O EP Duda Beat & Nando Reis surgiu de uma live do evento virtual Devassa Tropical Ao Vivo
Redação Publicado em 01/02/2021, às 15h38
A pandemia de Covid-19 resultou no cancelamento de diversos shows e festivais. Com isso, muitos artistas foram prejudicados - assim como trabalhadores do backstage. Para minimizar o impacto financeiros desses profissionais que trabalham por trás das grandes apresentações da música brasileira, surgiu o Devassa Tropical Ao Vivo.
O evento é constituído por várias lives que elevam representatividade e a diversidade da música tropical brasileira, além de contribuir para a causa por meio de doações aos operadores, técnicos e outros profissionais que fazem os shows acontecerem. O evento teve duas edições em 2020, e a segunda contou com nomes como Elza Soares, Gilberto Gil e a parceria inédita entre Duda Beat e Nando Reis.
A colaboração entre os dois artistas no Devassa Tropical Ao Vivo aconteceu em 25 de setembro de 2020, e rendeu um EP digital com seis faixas, entre elas clássicos como "All Star", de Nando, e "Bolo de Rolo", de Duda. Celebrando o lançamento, Duda Beat e Nando Reis conversaram sobre processo criativo e carreira - e quem fez as perguntas foram eles. Confira a entrevista:
Duda Beat: Nós acabamos de lançar um EP, que eu amei fazer! Você é uma pessoa que fez muitos feats, é cantado por muita gente... Como funciona para você esse processo musical mais colaborativo?
A graça desses encontros é que sejam colaborativos e inevitavelmente são, porque a ideia, pelo menos quando me atrai e eu decido me envolver, é justamente fundir os processos em trocas, em contribuições que irão resultar numa terceira coisa. E nunca é muito exato, e essa é a graça, a magia, o que cada um entrega e contribui, não se trata de um 50/50. A melhor coisa é se entregar, arriscar, e procurar um resultado. É estar aberto! A palavra maior é estar permeável, é ir com a disponibilidade para arriscar e ouvir. Ouvir! Música é algo que se faz mais ouvindo do que tocando. Tanto ouvindo a si, mas muito mais ouvindo o outro, num feat, como se diz atualmente.
Tem alguma canção preferida do nosso EP? Se tiver, qual é e por quê?
Ah, é sempre difícil, né? Dizer, escolher, apontar, porque em cada uma delas aconteceu uma coisa, mas é inevitável que umas acabem sendo mais inspiradas ou resultem melhor do que outras. Eu vou citar duas, embora eu sempre possa mudar de opinião. Se você me fizer essa pergunta amanhã, talvez eu responda outra coisa. A primeira é a música "O Segundo Sol", lembrando que como foi um convite seu para que eu fizesse uma participação, quando você escolheu essa para que cantássemos juntos, você e sua banda fizeram arranjo de base e é esse um grande exemplo do que é o propósito de uma participação, de uma colaboração, mesmo um dueto. No caso, às vezes, dueto parece que é só combinação das vozes, nesse nosso projeto não, era a combinação das sonoridades, até porque a sua música, você não é apenas uma cantora, a força da sua música se dá no conjunto da sonoridade, nos timbres que criam. De certa maneira, em "O Segundo Sol" há muito dessa marca da sua música em cima da minha música, que fez com que ela virasse uma nova música. Não posso deixar de citar também "Back to Bad", eu amo, mas aí ficou mais um dueto, né? Porque a gente cantou por cima do seu arranjo.
Nando, como foi para você criar no período da pandemia?
A pandemia por si só está sendo um período de provação para todos nós, de tensão, apreensão, transformação, sofrimento que, de modo geral, traz aprendizado. Nem sempre, né? Mas, no mínimo, é uma nova experiência muito transformadora e, às vezes, deixando marcas. Uma das marcas da pandemia é tudo o que fiz, fiz bastante coisa e estou fazendo bastante coisa. Algumas delas tratam mais explicitamente do contexto, dos impactos, das impressões, outras menos, como letras que escrevi em outros trabalhos, mas eu sempre acho que tudo o que a gente faz, em qualquer momento que a gente faça, se refere ao momento em que foi feito. Então, tudo o que fiz, e não fiz pouco, tanto em termos musicais, em criação, mas a criação vai além daquilo que se faz pra profissão criar um modo de viver, o modo de viver é também uma criação, então digamos que recriar o modo de viver, essa é a melhor definição, mas dentro dessa recriação, ainda consegui encontrar disciplina em muitos momentos para conter a minha angústia e conduzi-la, direcioná-la, para que eu conseguisse trabalhar em música.
Fizemos uma live, que inclusive foi a que deu origem ao nosso EP. Como você vê esse movimento das lives? Foi algo que você abraçou de cara ou levou um tempo?
