca de estilo a cada compasso. Representamos muito o nome do disco: Você Não Sabe de Nada - e estamos sempre querendo aprender mais.’”
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A viagem do samba ao forró no meio do rock é uma das principais características das novas bandas do Brasil. O Novo MPB - um renascimento da música popular brasileira com influências de outros estilos conhecidos no Brasil - ganhou forças nos últimos anos, e, agora, cresce mais e mais no mainstream, angariando o povo dos 20 e poucos.
Para O Grilo, ainda é uma ideia em construção. Teixeira define o pensamento de se encontrar num estilo como “uma crise.” A banda passou por várias fases em pouco tempo: quando Fepa entrou, sentiam-se bem mais próximos da cena indie e do rock alternativo no Brasil (“com essa galera dos Selvagens [a Procura de Lei], Far From Alaska, Supercombo, para quem a gente abriu muito, então até chamou os fãs”), essa “cena desses últimos oito anos.”
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Mas os meninos de 22 anos são relativamente mais jovens do que a galera orbitando os 30, e sentem um vão geracional - justificado e encaixado em nomes como Jovem Dionisio, Lagum, Daparte, “que também têm essa brasilidade,” reflete o baterista. “Percebemos que nos aproximávamos de outro tipo de galera, outro tipo de banda, até de cena, talvez.” Hoje, sentem-se mais próximos destes, e Lucas acredita ser pela questão geracional, mesmo.
Depois de terminarem Você Não Sabe de Nada, o Grilo percebeu algo, relatou Teixeira: “Fizemos um disco de dois momentos.” O primeiro bem mais existencialista, com faixas como “Meu Pior Amigo” e “Contramão.” Depois, em “VNSDN,” uma virada e um momento mais leve e alegre - abrindo com “Meu Amor,” encerrando com “Onde Flor.” É uma narrativa sobre como é difícil e como é incrível entrar na vida adulta.
Uma das partes mais complicadas (se não a mais) é o conflito interno e o temor dessa fase.
Como Teixeira devaneou, no fim das contas, tudo gira em torno disso: perceber como não sabemos de nada. “Acho que é um momento da adolescência. Existe a fase em que achamos saber de tudo. Tudo o que ouvimos é novidade, a gente não sabia de nada daquilo até então. Então, pensamos como isso pode ser a chave de tudo, e temos o segredo para salvar o mundo. Somos até egocêntricos por nos achar o centro da verdade. Aí passamos dessa fase, e percebemos como não sabemos de nada. É cruel.”
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Chegando na compreensão de saberem que nada sabem, O Grilo tentou falar muito, mas sem o objetivo de explicar nada (inclusive, está aí a faixa que só canta: “e daí? Eu sei lá. Prefiro não opinar”).
Para ajudar a mostrar o desalento do pensamento, a banda chamou Lauro, um personagem de quadrinhos criado por Pietro Soldi para, como explicou a banda, ilustrar um cara completamente comum. Ele se apaixona, tem o coração partido, quebra a cara, se isola, festeja. Vive a vida dele, aqui e ali, como todos nós. Inclusive, cheio de crises.
Lauro é o personagem central de um livro produzido pelo Grilo e idealizado pela Rockambole para um lançamento conjunto ao disco. A publicação engloba, além das tiras de cada uma das músicas, letras e tablaturas, fotos dos bastidores e comentários dos integrantes da banda para cada uma das faixas.
Foi uma maneira criativa de englobar o samba, o forró, os medos e toda a graça do lançamento do Grilo. E ainda termina com uma lição importante: você não sabe de nada. Mas está tudo bem.
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