Foo Fighters dividindo a noite com o Queens of the Stone Age no Allianz Parque, em São Paulo - Ana Luiza Ponciano

Foo Fighters é o melhor aluno de Escola de Rock em retorno para 40 mil em São Paulo

Noite no Allianz Parque ainda teve um show seguro do Queens of the Stone Age

Lucas Brêda Publicado em 28/02/2018, às 02h03 - Atualizado em 01/03/2018, às 19h32

O Foo Fighters foi a banda de rock mais precisa da atualidade na noite da última terça, 27. De volta a São Paulo -- e ao Brasil -- depois de três anos, a trupe de Dave Grohl reuniu 40 mil pessoas, quase lotando o Allianz Parque, estádio do Palmeiras, no primeiro de dois shows que realiza em São Paulo como parte da atual turnê, que já esteve no Maracanã (Rio de Janeiro) no último domingo, 25, e ainda vai a Curitiba (Pedreira Leminski) e a Porto Alegre (Estádio Beira-Rio).

A noite tinha caráter de incomum, porque o Queens of the Stone Age também estava escalado, assim como os brasileiros do Ego Kill Talent. E tanto o QoTSA quanto o Foo Fighters são duas das mais importantes bandas de rock no mundo em atividade. Ambos, contudo, lançaram, no ano passado, discos recebidos de maneira apenas morna pela imprensa e público, e dão a impressão de que já atravessaram o auge de suas carreiras.

Os papéis estiveram muito claros: o Queens of the Stone Age tocava, em volume mais baixo, enquanto uns ainda entravam (o horário das 19h definitivamente atrapalhou) no estádio e outros aqueciam para a atração principal. O público que cantava e se relacionava com o repertório menos conhecido era diminuto e muita gente estava ali até conversando ao longo da pouca mais de 1h de show.

Com um palco cheio de bastões coloridos, a apresentação foi movimentada, ganhando em intensidade conforme os hits (“No One Knows”, “Make it Wit Chu”) iam aparecendo e o público ia recheando mais os espaços no Allianz Parque. As faixas novas foram recebidas quase que com indiferença (à exceção da dançante “The Way You Used to Do”) e até canções do elogiado e recente ...Like Clockwork (2013), como a grooveada “Smooth Sailing” ou as mais sombrias “I Sat by the Ocean” e “My God Is the Sun”, não foram tão bem recebidas quanto as já estabelecidas (“Do it Again” e o trio derradeiro, “Little Sister”, “Go With the Flow” e a pesada “A Song for the Dead”).

No palco, o QoTSA balanceou uma maior polidez melódica – comparada aos primeiros anos da carreira – com um baterista firme e disposto. Jon Theodore deu vigor aos falsetes e à melancolia de Homme (surpreso com a vista do palco: "Se vocês pudessem ver daqui...") e reproduziu, fiel, a introdução de "Songs For the Dead", gravada originalmente por Dave Grohl (uma espécie de versão do ex-baterista do Nirvana para a introdução de John Bonham em "Rock and Roll", do Led Zeppelin, que ele tanto ama). Apesar de muito aguardado – e até de um rápido chamado de Grohl durante a performance do FF –, o encontro entre os amigos, líderes dos grupos, não aconteceu em nenhum dos shows.

Para a maioria de fãs do Foo Fighters, foi uma apresentação de abertura mais do que agradável. Já os fãs de Josh Homme e cia. com certeza preferiram o formato do mais recente show do QoTSA na cidade, em 2014, em um lugar fechado (Espaço das Américas), sem limite de tempo (um setlist mais longo, evitando ausências como a libertina “Feel Good Hit of Summer”) e com uma plateia fanática por cada acorde emanado do palco.

