Autor da biografia definitiva sobre o líder do Nirvana, Cross relembra a história do músico, que faria 45 anos nesta segunda, 20
Bruna Veloso Publicado em 20/02/2012, às 17h16 - Atualizado em 21/02/2012, às 10h50
Quando Kurt Cobain e o Nirvana lançaram o disco Bleach, em 1989, nem o mais abençoado dos videntes poderia prever que o vocalista da banda viria a se tornar uma espécie de mártir de toda uma geração. Entre esse primeiro álbum e a morte de Kurt, foram cerca de seis anos: em menos de uma década, o jovem de Aberdeen, Estados Unidos, nascido no dia 20 de fevereiro de 1967 (há exatos 45 anos) canalizou uma mudança histórica no mundo da música.
Kurt Cobain não era fácil de ser decifrado – e segundo Charles R. Cross, autor da biografia definitiva do músico, Mais Pesado que o Céu, nem mesmo quem era próximo dele o compreendia todo o tempo. “Ele era confuso de muitas maneiras, e é isso também que faz dele um rockstar fascinante, porque não é fácil entendê-lo”, afirma Cross, em entrevista à Rolling Stone Brasil. “As únicas pessoas que eram realmente próximas a ele eram Dylan Carlson, algumas de suas namoradas e seus companheiros de banda. E mesmo essas pessoas costumam falar de Kurt como se ele fosse um enigma.” Carlson, citado pelo escritor, foi quem comprou a espingarda com a qual Kurt Cobain cometeu suicídio, em abril de 1994 (segundo Carlson, que lidera hoje a banda Earth, Kurt havia dito que precisava de uma arma para defesa pessoal).
Cross passou anos vasculhando a história de Cobain. Mas, segundo ele, isso nem sempre quer dizer muita coisa. “Mesmo sendo um biógrafo que passou tempos escrevendo sobre ele, às vezes acho que não o conheço. É difícil ser definitivo em qualquer coisa relacionada ao Kurt.” No início do ótimo livro Cobain Unseen (sem versão em português, mas item indispensável a fãs de Cobain, com reproduções fieis de diários, pinturas e outros itens relacionados ao cantor e ao Nirvana), Cross exemplifica a personalidade complexa do músico. Em página de um de seus diários, Kurt pedia: “Não leia meu diário depois que eu morrer”. Mas, nas páginas seguintes, ele viria a escrever: “Por favor, leia meu diário”.
“Kurt mantinha os diários dele em uma mesa de centro. Ele não os escondia. Ao mesmo tempo, ele escreveu mesmo isso”, lembra Cross. “Quando falamos de Kurt Cobain, é muito difícil ser claro. Estamos falando de um cara que era a própria contradição, dentro de um paradoxo, dentro de um quebra-cabeças. Ele podia dizer uma coisa em um dia e, no dia seguinte, dizer outra coisa completamente diferente.”
Cross não chegou a ser próximo de Cobain, mas o via constantemente em Seattle, onde editou, durante 15 anos, a revista The Rocket Magazine. “Ele veio ao nosso escritório para colocar anúncios para tentar arrumar um baterista para o Nirvana. Conversamos algumas vezes, mas não finjo que era amigo dele”, conta o autor. “E, de certa forma, acho que isso é uma vantagem para mim, enquanto biógrafo. Acho que Kurt não era amigo de nenhum jornalista, na verdade.”
Nevermind
Por trabalhar em uma revista de música baseada em Seattle, Cross afirma que foi uma das primeiras pessoas da imprensa a ouvir Nevermind, o disco de 1991 que mudaria a vida de Kurt e a carreira do Nirvana. “Eu ouvi antes de quase todo mundo. Recebi uma cópia e fiquei embasbacado. Mas ninguém pensava que ia ser o sucesso que foi. E eu estava na festa de lançamento, Kurt e a banda estavam lá. Ninguém imaginava que ia vender mais de 20 milhões, incluindo a banda.”
Nevermind desbancou Michael Jackson do topo das paradas norte-americanas, fez de Cobain um ídolo global e abriu as portas para o grunge, a música de Seattle. Foi um divisor de águas não só para o Nirvana, que foi elevado a níveis de fama estratosféricos, como para a história da música pop. Cross destaca que “Nevermind se tornou um monstro tão grande, que acho que ninguém, nem Kurt, queria um sucesso desse nível. Porque um sucesso desse nível vem com um preço muito amargo.”
“Kurt queria ser considerado um dos melhores, mas não sei se ele tinha noção do que a fama iria custar para a vida dele, para a música dele”, continua o escritor. No entanto, Charles R. Cross não acredita, como muitos, que o álbum e a fama vinda dele tenham sido responsáveis pelo desfecho trágico da história de Kurt Cobain. “As pessoas costumam perguntar: ‘Você acha que se o Nevermind não tivesse tido tanto sucesso o Kurt ainda estaria vivo?’ Mas é preciso lembrar que ele já havia tentado se matar antes de ser famoso”, ele pondera. “A fama teve, sim, um peso, mas com certeza não foi a única razão pela qual ele morreu. A principal razão seria o fato de ele sofrer de depressão, além do vício dele em drogas. Nevermind era um disco do qual ele se orgulhava, mas, ao mesmo tempo, o sucesso e os questionamentos que o álbum trouxe causaram problemas a ele, do mesmo jeito que causariam a qualquer um.”
Para Cross, Nevermind é obviamente um clássico – mas não é seu preferido. “Coloco ele no top 10 de discos mais importantes já feitos, em termos de impacto. Mas, na minha opinião, In Utero [1993] é um disco melhor do Nirvana. Acho que a escrita de Kurt estava evoluindo.”
Cobain nos cinemas
Mais Pesado que o Céu será usado como base para um filme sobre a vida de Kurt Cobain. Ainda não se sabe quem será o diretor – Oren Moverman havia sido confirmado, mas foi desligado pela Universal –, nem quando a obra sairá do papel. “O roteiro está escrito. Em algum momento nos próximos dois anos vai caminhar, presumo”, afirma Cross.
Courtney Love, viúva de Kurt Cobain, já especulou sobre quem deveria interpretá-lo, trazendo à tona o nome do ator James McAvoy. Cross desmente qualquer ligação do astro com o filme. “Ainda não foram tomadas decisões a respeito do elenco. Courtney Love está envolvida na produção, e James McVoy é um ator incrível. Deve ser alguém tão bom quanto ele, mas não foi tomada nenhuma decisão”, ele diz, enfático. Sob a perspectiva do autor, quem será o protagonista não é o principal. “Todo mundo fica focado em quem vai interpretar o Kurt, mas acho que o mais importante em um filme como esse é o que vão dizer sobre a vida desse homem. E isso é determinado pelo roteiro, não pelo ator.”
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