Putz, abracei de cara, por necessidade. Gosto muito de trabalhar, além de precisar trabalhar, e era o trabalho possível. E, nesse ponto, sempre foi assim a minha vida, eu sempre trabalhei naquilo que pude, foi possível e busquei trabalho. Eu vou atrás do trabalho e, as lives, como todo mundo sabe, é a única forma --foi e agora durante grande parte da pandemia, e agora de novo-- só nos restam lives, para poder trabalhar e tocar para pessoas, produzir algo, performar, dessa forma remota que é muito estranho! Em muitos momentos a live veio para ficar como se a permanência pudesse substituir os shows, mas de maneira alguma. São coisas completamente distintas e não se compara, o prazer, a energia, a força do que se dá num show com presença de plateia. Isso é uma marca dessa era digital, dos encontros virtuais, eles exigem muito, primeiro, de uma espécie de abstração eles levam para um campo fantasioso que no caso de, enfim, em outras vertentes dessas, pode ser estimulante criativo e propício, mas para shows de modo algum, é bastante frio. Eu tive dificuldade numa primeira, tava um pouco engessado e pouco a vontade, mas a live me abraçou e eu me deixei levar por ela.
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Nando Reis - Duda, foi um enorme prazer ser o convidado de sua live no Circo Voador que originou nosso EP juntos. Devolvendo sua pergunta sobre processo colaborativo, sabemos que a música nos tempos atuais suscita muitas participações até pela sua sobrevivência nas plataformas digitais por conta das playlists. Você, como artista da nova geração, acha positivo que as playlists tenham, de certa forma, substituído o hábito de se ouvir um disco por inteiro nos dias de hoje? De que forma o conceito pensado para este ou aquele disco fica nisto tudo?
Nando, eu adoro playlists, mas também adoro ouvir discos inteiros (risos). São duas maneiras de se ouvir música que não se excluem. Quando faço uma playlist, estou selecionando as músicas que quero ouvir naquele momento, ou pensando em algum tema específico. É um arranjo mais pessoal, como acontecia com as mixtapes de anos atrás, sabe?! Acho que as playlists temáticas, por exemplo, são muito legais. Tem muitas dos anos 80, 90, e eu acho massa. Dá para conhecer novos artistas, relembrar músicas que talvez já não estavam mais sendo ouvidas. Deu para perceber que eu amo uma playlist, né?! (risos) Ouvir um disco, para mim, é mergulhar no artista, é ouvir a sua história. Cada faixa é como o capítulo de um livro. Escutar um disco é tentar entender o que artista estava sentindo, como ele estava no momento que fez aquela música. Ao mesmo tempo, é se deixar levar, se deixar ser provocado pelo que vem do outro. Acho que é uma troca tão potente entre o artista e o público. Eu, por exemplo, quando faço um disco (estou nesse processo agora, aliás) preparo tudo nos mínimos detalhes. A ordem das músicas importa, os arranjos, os interlúdios... E gosto de pensar que quem está ouvindo está me conhecendo um pouco mais.
Duda, eu particularmente adorei a nossa versão juntos de “O Segundo Sol”. Como você se sente sendo a primeira mulher a gravá-la depois de Cássia Eller?
Eu amei nossa versão também, Nando. Não foi à toa que escolhemos ela justamente para ser o single do nosso projeto. Eu me sinto nas nuvens, a verdade é essa. "O Segundo Sol" é uma música que fala comigo em um lugar muito íntimo. A interpretação de Cássia é tão linda, potente, forte. Gravar essa canção é atualizar a força e a potência dessa melodia e também é homenagear Cássia, uma artista tão importante, que sempre me inspira com sua voz, com a força de suas interpretações.
Duda, sua geração tem grande parte da produção de shows alocada em grandes festivais de música. Como você, que lançou seu primeiro disco de forma independente, enxerga essa relação entre grandes festivais e a cena independente? Eles a fomentam ou na verdade contribuem para que ela acabe?
Olhando o cenário, especialmente aqui no Brasil, vejo com otimismo isso. Acho que os festivais fomentam sim e estão cada vez mais de olho na cena musical independente. Eu já me apresentei no Lollapalooza, por exemplo. Vejo o Rock in Rio com esse espaço também. Sem contar tantos outros festivais que sempre me receberam tão bem, como Coala, Bananada, Queremos... Estar nesses lugares para um artista que está no começo da estrada é muito bom, vai sendo um aprendizado de palco enorme.
Duda, em sua música encontramos elementos como o pop, o brega, o baião, o xaxado, o manguebeat, a mpb, etc. Como essa infusão de elementos se dá no seu processo criativo?
Meu processo criativo passa pelas coisas que eu vivo, que eu ouço... Eu amo a cultura brasileira, a diversidade que ela tem. Minha música é um espaço para exaltar exatamente isso, para experimentar as possibilidades que tenho com esses elementos todos. Eu acredito muito no coletivo, na construção em conjunto, sempre falo isso. A minha formação musical, seja como cantora e compositora ou como ouvinte, tem esses elementos todos, essas sonoridades. Para mim, então, é natural criar pensando em trazê-los para minhas músicas. Eu amo essa grande mistura, essa grande brincadeira.
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