Dez minutos antes das 21h, o Allianz Parque já era outro: só a corrida dos integrantes do Foo Fighters para o palco fez reverberar um ruído de dimensões até então não ouvidas. A sequência inicial só contribuiu com o clima, desde o single recente, “Run”, até “Rope”, presente no subestimado Wasting Light (2011), passando por “All My Life – música do Foo Fighters que melhor funciona ao vivo –, o hit “Learn to Fly” e “The Sky is Neighbourhood”. As duas novas, de Concrete & Gold, aliás, até levantaram a plateia, em contraste com Sonic Highways. O penúltimo álbum da banda, de 2014, pouco acrescentou ao setlist e hoje é mais lembrado pela série documental feita em conjunto do que pelo seu conteúdo musical.

O Foo Fighters é uma das bandas de rock definitivas do mainstream nos anos 2000. Isto porque a história de Dave Grohl é a realização perfeita de qualquer fã de rock nascido quando o gênero já estava mundialmente estabelecido. Ele foi de nerd musical a baterista do Nirvana a bem-sucedido como líder do próprio grupo. É como se os personagens de James Franco, Seth Rogen e Jason Segel – fãs de todo o hard rock clássico, de Rush a Led Zeppelin –, na série Freaks and Geeks (1999/2000), fossem menos preguiçosos, realmente soubessem tocar seus instrumentos e conseguissem transformar um rock tímido de garagem em um épico de estádio.

Até por isso, Grohl toma a posição de defensor do rock em uma época na qual o gênero vem perdendo importância. “Vocês gostam de rock and roll? Vamos dar rock and roll a vocês”, ele disse. “O rock está morto? Nós temos o rock and roll. E isso é só um pouco de rock and roll”. O Foo Fighters, inclusive, não esconde o amor aos ídolos: toca covers de “Under Pressure”, do Queen (com Grohl nas baquetas e o baterista Taylor Hawkins cantando), e de Alice Cooper (“Under my Wheels”, cantada pelo guitarrista, Chris Shiflett), além de trechos de “Miss You”, dos Rolling Stones, “Blitzkrieg Bop”, dos Ramones, e “Love of my Life”, do Queen. Sobre a última delas, aliás, Grohl comentou, referindo à clássica performance no primeiro Rock in Rio da história: “Este é o único país do mundo que canta essa letra assim.”

“Para mim, as melhores noites são quando algo inesperado acontece”, disse Grohl, ao chamar um casal que confirmaria o noivado em cima do palco. Na realidade, a mesma situação havia acontecido em 2015, na passagem mais recente da banda por São Paulo, no estádio do Morumbi. Nem por isso, o vocalista perdeu a pose de brincalhão e a fama de “um dos caras mais legais do rock” que ostenta entre os admiradores. “Saiam da porra do meu palco e vão fazer um filho”, brincou. Ele também fez declarações ao público, que iluminou o estádio ao acender os celulares inesperadamente em diversas situações: “Foi a primeira vez que fizeram isso em um show do Foo Fighters”. Depois, Grohl ainda comentou: “Vocês talvez sejam a plateia mais barulhenta da turnê inteira.”

O Foo Fighters ainda fez os paulistanos se esgoelarem com “Times Like These” e “Best of You”, evocou as rodinhas de pogo com as antigas “Monkey Wrench” e “Generator” e até resgatou a nostálgica “Big Me”, single do primeiro disco da banda, autointitulado, de 1995. Depois de muitos berros – com a câmera, como de costume, “perseguindo” os integrantes no camarim –, o bis ainda teve a absolutamente fria “Dirty Water” (a menos celebrada da apresentação, talvez ao lado de “Sunday Rain”) e outras duas velharias, “This Is a Call” e a bombástica “Everlong”.

Absolutamente aclamado em São Paulo, o Foo Fighters reclamou no palco o trono de maior bastião do hard rock neste século. Com um setlist conhecido de ponta a ponta, os integrantes buscaram compensar a falta de inventividade com reverência aos clássicos e o resultado é uma defesa do rock and roll convincente ecoando pelo Allianz Parque em uma terça-feira paulistana. O Foo Fighters é o melhor aluno do professor interpretado por Jack Black em Escola de Rock (2003) – e possivelmente a única banda de sua geração a conseguir fazer um estádio com 40 mil pessoas vibrar com um solo de bateria de três minutos, como o que presenciamos nesse show.

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