Na década de 1990, o gênero foi movido pela força impetuosa de mulheres com vocais uivantes e discursos agitados contra o sexismo que influenciaram uma geração de garotas a criarem a própria música
Nicolle Cabral | @NicolleCabral Publicado em 06/08/2020, às 07h00
Foi em Olympia, Washington, que o punk liderado e pensado por mulheres começou a criar corpo e conquistar o próprio espaço. A partir de Kathleen Hanna, peça fundamental da Bikini Kill, a frase “Girls to the Front” (“Meninas na Frente” em português), foi popularizada e tomou significados que reverberam na cultura contemporânea.
Inicialmente, o comando foi literal: homens, abram espaço para que as mulheres possam ficar à frente do palco durante os shows. A expressão, contudo, acabou sintetizando o sentimento de urgência da época de ter mulheres ocupando espaços nas músicas, nas ruas e nos palcos.
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Tendo os zines como o primeiro formato de divulgação concreto dessas ideias, além de cartas, fitas K7, e claro, os próprios shows, Bikini Kill, Bratmobile, Babes in Toyland, 7 Year Bitch, Excuse 17 e Heavens to Betsy — responsáveis por construírem essa linguagem acessível e visceral — reuniram uma legião de mulheres que buscavam por identificação e, com o tempo, fomentaram o cenário do movimento que conhecemos por Riot Grrrl.
Em um dos primeiros manifestos que circularam em 1991 na Evergreen State College — escola de Kathleen Hanna —, dizia: "Nós, garotas, queremos discos, livros e fanzines que conversem conosco. Estamos de saco de cheio dessa sociedade que diz que "Garota" é sinônimo de burra, ruim e fraca. Toda vez que pegamos uma caneta, um instrumento ou fazemos qualquer coisa, estamos criando a revolução. Nós somos a revolução".
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Sendo assim, com canções eletrizantes e uma atitude ousada — até mesmo para o punk —, mulheres subiram aos palcos sem saber necessariamente tocar os instrumentos e quebraram a mística em torno da figura do homem detentor de todo o conhecimento. Provaram, inclusive, serem melhores que eles. "Aprender a tocar os nossos instrumentos na frente de uma plateia ao vivo foi feito para incentivar jovens a começarem as próprias bandas", explica Tobi Vail, integrante da Bikini Kill, em entrevista ao The Stool Pigeon.
A celebração do imperfeito e o fervor das composições — que abordam temas como abusos sexuais, patriarcado e o empoderamento feminino — se tornaram força política e cultural que inspirou várias mulheres a serem produtoras dos próprios conteúdos e buscarem cada vez mais representação dentro da indústria do entretenimento.
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Ainda que a união do punk e a consciência feminista tenha sofrido uma dissolução ao alcançar o mainstream com uma roupagem menos agressiva e mais comercial, a movimentação feita durante o início da década de 1990 continua sendo uma força vital. Sendo assim, ao refletir sobre as compilações, singles e projetos da época, a Rolling Stone Brasil separou um guia essencial de discografias para desbravar o movimento. Veja abaixo:
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No primeiro registro da Bikini Kill, lançado em 1991, Kathleen Hanna estava faminta pelo punk-rock e a revolução feminista. Com riffs ardentes e versos crus sobre a misoginia, abusos sexuais e violência contra a mulher, o EP produzido por Ian MacKaye, de Fugazi, é um debute poderoso. Gravado no verão de 1991 em Washington, DC, o disco marcou o primeiro encontro das quatro integrantes do grupo em uma gravação profissional. É desafiador, honesto e um convite para um motim.
7 Year Bitch é uma das linhas de frente do movimento, porém, é uma das imagens mais brutais. A voz áspera de Selene Vigil, alinhada aos riffs agitados, narra o mundo em completa combustão. "Dead Men Don't Rape", "Knot" e "No Fucking War" são alguns highlights do projeto palpitante. A banda teve um histórico trágico com a integrante Stefanie Sargent, guitarrista, que morreu de asfixia após vomitar, logo após o lançamento deste disco. O grupo, contudo, decidiu seguir carreira.
Disco de estreia do grupo, Pottymouth é mais despojado — ainda que muito político. O projeto foi um grande marco para o movimento Do-It-Yourself (Faça Você Mesmo em português) e traz a união entre o rock feroz com composições divertidas. Além disso, o disco tem uma versão sarcástica de "Cherry Bomb", hino do The Runaways.
O primeiro e único disco de Heavens to Betsy já era poderoso antes mesmo de pensarmos em Sleater-Kinney. Calculated foi lançado em 1994 e recebeu críticas positivas de veículos especializados. Segundo Kurt Morris, do AllMusic, elas têm o "tipo de poder que muitas bandas na cena hardcore nem são capazes". Logo depois, Corin Tucker se juntou ao SK.
Também peça fundamental na disseminação das ideias do Riot Grrrl, Sleater-Kinney, formado por Corin Tucker, Carrie Brownstein e Laura MacFarlane (à época, baterista do grupo), tem energia vibrante, brincalhona, sarcástica e riffs infreáveis. Lançado em 1996 pela Queinsore Chainsaw Records, Call the Doctor foi escrito em três semanas e gravado em apenas quatro dias. Em 2010, o disco foi eleito em 49º lugar na lista dos 100 maiores lançamentos dos anos 1990 pela Rolling Stone EUA.
Superando toda e qualquer expectativa, Sleater-Kinney ficou ainda mais interessante com a chegada da baterista Janet Weiss — que anunciou saída do grupo em 2019. Os vocais ardentes dão o dom dos términos, descobrimentos, a sensação de liberdade, além de claro, discussões sobre sexismo e estereótipos, narrados ao longo do disco.
Dig Me Out chegou altamente elogiado pela crítica e rendeu menções em várias listas de Melhores Discos de veículos especializados. É uma audição mais carregada dos estilos tradicionais do rock como os Rolling Stones e o blues rock de Muddy Waters.
Essencial para a escuta desse movimento, esse registro reúne o material mais próspero do Bikini Kill e canções viscerais do punk. "Rebel Girl", "I Like Fucking", "I Hate Danger" e "New Radio" são alguns destaques do registro.
Além da Bikini Kill, Kathleen Hanna assumiu um papel na Le Tigre ao lado de Johanna Fateman, escritora de zines, e Sadie Benning, cineasta. A aparição do grupo foi logo após a BK ter assinado com a gravadora Reject All American. O lançamento, feito em 1999, trouxe uma faceta divertida cheia de synth-pop e vocais frescos. As composições do grupo também conversam bastante com a comunidade LGBTQ+.
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