Leia a íntegra da conversa com o líder do Motörhead – morto na última segunda, 28 – publicada pela Rolling Stone Brasil há seis anos
Ricardo Franca Cruz Publicado em 29/12/2015, às 14h03 - Atualizado às 14h23
Em 2009, a Rolling Stone Brasil conversou com o então líder do Motörhead, Lemmy Kilmister, originando uma matéria publicada na edição 31 (abril) da revista. Com a morte do lendário vocalista e baixista – na última segunda, 28, devido a um câncer –, recuperamos a reportagem na qual o músico fala sobre seu drink favorito e desdenha a internet: “Se você baixou músicas minhas sem pagar, então você me deve dinheiro.”
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Se a simples menção ao termo “heavy metal” faz você rir, pense bem antes de proferir desrespeitosamente o apelido do senhor inglês Ian Fraiser Kilmister. Lenda viva do rock pesado, Lemmy, 63 anos, o bem-humorado baixista e cantor rouco, bebedor de Jack & Coke, usuário declarado de speed e fã de peitos siliconados, está prestes a tocar novamente no Brasil com o seu Motörhead. Precursor absoluto da voz gutural no metal, ele confessou pelo telefone, de Los Angeles: “O que me interessa na música é melodia e harmonia”.
Você está profissionalmente no rock há muito tempo – só com o Motörhead, desde 1975. Não se cansa às vezes da vida que escolheu?
Às vezes você se cansa de qualquer tipo de vida que tenha escolhido. Mas acho que tenho uma vida muito boa comparada com a vida de um cidadão tradicional. Eu não esperava ser outra coisa ou fazer outra coisa além do que eu faço. A maioria das pessoas passa a juventude inteira, e até a velhice, odiando o que faz. Eu não tenho esse problema, tenho muita sorte.
Saiba mais sobre a morte de Lemmy aqui.
Ao contrário de muitas bandas antigas que ainda estão por aí, o Motörhead continua tocando como tocava há décadas. Qual a fórmula?
Não há fórmula, mas somos muito profissionais. Podemos ser hoje três loucos, podemos estar completamente bêbados, mas quando se trata de gravar discos e fazer shows, nós estamos lá, inteiros. E tem outra coisa: você tem que acreditar no que faz.
Você ainda acredita no rock n’ roll?
Claro! Que tipo de pergunta é essa, cara? Não há política no rock n’ roll, não há políticos.
Na época de Ace of Spades (1980) vocês chegaram a ser considerados a maior banda de rock do mundo. O que aconteceu depois disso?
Muita coisa, você não vai nem querer saber [risos] – e se quiser é só ler na porra da internet, apesar de ali ter um monte de merda sobre todo mundo. Acho que estou aí até hoje porque não fiquei milionário, nunca estive em uma posição confortável, nunca deixei de trabalhar duro. Se tivesse ficado milionário provavelmente nem eu, nem o Motörhead estaríamos aqui.
A internet é a maior mudança que você viveu na indústria da música?
Sem dúvida. Mas nem todas as mudanças são para melhor. Eu preciso te dizer: se você baixar música de sua banda favorita sem pagar por ela, você estará simplesmente quebrando essa banda. Não digo pagar os preços normais de um CD, ou os preços que a porra de uma gravadora cobraria, mas nenhuma banda pode se manter se não ganhar por suas músicas. E sem dinheiro, uma banda não pode tocar.
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Isso se aplica a qualquer tipo de banda? Porque, em muitos casos, a internet é uma poderosa ferramenta de promoção de bandas independentes e até de artistas consagrados.
É muito simples: você vai matar sua banda favorita se continuar baixando música de graça. Ponto. Qual a vantagem de promover uma banda se ela está quebrada e não tem como tocar? Não gosto de computadores porque não quero adquirir mais um vício além dos que já tenho. É claro que a internet é uma dádiva para o mundo, mas é também um retrato da humanidade. Usam a internet para divulgar essa merda toda de pornografia infantil. Isso é a humanidade, a internet é um retrato fiel dela.
E se eu te dissesse que já baixei algumas músicas do Motörhead?
Então, meu amigo, eu diria que você me deve dinheiro [risos]! Você realmente baixou minhas músicas sem pagar?
Sim, algumas raridades difíceis de encontrar. Mas tenho todos os discos e paguei por quase todos eles.
Tudo bem, você é um jornalista, deve receber material para poder trabalhar. Mas ainda assim me deve dinheiro [risos]!
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O que você tem ouvido de música ultimamente?
Os dois discos do Evanescence, acho que são verdadeiras obras de arte. Mas gosto mesmo das coisas mais antigas – Rolling Stones, Beatles, Little Richard, Eddie Cochran, Elvis do começo. O que me interessa na música, como ouvinte, são a melodia e a harmonia, por isso sou um grande fã dos Beatles.
Soa estranho vindo do pai do vocal gutural no metal.
A culpa não é minha. Não tenho como mudar minha voz, não posso evitar que ela saia assim da minha garganta [risos].
É um clichê dizer que o público brasileiro, e sul-americano em geral, é o mais animado do mundo. Isso é mesmo verdade?
Isso foi antes de a cortina de ferro cair. Porque na Rússia e na Europa Oriental você tem o público mais louco de todos. Mas não posso afirmar com certeza, temos um público muito louco em qualquer lugar do mundo. Ao mesmo tempo, é muito raro acontecer uma briga em um show do Motörhead. Pode ser no Brasil, na Austrália, no Iraque ou no Irã, todo mundo está ali pela música. É bom para caralho você ouvir um garoto do Irã gritar: “Eu amo o rock n’ roll!”. Ainda mais sabendo que eles estão se arriscando a se encrencar de verdade com a porra do governo daquele país.
E o documentário sobre você? Quando será lançado?
Eles ainda estão filmando essa porra! Vai sair em alguma hora no fim deste ano, acho.
Eles te filmam o tempo todo, como em um reality show?
Não o tempo todo, mas eles sempre estão junto quando estou com alguma garota. É realmente inconveniente [risos]! Às vezes eu tenho de fechar a porta na cara deles e dizer: “Boa noite!”.
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Aos 63 anos, você ainda é um pegador?
Claro! Eu amo as mulheres e algumas delas me amam, isso não é lindo?
O que mais te interessa nas mulheres?
Os peitos! Prefiro os de silicone, eles nunca apontam para o Sul e não te desapontam [risos].
Preciso saber qual o segredo da mistura entre Jack Daniel’s e Coca-Cola, sua bebida predileta. Quanto de Jack e quanto de Coca?
Uma parte de Coca, duas partes de Jack Daniel’s e três pedras de gelo.
Ainda é seu drink predileto?
Sim, mas eu acabo de passar três dias bebendo vodca com suco de laranja.
Direto?
Direto e acordado. É difícil ficar em casa sem ter muito o que fazer.
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